"Qual é o sentido moral que resta neste país quando se nomeia um ministro da Corte Suprema com a intenção manifesta de que sua função será a de proteger corruptos? O que se pode esperar da moralidade social quando os juízes são íntimos daqueles que deveriam julgar, como é o caso de Gilmar Mendes com Temer e com tucanos de alta plumagem?", questiona o professor de Sociologia Aldo Fornazieri; "O Brasil não pode continuar nas mãos daqueles que o estão destruindo. É preciso reconduzir o Brasil no leito da democracia, no sentido social, na busca de direitos, de justiça e de igualdade"
Por Aldo Fornazieri
A consequência mais trágica do golpe é a destruição do Brasil
enquanto nação e a decomposição moral das suas instituições. Se o
impeachment em si representou um ataque aos fundamentos democráticos e
republicanos da Constituição o trabalho de sapa do governo ilegítimo
consiste em destruir de forma implacável e impiedosa o sentido social
que o país vinha construindo desde a Constituição de 1988. As medidas do
governo falam por si e se sintetizam na PEC dos gastos, nas propostas
de Reforma da Previdência e Trabalhista e na lenta destruição de
programas sociais como o Prouni, Minha Casa Minha Vida, o Bolsa Família,
o financiamento estudantil etc..
O governo federal, junto com governos de estados, particularmente do
Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul, vêm destruindo a pesquisa
científica e a Cultura, cortando verbas, fechando instituições e
institutos de pesquisa, acabando com programas, demitindo orquestras
sinfônicas, minando as universidades públicas. Há uma conjura deliberada
anti-sociais, contra a ciência, a pesquisa, cultura, a educação e a
saúde pública. Serão necessárias décadas de reconstrução, com perdas
incalculáveis em termos de avanços, recursos e capacidades. O que está
em curso é um grande desastre social, com um massacre de direitos de tal
magnitude poucas vezes visto em nossa história.
Do ponto de vista econômico, em Brasília, o país está à venda. Grupos
de assalto cercam o governo pronto a satisfazê-los, entregando-lhes
petróleo e gás, serviços e infraestrutura, previdência e direitos
sociais, perdoando dívidas do agronegócio, num devastador jogo de
pirataria econômica. O resultado é uma economia paralisada com quase
treze milhões de desempregados, com empresas fechando as portas e com a
capacidade ociosa nas alturas. O milagre da recuperação rápida se
revelou uma grande mentira.
O mais grave é o trabalho deliberado de decomposição moral das
instituições. O governo perdeu qualquer pudor, qualquer senso de limite,
de razoabilidade, de respeito. É um governo de quadrilha que promove
criminosos a altos postos governamentais diariamente, comprovando que o
PMDB, apoiado pelo PSDB e os partidos do centrão, promoveram o golpe
para buscar a proteção no foro privilegiado. A perda de pudor se
transformou em cinismo e em escárnio, sem escrúpulos e sem decência.
Esta é a consequência lógica da grande farsa montada em torno do
impeachment: ora, se a sociedade se mobiliza para entregar o governo nas
mãos da maior e mas bem organizada quadrilha de corruptos que o Brasil
já teve, esta quadrilha se sente à vontade em promover a sua
autoproteção, desprezando as exigências de moralidade pública.
No Congresso, os corruptos se organizaram para tomar de assalto as
principais comissões da Câmara e do Senado, notadamente as comissões de
Constituição de Justiça. Ser delatado na Lava Jato, ser denunciado por
corrupção, se tornou condição para a ascensão em postos de comando, em
comissões que decidem. Neste pais tornou-se normal que o presidente da
República, o presidente da Câmara e o presidente do Senado tenham
pesadas denúncias sobre seus ombros. Isso tanto fez quanto tanto faz.
Extirpariam os fundamentos morais do Estado brasileiro.
