segunda-feira, 13 de novembro de 2017

CORRUPÇÃO, EDUCAÇÃO E DEMOCRACIA


Entendo que o grande ato de corrupção, a grande “quebra”, é aquela em que a democracia é violada ou as regras de probidade na gestão pública ou nas relações sociais são quebradas. Então, a meu ver, a grande corrupção está no promotor de justiça que começa um processo, sabendo que “não vai dar em nada”, apenas para cumprir a produtividade, consumindo recursos financeiros do Estado. Grande corrupção comete o juiz que julga de acordo com a classe social, aplicando penas maiores aos acusados indefesos e pobres, e “passando a mão” na cabeça dos grandes criminosos.
 



Por Antonio Cavalcante Filho



Se a gente observar o nível de desenvolvimento de alguns países do mundo, seja no aspecto econômico, educacional ou no respeito aos direitos humanos, chegaremos à conclusão de que alguns valores estão intrinsecamente ligados: educação, democracia e corrupção.

Num resumo despretensioso, podemos dizer que um país que faça a opção pela educação de sua população, se torna forte em sentido econômico e produtivo, fomenta os valores democráticos, e isso é o melhor antídoto contra corrupção.

Quando falo de corrupção, eu lembro o sentido da palavra que é “quebrar”. Então, quebrar a regra de uma fila de banco, negar assento a um idoso no transporte coletivo, ou agredir verbalmente uma pessoa no trânsito são atos de “quebra”, mas possuem mais cunho moral. É claro que devemos ceder o assento às pessoas idosas nos ônibus, ou a uma gestante que, além da delicada situação pessoal, sofre impacto das agruras e desconfortos provocados por veículos velhos, sem ar-condicionado, transitando por ruas esburacadas e poeirentas. O mínimo que devemos fazer é que ela fique sentada em um desses bancos rasgados e sujos dos ônibus de nossas cidades.

Mas, acho que um jovem ou uma criança que recebam boa educação, raramente seriam flagrados cometendo esse tipo de conduta, tomando vaga de deficientes em estacionamento, furando a fila preferencial. Aliás, eu já vi crianças chamando a atenção do pai nesse sentido, dizendo que aquela vaga no estacionamento é para quem se locomove por cadeira de rodas e tal.

Porém, entendo que o grande ato de corrupção, a grande “quebra”, é aquela em que a democracia é violada ou as regras de probidade na gestão pública ou nas relações sociais são quebradas. Então, a meu ver, a grande corrupção está no promotor de justiça que começa um processo, sabendo que “não vai dar em nada”, apenas para cumprir a produtividade, consumindo recursos financeiros do Estado.

Grande corrupção comete o juiz que julga de acordo com a classe social, aplicando penas maiores aos acusados indefesos e pobres, e “passando a mão” na cabeça dos grandes criminosos. Corrupção para mim é o sujeito roubar bilhões, fazer delação premiada e ficar “de boas”, dedurando quem é inimigo político (ou na empresa) e com a garantia de um juiz de que pode curtir à vontade a liberdade conquistada, e com muito dinheiro.

Só para lembrar: os marqueteiros da Odebrecht, que fizeram campanhas eleitorais para diversos partidos e em diversos países, conseguiram deixar diversas empresas próprias fora do processo de delação. E conseguiram a liberação de 10 milhões de reais para “despesas pessoais”. Aqui, em Mato grosso, um cara que roubou dinheiro da educação estaria em liberdade, porque o juiz achava que ele era “mais útil solto do que preso”. Na verdade, isso é corrupção, porque a regra é que a lei é para todos, não é feita para ajudar amigos e nem prejudicar inimigos dos juízes, delegados e promotores.

Eu falei isso porque reli uma pesquisa da Fundação Getúlio Vargas, mostrando que no decorrer do tempo aquelas instituições que representam a democracia e a liberdade estão perdendo apoio popular. É claro que por ser pesquisa de opinião pública ela retrata um momento, e que sofre diversas influências da mídia corporativa burguesa, a mesma golpista de sempre, que manipula as informações da maneira que interessa a ela própria e aos grupos políticos e econômicos a quem ela serve.

Mas o caso é que isso pode gerar preocupação, porque a educação e a democracia estão perdendo espaço, contribuindo para o crescimento da corrupção, aqui entendida como a “quebra” do que é correto, do jeito certo de fazer as coisas e tratar as pessoas. A pesquisa a que me refiro é de 2015, mas aquela feita no ano passado traz poucas modificações e cujos percentuais seriam quase os mesmos se a pesquisa fosse feita em novembro de 2017, e faço isso para refletirmos.

Segundo a pesquisa do Data Folha, as Forças Armadas seriam as instituições em que as pessoas mais acreditam (esquecendo que foram elas o braço armado do golpe de 1964). Em seguida, vem o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, que, em 2016, repetiu o mesmo erro de 1964, ao apoiar o golpe midiático-parlamentar-judicial apelidado de impeachment. Todavia, ela própria, que nos anos de chumbo da ditadura mesmo tardio, se arrependeu de ter ajudado a derrubar o presidente João Goulart (eleito por mais de 80% da população brasileira), já está “caindo na real” de que dessa vez, como tantos outros “trouxinhas”, foi mais uma vítima do pato amarelo da FIESP.

As Forças Armadas são respeitadas por 73% da sociedade, mas 24% não as aprovam e 4% não souberam responder. Em terceiro lugar vem a Igreja Católica, merecedora da confiança de 61% dos brasileiros (os setores mais conservadores dessa instituição também contribuíram com o golpe de 1964), contra 37% que desconfiam dela e 3% não responderam. Depois o ranking traz o Poder Judiciário (o STF tal qual, em 2016, também deu cobertura ‘constitucional’ ao golpe militar) e Imprensa. O Ministério Público ficou na 7ª posição, e a polícia, na 8ª.

A parte que me preocupa é que as instituições genuinamente democráticas não merecem a confiança da população, e aí eu englobo o sistema de justiça e a representação dos parlamentos.

Somente 15% da população acreditam no Congresso Nacional, e cerca de 82% têm uma visão negativa do Senado e da Câmara, e 3% não opinaram (nem precisa lembrar que a maioria dos parlamentares, assim como em 2016, em 64, também traíram a democracia). A Presidência da República e seus ministérios detêm a confiança de 19% das pessoas, contra 78% que não confiam e 3% que não responderam. Quero lembrar, que essa pesquisa foi feita no período de turbulência “pré-golpeachment”, em que os meios de comunicação golpistas apostavam todas as suas fichas pela destituição de Dilma Roussef.

E na rabeira da credibilidade popular, estão os partidos políticos, considerados inconfiáveis por 91% das pessoas entrevistadas e são apoiados por apenas 7% da população. É por isso que, em diversos espaços, hoje, a pessoa que é filiada a algum partido político é tratada de forma diferente, sofre até bullying (os partidos com menos credibilidade no momento são justamente os que se a conluiaram no golpe).

Fecho este texto, lembrando que a maior corrupção num Estado Democrático de Direito, a mãe de todas, é o sequestro da democracia. Aqueles que conspiraram, se conluiaram, rasgaram a constituição, formaram quadrilhas para tomar o poder de assalto, fazem todos os demais ladrões do dinheiro público no Brasil, se parecerem trombadinhas, batedorezinhos de carteiras, ladrõezinhos de galinhas.

Antonio Cavalcante Filho, o Ceará, é sindicalista e escreve neste espaço às sextas-feiras - E-mail: antoniocavalcantefilho@outlook.com

Fonte RD News