Presidente do Legislativo deve enfrentar resistência na proposta de mexer com os recursos muitas vezes utilizados para aumentar salários
JULIANA SCARDUA
Da Reportagem
Uma nova celeuma política será deflagrada na Câmara de Cuiabá nesta segunda-feira (21) com uma reunião convocada pelo presidente da Casa, Deucimar Silva (PP), para discutir o futuro da verba indenizatória paga aos vereadores da Capital. A hipótese de extinção do mecanismo de compensação financeira será debatida, assim como a ideia de redução do teto mensal, estabelecido hoje em R$ 9 mil para cada um dos 19 vereadores cuiabanos.
A extinção da verba indenizatória fomenta discussões em todo o país que incitam a opinião pública contra auxílios tidos como verdadeiras “benesses” a parlamentares. No cerne dos questionamentos está o fato da verba servir, em vários casos, como um verdadeiro complemento salarial a políticos e não uma indenização pelas despesas acumuladas no dia-a-dia do exercício dos mandatos, o que coloca em xeque a transparência na aplicação dos recursos.
Na Câmara de Cuiabá, a mesma auditoria que apontou para um rombo nas contas do vereador Lutero Ponce (PMDB) indicou o pagamento de R$ 987.998,00 referentes à verba indenizatória. Do montante, R$ 134.714,47 teriam sido pagos irregularmente porque as despesas declaradas pelos vereadores não se enquadram nos tipos de gasto amparados pela resolução que estabelece a compensação financeira.
Conforme a análise pericial, a fatia de recursos públicos foi empregada na cobertura de despesas com material de expediente de informática, alimentação, reformas, medicamentos, óculos e armações, publicidade, exames de laboratório, gastos com telefones fixos, manutenção de automóveis e despesas com o estacionamento de veículos. Também foram detectados gastos com a contratação de consultorias em caráter contínuo, ao longo dos 12 meses do ano, e ainda recibos acolhidos ao invés de notas fiscais.
O relatório final da auditoria, assinado pela empresa de consultoria contábil Síntese, destaca também a constatação de que nenhuma despesa teve a finalidade pública comprovada pelos vereadores. “Não localizamos a comprovação de que tais gastos tenham se dado na finalidade pública, no caso, em atividade parlamentar”, ressalta a contadora Ginaira de Amorim num dos trechos.
O uso irregular da verba indenizatória, em alguns casos, pode resultar em retaliações. No Recife, resultado de auditoria especial feita nas contas de 2006 e 2007 da Câmara Municipal local culminou na suspensão de pagamentos aos vereadores pelo prazo de 90 dias, medida imposta pelo Tribunal de Contas de Pernambuco. Outra determinação foi a de adoção de sistema centralizado de aplicação dos recursos públicos, ou seja, tirando a autonomia dos gabinetes, até então células independentes nos gastos, para a instituição de uma tesouraria única no Legislativo.
Em Mato Grosso, consultas feitas ao Tribunal de Contas podem nortear as discussões na Câmara. Numa delas, feita pela Assembleia Legislativa em 2007, questionou-se ao TCE se a verba indenizatória poderia ser usada para a aquisição de bens de consumo e pagamento de hospedagem. Em resposta, o tribunal observou no julgamento que a concessão do pagamento “decorre de fatos ou acontecimentos previstos em lei que, pela sua natureza, exija dispêndio financeiro por parte do agente público”.
Outra advertência é a de que a verba indenizatória “não se incorpora ou integra à remuneração, aos subsídios ou proventos para qualquer fim”, conforme consta no acórdão 2206/2007, assinado por cinco conselheiros.
Fonte: Diário de Cuiabá