“Se a sociedade brasileira quis que fosse promulgada uma lei que barrasse pessoas com antecedentes que não são ideais para ocupar um cargo político, ficamos nesse impasse” (Nelson Calandra)
Por Edson Luiz
Anistia de ilícitos graves praticados antes da Ficha Limpa. Essa será uma das consequências caso, ao julgar o mérito, prevaleça no Supremo Tribunal Federal (STF) o entendimento de que a lei não pode retroagir para atingir candidatos condenados por órgãos colegiados. A avaliação é de Marlon Reis, presidente da Associação Brasileira de Magistrados e Procuradores Eleitorais e integrante do Movimento Contra a Corrupção Eleitoral (MCCE). “Se prevalecer esse entendimento, haverá na prática uma verdadeira anistia de ilícitos, que não terão qualquer repercussão na esfera eleitoral”, avalia Reis.
Mais do que com a retroatividade, Reis se preocupa com o debate em torno da aplicabilidade da Lei da Ficha Limpa. O argumento empregado por cinco ministros, nos julgamentos de Joaquim Roriz e de Jader Barbalho — ambos terminaram empatados — é de que o artigo 16 da Constituição Federal estabelece o princípio da anualidade para qualquer mudança no processo eleitoral, ou seja, qualquer nova lei só poderia ser editada um ano antes do pleito. O magistrado lembra que esse artigo foi incluído na Carta porque, durante o regime militar, para prejudicar a oposição, várias alterações eram promovidas pelo governo na legislação eleitoral às vésperas do pleito. “A Lei da Ficha Limpa atinge todos os partidos, todos os candidatos e atende ao princípio da moralidade. Foi a sociedade que a pediu e se aplica indistintamente”, afirma.
Empenho
Da mesma forma, o ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e membro do MCCE Marcello Lavenère Machado sustenta: “O cenário que consideramos mais grave será se o Supremo disser que a lei não se aplica para as eleições de 2010”. Lavenère sugere à sociedade e em especial a todos aqueles que se empenharam pela Lei da Ficha Limpa a se mobilizarem e acompanharem o julgamento no STF, amanhã. “Já existe a lei, que está sendo aplicada. Portanto, seria um retrocesso para a cidadania se a regra do jogo voltasse a ser modificada, para permitir que pessoas com a ficha suja concorram às eleições”, considera. “A sociedade brasileira não aceita isso. Todas as vezes que se manifestou, o fez no sentido de aplicação da Ficha Limpa.”
O presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Nelson Calandra, argumenta que se a Lei da Ficha Limpa não for aplicada nas eleições de 2010, quem perderá será a sociedade. “Muitas pessoas com antecedentes reprovados pela lei serão consideradas aptas a se candidatar e a exercer mandatos eletivos”, diz. “Se a sociedade brasileira quis que fosse promulgada uma lei que barrasse pessoas com antecedentes que não são ideais para ocupar um cargo político, ficamos nesse impasse”, avalia.
Fonte: Correio Brasiliense
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Gilmar Mendes, que foi contário à aplicação da Ficha Limpa nas eleições de 2010, é relator do caso
O Supremo Tribunal Federal (STF) julga nesta quarta-feira um recurso que vai definir o futuro da Ficha Limpa. Na pauta da Corte está o caso de Leonídio Bouças (PMDB-MG). Ele concorreu a uma cadeira na Assembleia Legislativa de seu Estado, mas não teve seus 41 mil votos validados devido a uma condenação por improbidade administrativa – o que o fez cair na nova lei de inelegibilidades.
Com o recurso, será a terceira vez que o STF tenta decidir o destino da nova lei. Nas duas outras ocasiões a Corte terminou num empate em cinco a cinco. O 11º voto, de desempate, não foi proferido, uma vez que a cadeira que pertencia a Eros Grau ainda não havia sido ocupada por Luiz Fux, que tomou posse no início do mês.
Com ele, a Corte terá de dizer se a Ficha Limpa foi válida para as eleições de 2010 ou, como as demais normas eleitorais, deve esperar um ano de sua publicação para ter efeitos – o que possibilitaria a aplicação da legislação somente nas eleições municipais de 2012.
Como Fux é o ministro com o menor tempo de STF, seu voto será proferido logo após o do relator da matéria, ministro Gilmar Mendes. Devido a isso, o destino da Ficha Limpa deve ser traçado nos primeiros minutos de julgamento. Na semana passada o magistrado declarou que seu voto será curto e coloquial.
Nos outros dois julgamento, que acabaram empatados, os ministros Ayres Brito, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Cármen Lúcia e Ellen Gracie foram favoráveis à aplicação da Lei da Ficha Limpa nas eleições de 2010. Foram contrários Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Celso de Mello, Marco Aurélio Mello e o presidente do STF, Cezar Peluso.
Apesar de já terem votado nos casos do ex-governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz e do ex-senador Jader Barbalho, os ministros podem alterar seu entendimento sobre a Ficha Limpa. Apesar da possibilidade, a mudança de voto é algo raro na Suprema Corte.