As quadrilhas do governo e do Congresso se articularam para tornar
juiz do STF alguém que é acusado de advogar para o PCC, de receber
propinas da corrupção e de ter plagiado livros de juristas espanhóis. Se
alguém assim se torna ministro da mais alta Corte de Justiça do país,
encarregada de zelar pela Constituição e pelo sentido moral do Estado,
que força terá um professor em sala para solicitar que os alunos não
plagiem trabalhos na internet? O que se está assistindo é a destruição
dos próprios valores morais vinculantes da sociedade, pois parte desta
sociedade, anestesiada em sua hipocrisia, julga que tudo isto é normal e
que faz parte do jogo político.
Autoridades sem moral e desmoralizadas
Nada mais importa. Não importa se o futuro ministro se refestelou na
chalana da indecência. E isto nem importa para vários dos atuais
ministros do STF que, sem pudor, sem virtudes, sem prudência e sem
decência se manifestaram favoráveis à entrada de Alexandre de Moraes no
egrégio colégio de capas pretas acovardados.
Qual é o sentido moral que resta neste país quando se nomeia um
ministro da Corte Suprema com a intenção manifesta de que sua função
será a de proteger corruptos? O que se pode esperar da moralidade social
quando os juízes são íntimos daqueles que deveriam julgar, como é o
caso de Gilmar Mendes com Temer e com tucanos de alta plumagem? O fato é
que as nossas mais altas autoridades perderam todas as medidas, todos
os critérios, toda a sensatez, toda prudência, toda a vergonha. Sem
metros e sem limites morais, sem sentido social, sem senso de Justiça,
sem os valores da dignidade e dos direitos humanos, o Brasil pós-golpe
se decompõem diariamente a olhos vistos, exalando putrefação pelos seus
poros.
Estados, a exemplo do Rio de Janeiro e Espírito Santo, estão em
situação de convulsão. O governador Pezão classifica os manifestantes de
"vândalos". Vândalos são os peemedebistas do Rio, que saquearam os
cofres do estado. Já o governador Hartung afirma que a "sociedade se
tornou refém da polícia". Mas a verdade é que polícia e sociedade são
reféns de governadores incompetentes que, em tempos de trágica
normalidade, jogam a polícia contra a sociedade e, em tempo de banhos de
sangue por motim armados, jogam a sociedade contra as polícias.
Sociedade e polícias são vítimas de um atroz jogo de violência,
manipulado pelos interesses políticos dos governantes. E, após de sete
dias de banho de sangue, Temer se manifesta colocando tanques nas ruas,
numa demonstração de força estúpida e impotente.
Selvageria nas prisões, violência e desordem nas ruas, confrontos
crescentes entre manifestantes e polícias, crescimento do desemprego e
da pobreza, destruição das instituições do Estado é o legado crescente
de um governo sedicioso que premia o crime com os altos cargos públicos.
Ao assim proceder, sem escrúpulos e sem moral, o governo vai
autorizando a barbárie social, a desmesura, a desordem. É preciso reagir
antes que o estrago se torne medonho. As oposições e os movimentos
sociais precisam sair das letargias de suas próprias crises. Precisam se
refazer nas lutas, nas ruas, nas praças, pois são estes os melhores
remédios para restabelecer as virtudes cívicas. As batalhas pela
cidadania, pelos direitos, pela justiça e pela liberdade são as melhores
formas de fazer autocrítica. O ensimesmamento da derrota é o benefício
do inimigo.
O Brasil não pode continuar nas mãos daqueles que o estão
destruindo. Os jovens precisam de esperança, os trabalhadores querem
emprego e os idosos estão desamparados, temendo uma velhice
desassistida. É preciso reconduzir o Brasil no leito da democracia, no
sentido social, na busca de direitos, de justiça e de igualdade. O
Brasil precisa, com urgência, de um governo decente que seja capaz de
conduzir moral e politicamente a sociedade. Este governo que ai está,
pela imoralidade manifesta que representa, merece uma danação da
memória, um esquecimento eterno.
Aldo Fornazieri - Professor da Escola de Sociologia e Política.
Fonte GGN
https://www.facebook.com/antoniocavalcantefilho.cavalcante
Visite a pagina do MCCE-MT
www.mcce-mt.org