Provavelmente Trump nem agradecera os presentes que lhe são ofertados, com sua costumeira grosseria, passará em revista as tropas, dará ordens e se retirará, contente com a nova ordem que reina no continente, não importando a instabilidade, a miséria e a falta de esperança que predominam.
Por Emir Sader
Nunca a América Latina tinha estado tão unida e integrada como quando
a Argentina e o Brasil deixaram de ser rivais para serem aliados, pelas
mãos do Lula e do Nestor Kirchner. Com o fortalecimento e a ampliação
do Mercosul com a fundação da Unasul e da Celac, nunca os EUA estiveram
tão isolados no continente. Suas apostas fracassaram, uma depois a outra
– México, Chile, Peru, Colômbia.
O retorno da direita aos governos na Argentina e no Brasil
representou não apenas o final dessa etapa de integração, com a
desarticulação do Mercosul, de Unasul e de Celac, com a destruição
desses dois países, como economias em expansão, como governos com apoio
popular, como nações com políticas externas soberanas. Na ha presente
melhor para o Trump e sua política de retorno à guerra fria.
De economias que tinham recuperado sua capacidade de crescimento, de
governos que tinham priorizado as políticas sociais de distribuição de
renda de presidentes que haviam liderado os processos de integração
regional, passamos a governos que privilegiam o ajuste fiscal,
intensificando a recessão econômica, cortando recursos das politicas
sociais e acentuando as dinâmicas de exclusão social, a governos que
voltam a governar para poucos, a políticas externas de submissão
absoluta aos interesses dos Estados Unidos.
Agora se trata de bloquear a possibilidade de que os principais
líderes políticos latino-americanos possam se candidatar e voltar a
dirigir os seus países. A judicialização da política atinge diretamente a
Lula, a Cristina Kirchner, a Rafael Correa e começa a ameaçar o
principal líder da esquerda colombiana, Gustavo Petro.
Tudo como um presente para Trump, que consegue restabelecer pontes
com o continente, na Argentina, no Brasil, no Equador, no Chile,
enquanto perde laços carnais com o México. Vai se reduzindo a América
Latina à intranscendência, da mesma forma que havia ocorrido nos anos
1990, quando nenhum presidente do continente importunava a Washington.
Era também o momento de auge do neoliberalismo, no mundo e na América
Latina. Todos os países – à exceção, claro, de Cuba – aderiam a esse
modelo, como panaceia para todos os seus problemas. Os ajustes fiscais
diminuíam o tamanho do Estado, processo em que as privatizações de
patrimônios públicos faziam a festa para as grandes corporações
econômicas internacionais.
Enquanto isso se acentuava a desigualdade no continente mais desigual
do mundo, recessões econômicas se multiplicavam, vítimas dos ajustes,
acompanhadas de taxas de desemprego recordes. Dirigentes dos nossos
países disputavam a preferência na subserviência aos EUA, abandonando
qualquer veleidade de soberania nacional ou de integração regional.
O retorno àqueles anos se centra na destruição das economias do
continente, prioritariamente nas da Argentina e do Brasil, que vão
ficando reduzidas às suas expressões mínimas, completamente abertas aos
capitais estrangeiros – prioritariamente ao capital financeiro -,
concentradas em intensificar a superexploração dos trabalhadores e a
privatização de empresas estatais.
A reunião do G20 em Buenos Aires, no final de novembro, organizada
pelo presidente argentino Mauricio Macri, pretende ser uma apresentação
ao mundo da nova-velha cara do continente, espelhada na Argentina e no
Brasil. Trump deve vir, para controlar o grau de subserviência dos novos
mandatários da região, assim como impor novas orientações a esses
países.
Porém, ele não poderá se apresentar como o chefe de um bloco coeso,
que costumava responder às orientações de Washington. Trump acentuou as
divergências com a Europa – além de com a China e a Rússia -, desde a
guerra comercial até a retirada dos EUA dos acordos climáticos
estabelecidos em Paris, chegando agora a divergências sobre a proposta
europeia de construir uma forca militar própria, chocando-se com a da
Otan.
Por aqui tampouco nem Argentina, nem Brasil, poderão apresentar
resultados positivos da reinstauração dos modelos neoliberais. São duas
economias em profunda recessão, com níveis altíssimos de desemprego, sem
perspectiva de recuperação econômica. Nem os novos governos na
Colômbia, no Peru e no Chile, podem ser citados como exemplos do caminho
a seguir no continente.
Provavelmente Trump nem agradecera os presentes que lhe são ofertados,
com sua costumeira grosseria, passará em revista as tropas, dará ordens e
se retirará, contente com a nova ordem que reina no continente, não
importando a instabilidade, a miséria e a falta de esperança que
predominam. Para tentar desviar a atenção da sua insignificante figura,
Temer tentará levar o presidente eleito do Brasil e seu chanceler, para
mostrar que temos ainda piores esperam o maior pais do continente, mais
além da vergonha e do ridículo dos três.
Fonte Brasil 247