Professor de Medicina e dirigente do Cremesp, Bráulio Luna Filho defende mudanças no ingresso às escolas médicas e na formação. "Não basta ter condições financeiras. É preciso mais humanismo"
por Cida de Oliveira, da RBA
São Paulo – Professor de Cardiologia na Escola Paulista de Medicina,
vinculada à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), e dirigente do
Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp), Bráulio Luna Filho
entende que os desvios de conduta dos médicos envolvidos no episódio de
vazamento de informações trocadas entre grupos do WhatsApp, um deles
sugerindo procedimento para matar Marisa Letícia Lula da Silva, refletem
falhas no acesso aos cursos de Medicina e do currículo. E não descarta
que o elitismo do corpo discente das escolas médicas brasileiras
expliquem, em parte, episódios como esse.
A médica reumatologista Gabriela Munhoz, de 31 anos, que espalhou
pelo aplicativo que a ex-primeira-dama estava internada no Hospital
Sírio-Libanês após um derrame hemorrágico e que seria levada para a UTI,
foi demitida pelo hospital. E o neurocirurgião Richam
Faissal El Hossain Ellakkis – que sugeriu o procedimento aos seus
colegas de grupo no whatsapp – teve sua demissão decidida pela Unimed de
São Roque. A Unimed teria divulgado nota alegando que o profissional
não pertence a seu quadro, mas atua como terceirizado em um hospital
ligado à operadora.
Investigados em sindicância instaurada pelo Cremesp, ambos
podem sofrer processo administrativo ou mesmo perder o registro junto ao
órgão, ficando assim impedidos de exercer a Medicina.
O Código de Ética Médica veda ao médico “permitir o
manuseio e o conhecimento dos prontuários por pessoas não obrigadas ao
sigilo profissional quando sob sua responsabilidade”. Não permite também
“liberar cópias do prontuário sob sua guarda, salvo quando autorizado,
por escrito, pelo paciente, para atender ordem judicial ou para a sua
própria defesa”, esta última em situação de sindicância ou processo
ético-profissional.
"Não é todo mundo que pode ser médico. Não basta ter condições de
passar no processo seletivo de universidade pública ou de se manter num
curso particular, que é caro. É preciso humanismo, entender a
importância do papel de um médico, o que é mais importante do que o
domínio de tecnologias", disse Luna Filho.
O integrante do conselho, que assinala falar em seu nome, e não do
órgão, defende que as escolas médicas brasileiras façam modificações no
sistema de ingresso – nos quais o poder econômico não seja o mais
determinante, e sim a vocação – e também na estrutura curricular. Com
isso, a formação ética seria estendida para o longo do curso, e não
concentrada em disciplinas específicas, num determinado estágio da
graduação.
Sem citar nomes dos envolvidos e tampouco fazendo prognósticos quanto
ao desfecho das investigações no Cremesp, o conselheiro disse que a
polarização acentuada em momentos políticos marcantes, como períodos
eleitorais, não é diferente da observada nas faculdades de Medicina,
onde estão os filhos da elite.
"E essa polarização talvez estimule as pessoas a serem ainda mais
audaciosas, usando os recursos tecnológicos para se manifestar. Mas não
podemos tolerar isso na Medicina", disse, mencionando os princípios
médicos, que devem respeitar e preservar os aspectos físico,
emocional e moral, transcendendo tabus, crenças e preconceitos, em nome
da fidelidade ao compromisso de tratar e cuidar de todos, sem distinção
com relação a raça, credo ou situação socioeconômica.
Fonte Rede Brasil Atual
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