Não vamos permitir a derrubada de uma presidente a quem não se pode imputar qualquer delito classificável como crime de responsabilidade, que não desonrou a presidência da República nem cometeu qualquer ato que justifique a abertura de processo de impeachment. Vamos esclarecer a população. O que se está armando é um golpe parlamentar e não um processo legal e constitucional de impeachment. Este é o paradoxo da democracia brasileira neste momento.
Por sua formação, pelo trânsito no meio jurídico e o respeito
angariado quando foi presidente da OAB-RJ, o deputado federal Wadih
Damous (PT-RJ) tornou-se uma espécie de coordenador jurídico da bancada
do PT no enfrentamento das CPIs e agora do processo de impeachment
tentado pela oposição. Nesta entrevista ao 247 ele avisa: “Vamos para a
guerra do impeachment. A guerra jurídica, a guerra política e a guerra
nas ruas”. Ele afirma que o impeachment de Dilma é uma meta pessoal do
presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que para atingi-la respondeu à
questão de ordem da oposição, sobre as regras do processo, apresentando
um verdadeiro “manual do golpe”. Este ritual, que ele considera
inconstitucional, porque calcado no regimento da Câmara e não na lei
específica do impeachment, como pede a Carta de 1988, em algum momento
deve sder objeto de questionamento junto ao próprio Supremo Tribunal
Federal. Mas isso, ele diz, será feito com precisão, como quem “dispara a
preciosa bala de prata” que não pode errar o algo. Confira a
entrevista.
O senhor acha que a reforma ministerial conseguirá impedir
que a oposição leve avante o processo de impeachment contra a presidente
Dilma?
Acho que a pauta golpista é uma meta pessoal do presidente da Câmara.
A situação dele piora a cada dia com mais denúncias de seu envolvimento
no esquema de corrupção da Petrobrás, com delatores falando em
recebimento de propina, contas no exterior e outras conexões. E ele, ao
responder à questão de ordem feita pela oposição elaborou o manual do
golpe, detalhando o rito que seria adotado na tramitação de um pedido de
impeachment da presidente. Se este manual elaborado por Eduardo Cunha
prevalecer e chegar a ser aplicado, estará sendo montado um tribunal de
exceção aqui na Câmara dos Deputados. Será uma afronta ao estado de
direito que os democratas deste país não poderão aceitar.
O senhor se refere à previsão, neste rito, de que um recurso
ao plenário, contra a rejeição de um pedido pelo presidente da Câmara,
precisaria apenas da maioria simples de votos para ser aprovado, e não
dos 2/3 a quê se refere a Constituição no artigo 86, que trata do
impeachment?
Isso também mas não apenas isso. Para que os leitores tenham uma
ideia, o prazo concedido a um servidor público que esteja respondendo a
um processo disciplinar é maior do que aquele que, no referido manual,
seria concedido ao presidente da República eleito pelo povo, num
processo que pode lhe tirar o mandato. Então são vários absurdos. E qual
é a pedra de toque do manual do golpe? É o fato de eleger como norma
regente do processo o regimento interno da Câmara. A norma que deve
regular todo e qualquer processo de impeachment é a norma especificada
na Constituição, que é a lei 1.070/1950. Se ela tem omissões, devemos
corrigi-la ou aprovar outra lei. O que não se pode fazer é adotar o
regimento interno da Câmara como norma do processo de impeachment. Isso é
inconstitucional e será questionado aqui e onde for preciso. Estamos
prontos, vamos para esta guerra do impeachment.
O senhor fala de uma guerra jurídica...
Falo da guerra jurídica, da guerra política e da guerra nas ruas
contra o golpe travestido de impeachment, da defesa da democracia, do
voto popular e do mandato da presidente eleita.
