Os militares nunca estiveram nem aí para combater a corrupção. Alguns historiadores até contam que nunca houve tanta corrupção no Brasil como na ditadura militar, o que é bastante lógico, tratando-se de um regime que tinha o poder de proibir e censurar informações.
Por Aderbal Freire-Filho
Eduardo Cunha não estava nem aí para combater a corrupção, claro.
Geddel Vieira Lima, que dava entrevistas nas passeatas dizendo que era
preciso acabar com a corrupção, não estava nem aí para combater a
corrupção. A excelentíssima senhora do então prefeito de Montes Claros,
em MG, dando gritos inflamados contra a corrupção, não estava nem aí
para combater a corrupção. Aécio Neves, que liderou a cruzada de
moralização do Brasil, não estava nem aí para combater a corrupção.
Romero Jucá, que assumiu e desassumiu e assumiu de novo (na moita) o
“cargo” de primeiro-ministro do governo Temer, não estava nem aí para
combater a corrupção. Michel Temer, que acusou de ser bandido notório
seu convidado da meia-noite para um papo ameno sobre dietas e transporte
de valores, não estava nem aí para combater a corrupção.
A ministra Carmem Lúcia, que fez um discurso austero e moralizante,
quando assumiu a presidência do STF cercada da fina flor da corrupção,
não estava nem aí para combater a corrupção. Fernando Henrique Cardoso
não estava nem aí para combater a corrupção, tanto que criou o cargo de
Engavetador Geral da República, assumido em caráter vitalício por
Gerardo Brindeiro, que não estava nem aí para combater a corrupção. José
Serra, Geraldo Alkmin e Paulo Preto nunca estiveram nem aí para
combater a corrupção.
A grande maioria dos jornalistas que defende a moralização do país
que estaria sendo feita pela Lava à Jato, não está nem aí para combater a
corrupção. Tanto que só atacam os corruptos quando eles são presos ou
surpreendidos com a boca na botija (nessa hora, a imprensa começa com
ahs e ohs, como pode, ah, oh, no Jaburu, ah, oh, de noite, ah, oh, a
mala, ah, oh; eu digo, ué, gente, todo mundo sabia que esse cara era um
bandido, só esses jornalistas não? não é da profissão de jornalista ser
informado?). Fernando Collor de Mello, que dizia que ia acabar com a
corrupção, sem estar nem aí para combater a corrupção, foi eleito graças
a imprensa que o apoiou sem estar nem aí para combater a corrupção.
Os militares nunca estiveram nem aí para combater a corrupção. Alguns
historiadores até contam que nunca houve tanta corrupção no Brasil como
na ditadura militar, o que é bastante lógico, tratando-se de um regime
que tinha o poder de proibir e censurar informações. A família
Bolsonaro, então, que mantém funcionários fantasmas, recolhe grana dos
salários deles (e dos outros também), dá medalhas a milicianos e
sicários, monta um esquema de influencia e poder que elege pai, mãe,
filhos, tem patrimônio incompatível com sua renda, nunca esteve nem aí
para combater a corrupção.
Dalton Dallagnol, que foi na moita na Caixa Econômica negociar juros
para um dinheiro esquisitão, de uma jogada que armou com os Estados
Unidos e que a própria Procuradora Geral da República e o próprio STF
também acharam esquisitão, não está nem aí para combater a corrupção.
Sergio Moro nunca esteve nem aí para combater a corrupção, embora isso
só tenha ficado mais claro para muitos depois dele virar ministro de
corruptos e fazer cara de bobo (de cínico?) quando perguntam a ele pelo
Onyx, pelos laranjas, pelo ministro A, pelos milicianos, pelos filhos do
chefe, pela mulher do chefe, pelo ministro B, pelo Queiroz, pelo
ministro C, todos esses que, como ele, não estão nem aí para combater à
corrupção.
Todos esses falsos heróis do combate à corrupção têm um discurso que posso resumir. Mais ou menos assim.
“Hoje em dia, as pessoas já não respeitam nada. Antes, colocávamos
num pedestal a virtude, a honra, a verdade e a lei... A corrupção
campeia na vida do país nos nossos dias. Onde não se obedece a lei, a
corrupção é a única lei. A corrupção está minando este país. A virtude, a
honra e a lei desapareceram de nossas vidas”.
É o discurso síntese, uma palavra mais, outra menos. Podia ter
juntado vários discursos dessa gente, botado numa peneira e feito esse.
Mas nem foi preciso, peguei um que já estava pronto e que já fazia a
síntese de todos. Foi exatamente com essas palavras a declaração de um
desses heróis do combate à corrupção, em entrevista publicada na revista
Liberty, em 17 de outubro de 1931. Um que também não estava
nem aí para combater a corrupção, como vocês sabem. Qual deles? Al
Capone. Pois é, assim falou Al Capone, uns dias antes de ser preso.
Qual é então a esperança que podem ter os brasileiros na luta contra a
corrupção? É simples e não é simples: o verdadeiro combate à corrupção é
estrutural, envolve uma discussão maior, de educação, cultura, modelos
de sociedade.