EDITORIAL ZERO HORA 12/12/2011
A perspectiva de que, apesar dos apelos do Planalto para que sejam evitadas pressões adicionais nas contas públicas, categorias funcionais dos diferentes poderes sejam contempladas com generosos reajustes salariais é particularmente preocupante, ainda mais num momento de crise internacional. Agora mesmo, funcionários do Judiciário estão em greve por reajustes em cerca de duas dezenas de Estados, e a Câmara dos Deputados promete anunciar na próxima semana um verdadeiro pacote de Natal com aumentos salariais para seus servidores e a criação de novos cargos.
Se a recomposição for aprovada, como tudo indica, o impacto será de R$ 386 milhões anuais nos cofres públicos. A alegação é de que os salários dos funcionários da Câmara acompanham os dos parlamentares, numa espécie de gatilho que costuma ser disparado a todo momento também em outras áreas da atividade pública. É mais do que a indexação de vencimentos, é a indexação de privilégios, como se algumas categorias de trabalhadores tivessem direitos exclusivos em relação à grande maioria. Além disso, a Câmara prevê a criação de até 70 novos cargos temporários para contemplar um novo partido, o PSD, confirmando os temores de quem previa que a expansão de siglas iria pressionar também a criação de cargos, como se o Congresso já não tivesse servidores de sobra para que o problema fosse resolvido com um remanejamento.
Distorções como essa, em vez de serem eliminadas, prosperam em Brasília. Outro exemplo: na mais alta casa do Legislativo, o Senado, um em cada cinco servidores efetivos recebe salários acima do teto do funcionalismo. Sem nenhuma disposição de corrigir o absurdo, os senadores adiam uma reforma administrativa que está engavetada há seis meses. Se a reforma fosse levada adiante, além dos salários, do excesso de servidores e da ociosidade de muita gente efetiva ou em cargos de confiança, o Senado evitaria que o país custeasse outros gastos, como um hospital com 44 médicos que não funciona nos fins de semana porque não tem pacientes. Mesmo assim, o Senado prepara concurso para contratar mais médicos.
Esse mundo à parte, sustentado pelo Brasil real, que produz e paga impostos, não se restringe ao parlamento. Está, como demonstram as demandas por vantagens salariais e funcionais de outros setores dos demais poderes, disseminado pelo Executivo e pelo Judiciário. Não há, com raras exceções, como reconhecer legitimidade nas investidas por mais regalias, muitas das quais mantidas e ampliadas sob o argumento de que se sustentam em normas legais e em direitos adquiridos. Na verdade, sabe-se que alegadas conquistas se mantêm sob ilegalidades ou controvérsias jurídicas. Para muito além da discussão legal, é inquestionável que as concessões feitas a minorias, em total descompasso com o desejo da sociedade de extinção de privilégios nas estruturas de poder, são eticamente insustentáveis.
Leia mais:
TRIBUNAIS IGNORAM TETO E CENTENAS DE MAGISTRADOS GANHAM MAIS DE R$ 50 MIL.
Levantamento do ‘Estado’ em folhas de pagamento dos TJs revela que norma constitucional de limitar salários ao rendimento de um ministro do Supremo (R$ 26,7 mil) é amplamente descumprida
Felipe Recondo, de o Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - Donos dos maiores salários do serviço público, magistrados espalhados por tribunais Brasil afora aumentam os vencimentos com benefícios que, muitas vezes, elevam os rendimentos brutos a mais de R$ 50 mil mensais. Levantamento feito pelo Estado nas últimas semanas adianta o que uma força-tarefa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) busca identificar nas folhas de pagamentos de alguns Estados do País.
A radiografia da folha dos tribunais revela centenas de casos de desembargadores que receberam nos últimos meses mais que os R$ 26,7 mil estabelecidos como teto - o salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal. Em setembro deste ano, por exemplo, 120 desembargadores receberam mais do que R$ 40 mil e 23 mais de R$ 50 mil. Um deles ganhou R$ 642.962,66; outro recebeu R$ 81.796,65.