A resistência ao golpe será em todas estas frentes. Não vamos
permitir que um processo desta gravidade fosse conduzido por um
presidente da Câmara que já foi denunciado pela Procuradora Geral da
República, está sendo investigado pelo Supremo Tribunal Federal e
provavelmente terá a denúncia acolhida, tornando-se réu. Entre os
propositores do processo de impeachment, alguns respondem na Justiça por
atos de improbidade e são réus em ações penais. Não vamos aceitar
acusações de um tribunal de contas que tem o presidente e outros
ministros mencionados por delatores da Lava Jato como tendo recebido
vantagens indevidas em troca de sentenças. Não vamos permitir a
derrubada de uma presidente a quem não se pode imputar qualquer delito
classificável como crime de responsabilidade, que não desonrou a
presidência da República nem cometeu qualquer ato que justifique a
abertura de processo de impeachment. Vamos esclarecer a população. O que
se está armando é um golpe parlamentar e não um processo legal e
constitucional de impeachment. Este é o paradoxo da democracia
brasileira neste momento.
O PT aposta em reação popular ao impeachment?
Nós sabemos que há muita insatisfação com o nosso governo e que a
presidente está com a popularidade baixa. Ninguém pode negar isso.
Mesmo dentro do PT existem os insatisfeitos com a política econômica em
curso, com uma ou outra diretriz do governo. Mas uma coisa é discordar
do governo, outra é apoiar a ruptura democrática. Estamos falando da
defesa da legalidade e temos convicção de que a população não aceitará
passivamente que a presidente eleita seja afastada por força de
pesquisas de opinião atestando sua impopularidade ou por conta das
dificuldades econômicas que o país está enfrentando e o governo está
administrando. Impopularidade ou adversidade econômica não podem ser
motivos para impeachment. Se formos por este caminho, vamos gerar um
padrão de instabilidade política muito nocivo ao país. Se criarmos aqui a
cultura do golpismo permanente, hoje a vítima pode ser Dilma e amanhã
poderão ser os próprios propositores deste impeachment heterodoxo,
carente de fatos e de base jurídica. A grande vítima, na verdade, será a
democracia e o povo brasileiro, que não merecem isso.
O senhor diz que o impeachment é uma meta do presidente da
Câmara, Eduardo Cunha. E por que ele, apesar das denúncias que enfrenta,
não sofreu ainda qualquer questionamento interno, inclusive junto ao
Conselho de Ética?
O presidente Eduardo Cunha controla todas as instâncias da Casa, tem
maioria em todas as comissões e colegiados, inclusive no Conselho de
Ética. E naturalmente está articulado com a oposição, que lhe dá
sustentação em troca da condução do golpe. Isso é notório. Depois, o
Supremo ainda não acatou a denúncia contra ele. Então, ele ainda não é
réu e reconheço que este argumento tem sua força jurídica. Mas, a
partir do momento em que a denúncia for acatada, a situação dele aqui
dentro (da Câmara) deve se modificar. O afastamento dele do cargo, pelo
menos de forma cautelar, deve acontecer. Não tenho dúvida disso.
Se outros partidos não pedirem, o PT pedirá o afastamento dele?
Espero que o PT faça isso.
Voltando ao ritual do impeachment, o PT pretende questionar
sua constitucionalidade no STF antes ainda de sua aplicação ou vai
esperar que o processo tenha início? Não seria mais complicado
questioná-lo depois do fato consumado?
Estamos formando um grupo de trabalho composto por parlamentares da
base aliada, não só do PT, para coordenar as ações anti-golpe. Este
grupo vai analisar detidamente tanto a questão de ordem do DEM como a
resposta do presidente da Câmara, sob a forma de um rito processual que
consideramos ilegal e impertinente. E vamos decidir, juntamente com o
governo, sobre as medidas que vamos tomar, pois não será uma decisão
meramente jurídica, mas política. O recurso ao STF terá que ser feito da
forma precisa, no momento exato. Vamos usá-lo com a perícia de quem
dispara a valiosa e certeira bala de prata.
O senhor examinou a peça Helio Bicudo?
Eu lamento profundamente que o doutor Helio Bicudo, no outono da
vida, tenha chegado a esta condição lamentável, ele que foi tão atuante
na resistência à ditadura, na defesa dos presos políticos e no
enfrentamento do famigerado torturador Fleury, ele que lutou pela volta
ao estado democrático de direito e depois denunciou o esquadrão da
morte. A peça que ele subscreve e empresta à oposição é a síntese do que
ele é hoje. Uma peça decadente, frágil, carente de sustentação jurídica
e moral para embasar um processo de impeachment contra a presidente
Dilma.
Fonte Brasil 247
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