Fonte: Útimo Segundo
Leia mais:
O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral - MCCE, rede de organizações sociais responsável pela conquista da Lei da Ficha Limpa, a propósito do reinício dos julgamentos no Supremo Tribunal Federal relativos à aplicação da Lei Complementar n. 135/2010, conhecida como a Lei da Ficha Limpa, vem a público emitir o seguinte pronunciamento:
1. A LC n. 135/2010, ao instituir hipóteses de inelegibilidade reclamadas pelo próprio texto constitucional (art. 14, par. 9º), não criou sanções de natureza criminal, mas condições para a candidatura com a observância dos dados que marcam objetivamente a trajetória dos candidatos. É da natureza das condições - e a Constituição a isso se refere ao usar a expressão "vida pregressa" - a sua verificação conforme a observação de dados pretéritos. Constitui, pois, equívoco estender às inelegibilidades as regras que no âmbito do Direito Penal impedem a aplicação retroativa das leis. A verificação da presença de uma condição de inelegibilidade nada tem a ver com retroatividade, que, nesta matéria, só ocorreria se houvessem sido alteradas condições que vigoraram em eleições anteriores.
2. A aplicação da Lei da Ficha Limpa às Eleições 2010, por outro lado, não viola o art. 16 da Constituição Federal, cujo teor se estende apenas à quebra da igualdade de participação nos pleitos eleitorais, servindo na verdade para evitar que as minorias parlamentares sejam surpreendidas com a reforma casuística da legislação eleitoral. Quando a norma constitucional fala em "lei que alterar o processo eleitoral", faz ela menção a toda alteração legislativa capaz de surpreender a minoria, impedindo-a de mobilizar-se adequadamente para sujeitar-se às novas regras. No caso da LC n. 135/2010, isso não ocorreu. Trata-se de lei aprovada pela unanimidade do Congresso em atendimento a reclamo da sociedade brasileira, mobilizada contra a presença nos mandatos de pessoas objetivamente destituídas de qualificação para o seu exercício. A Lei da Ficha Limpa é, pois, plenamente aplicável às Eleições de 2010. A lei foi sancionada, por outro lado, antes mesmo da realização das convenções, em 4 de junho. Os partidos estavam conscientes das regras que a sociedade, por meio do Congresso Nacional, lhes impusera.
3. Havendo duas interpretações constitucionais plausíveis sobre um mesmo aspecto legal, não é de se esperar que o Supremo opte por aquele contrário à manifestação direta do soberano (o conjunto dos cidadãos) promovida sob a forma de iniciativa popular de projeto de lei.
Brasília, 22 de março de 2011.
Diretoria da Secretaria Executiva do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral.
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O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral - MCCE, rede de organizações sociais responsável pela conquista da Lei da Ficha Limpa, a propósito do reinício dos julgamentos no Supremo Tribunal Federal relativos à aplicação da Lei Complementar n. 135/2010, conhecida como a Lei da Ficha Limpa, vem a público emitir o seguinte pronunciamento:
1. A LC n. 135/2010, ao instituir hipóteses de inelegibilidade reclamadas pelo próprio texto constitucional (art. 14, par. 9º), não criou sanções de natureza criminal, mas condições para a candidatura com a observância dos dados que marcam objetivamente a trajetória dos candidatos. É da natureza das condições - e a Constituição a isso se refere ao usar a expressão "vida pregressa" - a sua verificação conforme a observação de dados pretéritos. Constitui, pois, equívoco estender às inelegibilidades as regras que no âmbito do Direito Penal impedem a aplicação retroativa das leis. A verificação da presença de uma condição de inelegibilidade nada tem a ver com retroatividade, que, nesta matéria, só ocorreria se houvessem sido alteradas condições que vigoraram em eleições anteriores.
2. A aplicação da Lei da Ficha Limpa às Eleições 2010, por outro lado, não viola o art. 16 da Constituição Federal, cujo teor se estende apenas à quebra da igualdade de participação nos pleitos eleitorais, servindo na verdade para evitar que as minorias parlamentares sejam surpreendidas com a reforma casuística da legislação eleitoral. Quando a norma constitucional fala em "lei que alterar o processo eleitoral", faz ela menção a toda alteração legislativa capaz de surpreender a minoria, impedindo-a de mobilizar-se adequadamente para sujeitar-se às novas regras. No caso da LC n. 135/2010, isso não ocorreu. Trata-se de lei aprovada pela unanimidade do Congresso em atendimento a reclamo da sociedade brasileira, mobilizada contra a presença nos mandatos de pessoas objetivamente destituídas de qualificação para o seu exercício. A Lei da Ficha Limpa é, pois, plenamente aplicável às Eleições de 2010. A lei foi sancionada, por outro lado, antes mesmo da realização das convenções, em 4 de junho. Os partidos estavam conscientes das regras que a sociedade, por meio do Congresso Nacional, lhes impusera.
3. Havendo duas interpretações constitucionais plausíveis sobre um mesmo aspecto legal, não é de se esperar que o Supremo opte por aquele contrário à manifestação direta do soberano (o conjunto dos cidadãos) promovida sob a forma de iniciativa popular de projeto de lei.
Brasília, 22 de março de 2011.
Diretoria da Secretaria Executiva do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral.
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