Colunista Ribamar Fonseca critica o governo Bolsonaro e afirma que o
País também é sustentado pelo "Congresso amansado com bilhões de reais
para emendas e por uma verdadeira organização criminosa que espalha
mentiras pelas redes sociais". "Há temores de que a indignação reprimida
até agora possa explodir a qualquer momento, como aconteceu no Chile"
Brasil 247
Por Ribamar Fonseca
O Brasil parece anestesiado. E amedrontado. As tímidas
reações às ameaças quase diárias à democracia, à soberania e à liberdade
de expressão não traduzem indignação. E nem produzem efeitos concretos.
O Congresso, afora manifestações isoladas de alguns raros
parlamentares, parece um mosteiro, silencioso. Seus presidentes, Rodrigo
Maia, da Câmara; e Davi Alcolumbre, do Senado, tentam sugerir
independência com declarações críticas esporádicas, mas, na prática, se
comportam como aliados do governo. O Supremo, resumido a apenas três
ministros que às vezes reagem às agressões, parece não ter presidente,
que sempre mergulha em conveniente silêncio quando a instituição é
ameaçada. E a imprensa tradicional que, como um tigre feroz, nunca
poupou Lula e o PT, virou um gatinho medroso diante dos ataques e
ameaças raivosas do presidente Bolsonaro. E vez por outra, após uma
crítica cautelosa, ainda lhe faz afagos para tentar sensibilizá-lo e
conseguir alguma publicidade. O Brasil, na verdade, parece dominado pela
hipocrisia, pelo cinismo e pela covardia.
A Globo, cujos proprietários e funcionários foram chamados de
“canalhas” e “patifes” por um Bolsonaro enfurecido com a notícia do
depoimento do porteiro do seu condomínio no Rio, divulgou em resposta
uma nota tão tímida que foi vista como retratação. E passou a dar ampla
cobertura aos atos do governo, dedicando grandes espaços aos planos de
Paulo Guedes. Com a Folha não tem sido muito diferente. Em meio a
críticas, editoriais com elogios ao ministro da Economia, como se ele
pudesse ser dissociado do governo. Maia e Alcolumbre, por sua vez,
também tecem loas aos novos planos e prometem aprová-los com brevidade, a
exemplo do que fizeram com a reforma da Previdência, chegando a
afirmar, com a maior cara-de-pau, que eles, os planos, atendem aos
anseios da população. Enquanto isso, Bolsonaro se esforça para entregar o
nosso petróleo às multinacionais e prepara, também, a entrega da
Eletrobrás, tudo sob os aplausos entusiásticos dos vendilhões da pátria e
do silêncio dos militares e da mídia. E o ministro Guedes, como se
fosse o dono do país, afirma que “adoraria vender todas as estatais”. Teme-se que se Bolsonaro permanecer no Planalto até o final do mandato
não vai sobrar nada do Brasil, nem o pau da bandeira, como diria Itamar
Franco.
O fato é que diante do desastre Bolsonaro, que vem destruindo a Nação
de forma acelerada e ameaçando instalar um novo regime de exceção,
muita gente tem se perguntado: como foi que o brasileiro elegeu esse
homem para presidir o país? Ele passou 28 anos na Câmara dos Deputados
quase no anonimato, não fora a defesa eventual da ditadura e a apologia
da tortura, sem ter apresentado um único projeto que trouxesse algum
benefício ao país. Não tinha nenhuma experiência administrativa nem
preparo para ocupar o mais alto cargo da Nação. Ninguém conseguiu
identificar nele nenhuma qualidade, não tem equilíbrio emocional,
destemperando-se diante de qualquer crítica, nem postura de chefe de
Estado. Então, pergunta-se: como é que ele foi eleito presidente da
República do maior país da América do Sul? O povo teria enlouquecido
momentaneamente com seus discursos de ódio ou se deixado induzir pela
indústria de fakenews? Qual o tamanho da responsabilidade da mídia
tradicional na eleição do capitão? O fato é que, para surpresa de muita
gente dentro e fora do país, Bolsonaro saltou do nada para a Presidência
da República, mesmo revelando-se defensor da ditadura e da tortura. E
hoje ele e os filhos se comportam como donos do Brasil, fazem o que
querem e não gostam de ser contrariados, ameaçando todos os que se opõem
a eles.
Os religiosos costumam dizer que nada acontece sem a permissão de
Deus. Neste caso, obviamente se o capitão foi eleito é porque Deus
permitiu. Mas – perguntam – se Deus é brasileiro, como o povo costumava
dizer antes do atual governo, por que permitiu a eleição, para comandar o
país, de um homem como Bolsonaro, autoritário, defensor da tortura e
com um discurso de ódio que fez brotar os piores instintos de muita
gente? Segundo os espíritas, o Brasil foi escolhido por Jesus, conforme
mensagem do espírito Humberto de Campos, para ser a Pátria do Evangelho.
A ser verdade tal informação, por que Deus permitiu a eleição de um
homem para destruir justo a Pátria do Evangelho? Ninguém consegue sondar
os desígnios de Deus, mas há uma possível explicação: para dar valor à
luz é preciso viver nas trevas; para dar valor à saúde é preciso
experimentar as doenças; para dar valor ao belo é preciso conhecer o
feio. Então, a partir dessa premissa, era preciso vivenciar sob o tacão
de um presidente autoritário, raivoso, vingativo e entreguista, sem
preparo e nenhum apreço pelo povo, para se dar valor a um presidente
realmente democrata, preocupado com o bem-estar da população e o
progresso da Nação. Como ainda tem muita gente satisfeita com o seu
governo, cuja desaprovação já chega a 42%, tudo leva a crer que ele
deverá permanecer no Palácio do Planalto até que cresça o número de
descontentes. Quando a situação ficar efetivamente insuportável será o
momento em que o povo que o elegeu se conscientizará do erro que
cometeu.
Até agora o descontentamento tem sido traduzido através de
pronunciamentos isolados, que só fazem ruídos, sem iniciativas concretas
capazes de produzir maiores efeitos. Bolsonaro parece ter o controle do
Congresso, do Supremo, do Ministério Público, da Policia Federal e dos
militares. Além de impedir o avanço de qualquer investigação que possa
complicar o clã, mantendo sob rédea curta o ministro da Justiça, ele tem
a seu serviço um verdadeiro exército virtual que diariamente dissemina
fakenews nas redes sociais. Ele também usa a estratégia de dizer
barbaridades e depois pedir desculpas, como se isso apagasse todas as
suas agressões. O ministro Sergio Moro, seguindo a tática do seu chefe,
ao ser questionado recentemente sobre a declaração do deputado Eduardo
Bolsonaro ameaçando a volta do AI-5, simplesmente disse: “Ele já pediu
desculpas. Assunto encerrado”. Parece piada. Apesar da aparente
indiferença do povo, que estranhamente tem se mantido apático diante das
ações deletérias de Bolsonaro, ninguém pode garantir até quando o
brasileiro suportará tal situação, sustentada pelo Congresso amansado
com bilhões de reais para emendas e por uma verdadeira organização
criminosa que espalha mentiras pelas redes sociais. Há temores de que a
indignação reprimida até agora possa explodir a qualquer momento, como
aconteceu no Chile, com consequências imprevisíveis, o que levou setores
do governo a sugerir uma repressão mais rigorosa. Diante disso, só nos
resta rezar e pedir a Deus que tenha misericórdia do nosso Brasil.
Fonte Brasil 247