Ao mesmo tempo em que externam sua fúria contra a corrupção, esses babacas apoiam as propostas que visam eliminar direitos e serviços que o Estado presta (ou deveria prestar) aos setores desamparados. Para eles, o combate à corrupção aceitável é apenas aquele que permita que eles e seus representados continuem deitando e rolando sobre os recursos públicos.
Por Jair de Souza*
Há muito tempo (pelo menos, desde a época de Getúlio Vargas), a gente
vê que a pretensa luta contra a corrupção tem servido como uma palavra
de ordem que os endinheirados (justamente os mais corruptos) empregam
para instigar as camadas médias a combater àqueles que propõem e tomam
medidas para beneficiar os setores mais necessitados da sociedade.
Em seus excelentes trabalhos recentemente publicados, o sociólogo
Jessé Freire já deixou claro que a adesão de boa parte da classe média a
essas pseudo-lutas contra a corrupção é uma maneira de esconder a
verdadeira canalhice que está por trás de sua motivação.
Ao levantar a bandeira do combate à corrupção, eles se sentem
mentalmente mais confortados do que se estivessem bradando abertamente
em função do que realmente sentem: um ódio visceral aos mais humildes e o
medo de vê-los melhorando suas condições de vida e se aproximando dos
níveis que as camadas médias ocupam.
No entanto, há também gente que, com muita sinceridade, fica
indignada com a corrupção que desde longa data permeia as estruturas de
nosso país (mais acentuada, sem dúvidas, no período da ditadura militar,
quando não era sequer possível denunciá-la sem correr risco de morte).
Porém, o que diferencia os verdadeiros lutadores contra a corrupção
dos babacas que se apegam a ela como uma falsa bandeira são as razões
pelas quais queremos eliminar a corrupção.
Os babacas rugem, uivam, ladram e berram pelo fim da corrupção,
sempre considerando que a grande corrupção é aquela praticada por
políticos, especialmente por políticos que tenham alguma afinidade com
os setores populares.
Os banqueiros e os grandes empresários, que compram os políticos para
usá-los em seu benefício, nunca são o alvo prioritário dessa gente.
Ao mesmo tempo em que externam sua fúria contra a corrupção, esses
babacas apoiam as propostas que visam eliminar direitos e serviços que o
Estado presta (ou deveria prestar) aos setores desamparados.
Então, para que combater a corrupção se o que se pretende é aplicar
menos recursos em educação pública, menos recursos para assistência
médica pública, menos recursos para a construção de moradias para as
pessoas de baixa renda, menos recursos para garantir aposentadoria e
amparo a nossa população, menos recursos para gerar um sistema de
transporte público adequado às necessidades do povo, etc?
Se não é para aplicar os recursos recuperados em benefício de nossa população, para que serve o combate à corrupção?
Sendo assim, podemos ensinar a esses babacas como se deve travar uma
luta ferrenha e sincera para eliminar a corrupção e suas mazelas.
— Vamos combater a corrupção para elevar o salário mínimo e o patamar salarial em seu conjunto.
— Vamos combater a corrupção não apenas para manter, mas para melhorar as condições de vida de nossos aposentados.
— Vamos combater a corrupção para que mais recursos sejam investidos
na educação pública e, com isto, melhorar a vida de professores e
funcionários e possibilitar a existência de uma educação pública de boa
qualidade.
— Vamos combater a corrupção para que se possa investir muito mais no
sistema de assistência médica pública, para que não seja mais preciso
pagar planos de saúde particulares quando se quer receber atendimento
médico.
— Vamos combater a corrupção para que seja possível investir na
formação de uma polícia honesta e honrada, que se dedique realmente a
proteger nosso povo, e não para viabilizar a criação de milícias que
sirvam como tropas de choque dos endinheirados.
Se você é realmente contra a corrupção, assuma seu papel nesta luta por estes objetivos.
Com o crescimento do movimento anticorrupção dentro destes
parâmetros, você vai ver como a rede Globo, a Lava Jato, a Veja, o SBT, a
Band, a Record, etc., rapidinho, vão querer evitar falar de corrupção.
Para eles, o combate à corrupção aceitável é apenas aquele que
permita que eles e seus representados continuem deitando e rolando sobre
os recursos públicos.
*Economista formado pela UFRJ; Mestre em Linguística pela UFRJ.
Fonte Vi o Mundo