Há ainda dezenas de contracheques superiores a R$ 80 mil e casos em que os valores superam R$ 100 mil. Em maio de 2010, a remuneração bruta de 112 desembargadores superou os R$ 100 mil. Nove receberam mais de R$ 150 mil.
Auxílios, abonos, venda de parte dos 60 dias de férias e outros penduricalhos, muitos isentos da cobrança de imposto de renda, fazem com que alguns tribunais paguem constantemente mais do que o teto de R$ 26,7 mil.
No Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, os pagamentos mensais superiores a R$ 50 mil são comuns (leia nesta página). Em determinados meses, os rendimentos de dezenas de desembargadores superam R$ 100 mil. Os casos de pagamentos elevados são mais comuns no Rio.
No Tribunal de Justiça de Mato Grosso, o pagamento de vantagens, inclusive auxílio-moradia, eleva o pagamento de desembargadores mês a mês a R$ 41.401,95. No Espírito Santo, lei aprovada pela Assembleia Legislativa garantiu aos desembargadores um pagamento de atrasados que aumentam os rendimentos para mais de R$ 30 mil.
Por serem auxílios que não são incorporados ao valor do subsídio dos magistrados, limitado a R$ 26,7 mil, as quantias não são abatidas pelo teto.
De acordo com os dados, há 19 benefícios previstos legalmente, como função gratificada, parcela autônoma de equivalência e pagamento por hora-aula que elevam os salários.
O Tribunal de Justiça do Rio, contactado oito vezes por e-mail e duas vezes por telefone, não se manifestou sobre os dados.
Auxílio-moradia
Em Mato Grosso, o pagamento de auxílio-moradia aos desembargadores, mesmo para os que já moravam no Estado, contribui para aumentar os rendimentos. Dos 26 desembargadores, 24 receberam R$ 41.401,95. Além do salário de R$ 24.117,64, os desembargadores recebem auxílio de R$ 11.254,90 e vantagens eventuais de R$ 6.029,41.
De acordo com a assessoria do tribunal, os valores correspondem a auxílio-moradia, parcelamento do 13.º salário, e abono de férias. O pagamento do auxílio, porém, está sendo contestado no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e no Supremo. Segundo o TJ, o benefício está lastreado em liminares concedidas pelo STF. Por serem decisões provisórias, o pagamento poderá ser julgado ilegal e suspenso.
O tribunal do Mato Grosso do Sul gastou R$ 723 mil em salário e R$ 914 mil em auxílios, vantagens e abonos.
No Tribunal de Santa Catarina, os desembargadores recebem R$ 2.211,13 de auxílio-moradia, além do subsídio de R$ 22.111,25. Apesar da exigência do Conselho Nacional de Justiça, o TJ não divulga quanto cada desembargador recebeu em vantagens e outros auxílios.
Regra
Pela Constituição, os desembargadores podem receber até 90,25% do que é pago a um ministro do Supremo. Mesmo não sendo obrigatório que recebessem o máximo possível. No Espírito Santo, a Assembleia garantiu o pagamento dessa diferença em 2011. De acordo com o tribunal, a lei atende à reivindicação antiga da magistratura.
Em duas frentes simultâneas, o CNJ está investigando as folhas de pagamento dos tribunais de todo o País.
Na semana passada, a Corregedoria Nacional de Justiça iniciou uma devassa na folha de pagamentos do Tribunal de Justiça de São Paulo. A partir de informações do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), a Corregedoria passou a investigar movimentações suspeitas de 17 magistrados.
A devassa vai se estender por 22 tribunais. Há suspeitas de que valores podem ter sido usados para comprar decisões judiciais.
Em outra frente, a Secretaria de Controle Interno do CNJ faz uma auditoria nas folhas de pagamento em busca de violações ao teto de R$ 26,7 mil. Conforme integrantes do Conselho, a investigação deve se encerrar em 2012 e já foram identificados casos de descumprimento do teto.
Fonte: Mazelas do Judiciario
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