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Ponte para a desgraça e o abismo
A
extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário significa o
desconhecimento do que representa o campesinato e a agricultura familiar
no país.
PorNajar Tubino
O título é um comentário do vice-presidente
da Confederação de Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
(CONTAG) e Secretário de Relações Internacionais, Willian Clementino,
assentado no Tocantins e educando de direito da Universidade Federal de
Goiás feito na 5ª Sessão da Agenda Democrática do Campo, evento
organizado pela Fundação Friedrich Ebert (FES) em conjunto com a
Fundação Perseu Abramo (FPA), no último dia 23 de junho, em São Paulo.
Também participou da mesa a antropóloga e presidente do CONSEA, Maria
Emilia Pacheco.
“- O momento é
de muita indignação pela violação dos nossos direitos. Um exemplo disso
foi a extinção do MDA, que significa um menosprezo e um desconhecimento
do que representa o campesinato e a agricultura familiar no país. A
intenção é clara: desconstruir as políticas públicas conquistadas com
muito sacrifício pelo povo brasileiro. Voltamos a definição neoliberal
de que os pequenos agricultores e agricultoras são periféricos, produzem
apenas para a sobrevivência. Temos que nos insurgir quanto a isso”,
disse Maria Emilia Pacheco.
A pauta golpista da bancada ruralista
O
tema da 5ª Sessão era Direito a terra e ao território. Território não é
apenas a área física, a quantidade de hectares necessários à
sobrevivência de uma comunidade rural. É o modo de vida, a cultura, a
proteção ao ambiente e a biodiversidade, mas principalmente, é o uso
coletivo da terra, como no caso das comunidades de fundo de pasto, dos
faxinalenses, do Paraná, dos indígenas e quilombolas. Existe uma
reconfiguração da questão agrária no país e está relacionada com a
questão ambiental e a biodiversidade e também com o modelo de
desenvolvimento rural.
Para
Maria Emilia Pacheco houve um erro na estratégia dos movimentos sociais
que desde 2000 deixaram de lado a campanha sobre o limite da
propriedade e isso acarretou um crescente processo de concentração de
terras n os últimos 13 anos.
“-
Temos que ficar atentos ao documento chamado de Pauta Positiva pela
Frente Parlamentar da Agropecuária 2016-17, que fala em garantia da
ordem política e segurança jurídica. Isso é a desconstrução do nosso
legado. A garantia está ligada a perseguição política, enquanto o número
de assassinatos no campo aumentou em 2015. O número de conflitos
aumentou 33% em áreas onde estão indígenas, quilombolas e ribeirinhos;
28% em área dos sem terras e 16% nas áreas dos pescadores. Foram
registrados 135 conflitos de água desde 2002. Foram acrescentados 97
milhões de hectares às grandes propriedades desde 2002. O processo de
reforma agrária está congelado” acrescentou Maria Emilia.
Além
disso, o mundo está passando por mudanças nutricionais importantes e o
Brasil está incluído nisso – as pessoas comem mais alimentos
processados, fast food e refrigerantes, gerando um processo crescente de
obesidade. Sem contar o crescente consumo de agrotóxicos, que a bancada
ruralista, através do PL3200 pretende impor à sociedade uma mudança no
nome do veneno – ao invés de agrotóxico “defensivo fitossanitário”. E
ainda fizeram outra proposição absurda: a pulverização aérea para
combater o mosquito aedes aegypti.
A filha de Jucá é dona de uma mineradora em Roraima
Maria
Emilia comentou os vários bloqueios que os golpistas pretendem impor
aos movimentos sociais do campo. Isso inclui as mudanças nos códigos
florestal, de mineração e de acesso aos recursos genéticos. A PEC 215,
por exemplo, retira do Executivo a decisão sobre demarcação de terras
indígenas, porque os golpistas querem explorar os minerais dessas áreas.
A filha do golpista e batedor de carteira Romero Jucá, por exemplo, é a
dona de uma mineradora em Roraima, que pretende explorar oito jazidas
dentro da terra dos Ianomamis. Aliás, quando foi presidente da FUNAI em
1998 foi Jucá quem autorizou a entrada dos garimpeiros na área indígena,
acarretando a morte dos ianomâmis.
A
PEC 65 pretende mutilar de vez o código ambiental, porque libera as
obras apenas com uma licença prévia. E as corporações estão loucas para
aprovar mudanças na lei 13.123 para abocanhar os recursos genéticos
brasileiros. Para Willian Clementino a disputa de terras no Brasil
iniciou com os portugueses, porque aqui habitavam milhões de indígenas,
não era uma terra abandonada e sem população. Ele citou Tito Lívio,
autor da primeira lei agrária no mundo ocidental: “a luta pela terra
provoca as maiores e mais violentas emoções”.
Os golpistas querem anular os territórios de indígenas e quilombolas
Clementino
disse que o Brasil tem dois modelos de agricultura, um agroexportador,
capitaneado pelo agronegócio e as corporações agroquímicas e outro do
campesinato e da agricultura familiar.
“-
O modelo agroexportador do monocultivo, como o deserto verde das
plantações de eucalipto, a transgenia e a afronta à soberania alimentar e
territorial. Os golpistas querem anular o reconhecimento dos
territórios dos indígenas e quilombolas. Para ter escravidão não precisa
de corrente. E os golpistas querem tirar todos os nossos direitos. No
Brasil quem tem a terra tem o poder político, social e econômico”.
O
vice-presidente da CONTAG também afirmou que dos 851 milhões de
hectares de terras no Brasil mais de 309 milhões de hectares são
piratas, ou seja, no papel, um andar a mais na parafernália de títulos
agrários existentes no país. Outra estatística citada por Willian
Clementino:
“Sobre as
condições de vida das pessoas antes de acessarem a terra e depois de
assentadas. No caso da posse de computadores: antes a percentagem era de
0,63% e depois saltou para 2,84% - dados de 2011. Contando as áreas
periféricas das cidades, 43,39% cozinhavam em fogão e, a partir de 2011,
o número saltou para mais de 70%. Televisores apenas 30% dispunham de
um modelo, e depois de 2011, 63% haviam adquirido. Nos últimos 13 anos o
avanço nas políticas para o campo foi evidente, mas nós deixamos de
discutir a função social da propriedade. Além disso: elegemos Dilma mas
ao mesmo tempo deixamos esse congresso nas mãos de homens brancos
machistas, ladrões e outras coisas”.
O título Ponte para a desgraça e o abismo é a nova tradução do documento dos golpistas “Ponte para o Futuro”.
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