Por Sérgio Malbergier*
Os novos escândalos (eles são incontáveis) envolvendo a família Sarney são uma aula magna sobre o estado putrefato da política brasileira. Mesmo que não levem ninguém à prisão, serão para futuros pesquisadores de nosso atraso uma luz no bueiro em que nos encontramos politicamente.
Os diálogos captados pela Polícia Federal são impagáveis, reveladores. Três gerações de Sarney tramando, entre outras coisas, a nomeação do namorado da neta do patriarca, sim, o namorado da neta, para cargo no Senado. Um verdadeiro Big Brother Sarney do que há de pior no Brasil.
Não que os fatos sejam novidade. Quem não sabe quem eles são? Mas agora, além das recorrentes denúncias estampadas nos jornais, podemos ouvir diálogos da família na internet. E o calor da voz humana vale mil palavras escritas.
Ouvindo Maria Beatriz (Bia), ao mesmo tempo meiga e tenaz, negociando com o pai o cargo que antes era de seu irmão entende-se em poucos minutos como raciocina e opera a elite política do país.
A novidade é a emoção, o retrato íntimo que o grampo revela. Ouça! É bem melhor do que essa coluna. Ninguém nem quer saber o que faz ou quem é o tal namorado da neta do presidente do Senado, poucos dias depois nomeado assessor parlamentar 3 (R$ 2.700/mês). Por ato secreto, claro.
José Sarney, Napoleão maranhense, exilou-se em sua ilha de Curupu, esperando a tempestade passar, como passou em tantas e todas as vezes. Lula quer segurá-lo na importante cadeira e o prestigia sempre que pode. O presidente do Senado será imprescindível para esvaziar a CPI da Petrobras, ela mesma, orgulho nacional, mais uma vez enlameada pelos políticos que a exploram.
Em 1936, Sérgio Buarque de Holanda já escrevia: “A democracia foi sempre no Brasil um lamentável mal-entendido. Uma aristocracia rural e semifeudal importou-a e tratou de acomodá-la aos seus direitos e privilégios”.
Isso porque, como dizia o mesmo mestre, nosso convívio é ditado por uma ética de fundo emotivo, onde a si, aos amigos e aos parentes tudo é permitido, tolerado, mesmo o que para outros é imoral e ilegal.
A aristocracia rural foi substituída por uma aristocracia política ligada umbilicalmente a grandes grupos empresariais desde sua eleição via o assumidíssimo caixa 2 das campanhas. Essa aristocracia política tem como único fim sugar o máximo de recursos para seus grupos organizados. E só. O BBB sarneyzista impressiona e choca pela capilaridade, naturalidade e capacidade de seu grupo organizado dominar os aparelhos estatais.
O fato de Sarney não só seguir presidente do Senado, como manter seus homens comandando ministérios, postos públicos importantes e verbas milionárias é a melhor prova até aqui do atraso político brasileiro, de como estamos ainda, politicamente, na velha República.
Ao menos agora sabemos melhor como funcionam as grandes quadrilhas. Que o ministério público não ouça mais um conselho absurdo de Lula, de que deve levar em conta a biografia do investigado em suas investigações, diferenciando cidadãos perante a lei.
Se o adesismo lulista fez enorme bem à economia, mudando nosso patamar de desenvolvimento econômico, na política ele está sendo letal às nossas chances de progresso na área político-institucional.
É o que falta para transformarmos nosso potencial de nação em realidade.
(*) Jornalista, da Folha de S. Paulo
Para assitir o Funk do Sarney (Eu num sei o que é ato secreto) no You Tube clique abaixo: