Segundo o poeta, apesar da condenação na Ação Penal 470, o partido cresceu nas eleições municipais e deve ganhar em São Paulo, ampliando sua capacidade de mascarar a verdade e manipular as carências dos mais necessitados; intelectual enxerga a população como massa de manobra de um projeto político hegemônico e não vê o eleitor como sujeito racional, capaz de decidir o que considera melhor para si próprio
247 – Ex-militante do Partido Comunista Brasileiro, o poeta Ferreira Gullar tem sido um dos críticos mais ácidos do PT e do chamado “lulismo”. Neste domingo, em artigo publicado na Folha de S. Paulo, ele descreve um Brasil que terá dificuldades para reencontrar o “rumo certo”, pois, mesmo condenando dirigentes petistas na Ação Penal 470, fortaleceu o PT nas urnas e deve também entregar ao partido a cidade mais rica do País: São Paulo.
De onde vem essa aparente contradição, incompreendida pelo poeta? Talvez da própria questão que afastou militantes comunistas e petistas ao longo do processo de transição democrática. Enquanto o PCB se manteve como partido de intelectuais, o PT buscou se inserir na sociedade por meio dos sindicatos, definindo-se como um partido autêntico, que buscava benefícios reais para a população mais pobre e não a superação definitiva da luta de classes.
Gullar, com a cabeça de velho comunista, enxerga a população apenas como massa de manobra, incapaz de discernir e diferenciar o que é melhor para si. Com as vitórias nas urnas, diz ele, o PT terá agora maior capacidade para mascarar a verdade e manipular as carências dos mais necessitados. Daí a dificuldade para reencontrar o “rumo certo”.
Falta ao poeta a humildade para reconhecer a soberania do eleitor e a capacidade de escolher, de forma racional, e não manipulada, o que considera melhor. O que talvez explique o ocaso do PCB (convertido em PPS) e o fato de o PT ter conquistado o poder, ampliando seus espaços a cada eleição.
Leia, abaixo, seu artigo deste domingo:
Piada de salão
O tiro saiu pela culatra, e o partido da ética na política consagrou-se como um exemplo de corrupção
Quando o escândalo do mensalão abalou a vida política do país e, particularmente, o governo Lula e seu partido, alguns dos petistas mais ingênuos choraram em plena Câmara dos Deputados, desapontados com o que era, para eles, uma traição. Lula, assustado, declarou que havia sido traído, mas logo acertou, com seus comparsas, um modo de safar-se do desastre.
Escolheram o pobre do Delúbio Soares para assumir sozinho a culpa da falcatrua. Para convencê-lo, creio eu, asseguraram-lhe que nada lhe aconteceria, porque o Supremo estava nas mãos deles. Delúbio acreditou nisso a tal ponto que chegou a dizer, na ocasião, que o mensalão em breve se tornaria piada de salão.
Certo disso, assumiu a responsabilidade por toda a tramoia, que envolveu muitos milhões de reais na compra de deputados dos partidos que constituíam a base parlamentar do governo.
Embora fosse ele apenas um tesoureiro, afirmou que sozinho articulara os empréstimos fajutos, numa operação que envolvia do Banco do Brasil (Visanet), o Banco Rural e o Banco de Minas Gerais, e sem nada dizer a ninguém: não disse a Lula, com que privava nos churrascos dominicais, não disse a Genoino, presidente do PT, nem a José Dirceu, o ministro político do governo.
Era ele, como se vê, um tesoureiro e tanto, como jamais houve igual. Claro, tudo mentira, mas estava convencido da impunidade. A esta altura, condenado pelo STF, deve maldizer a esperteza de seus comparsas. Mas os comparsas, por sua vez, devem amaldiçoar o único que, pelo menos até agora, escapou ileso do desastre - o Lula.
Pois bem, como o tiro saiu pela culatra e o partido da ética na política consagrou-se como um exemplo de corrupção, Lula e sua turma já começaram a inventar uma versão que, se não os limpará de todo, pelo menos vai lhes permitir continuar mentindo com arrogância. O truque é velho, mas é o único que resta em situações semelhantes: posar de vítima.
E se o cara se faz de vítima, tem o direito de se indignar, já que foi injustiçado. Por isso mesmo, vimos José Genoino vir a público denunciar a punição que sofreu, muito embora tenha sido condenado por nove dos dez ministros do STF, quase por unanimidade.
A única hipótese seria, neste caso, que se trata de um complô dos ministros contra os petistas. Mas mesmo essa não se sustenta, uma vez que dos dez membros do Supremo, oito foram nomeados por Lula e Dilma.
Reação como a de Genoino era de se esperar, mesmo porque, alguns dias antes, a direção do PT publicara aquele lamentável manifesto em que afirmava ser o processo do mensalão um golpe semelhante aos que derrubaram Getúlio Vargas e João Goulart. Também a nota posterior à condenação de José Dirceu repete a mesma versão, segundo a qual os mensaleiros estão sendo condenados porque lutam por um Brasil mais justo. O STF, como se sabe, é contra isso.
Não por acaso, Lula -que reside num apartamento duplex de cobertura e veste ternos Armani- voltou a usar o mesmo vocabulário dos velhos tempos: "A burguesia não pode voltar ao poder". Sim, não pode, porque agora quem nos governa é a classe operária, aquela que já chegou ao paraíso.
Não tenho nenhum prazer em assistir a esse espetáculo degradante, quando políticos de prestígio popular, que durante algum tempo encarnaram a defesa da democracia e da justiça social em nosso país, são condenados por graves atentados à ética e aos interesses da nação. As condenações ocorreram porque não havia como o STF furtar-se às evidências: dinheiro público foi entregue ao PT, mediante empréstimos fictícios, que tornaram possível a compra de deputados para votarem com o governo. Tudo conforme a ética petista, antiburguesa.
Mas não tenhamos ilusões. Apesar de todo esse escândalo, apesar das condenações pela mais alta corte de Justiça, o PT cresceu nas últimas eleições. Tem agora mais prefeituras do que antes e talvez ganhe a de São Paulo. Nisso certamente influiu sua capacidade de mascarar a verdade, mas não só. Com a mesma falta de escrúpulos, tendo o poder nas mãos, manipula igualmente as carências dos mais necessitados e dos ressentidos.
Não vai ser fácil acharmos o rumo certo.
Fonte: Brasil 247
Leia mais:
PASTELÃO DO MENSALÃO
Os melhores filmes de tribunal que vi na vida foram Sacco e Vanzetti (d. Giuliano Montaldo, 1971), O veredicto (d. Sidney Lumet, 1982), Doze homens e uma sentença (d. Sidney Lumet, 1957), Julgamento em Nuremberg (d. Stanley Kramer, 1961), O sol é para todos (d. Robert Mulligan, 1962) e O vento será sua herança (d. Stanley Kramer, 1960).
Um degrau abaixo estão Testemunha de Acusação (d. Billy Wilder, 1957) e Anatomia de um crime (d. Otto Preminger, 1959).
O amargo, mas um tanto forçado, Justiça para Todos
(d. Noman Jewison, 1979) se coloca num patamar ainda inferior, o que
não o impede de ser o mais apropriado para explicar o que vimos na
maratona do mensalão.
No final de um julgamento igualmente grotesto, o advogado Kirkland (Al Pacino) chuta o pau da barraca, explicando aos jurados que os partícipes daquela encenação pomposa queriam mesmo era vencer, não fazer justiça.
Isto ficou mais do que evidenciado no mafuá da ação penal 470, com o relator Joaquim Barbosa usando e abusando de retórica intimidatória para obter as condenações e o revisor Ricardo Lewandowski reagindo às derrotas pessoais com incoerências típicas de um pavão pirracento, como suas mudanças de votos para fabricar empates.
No final de um julgamento igualmente grotesto, o advogado Kirkland (Al Pacino) chuta o pau da barraca, explicando aos jurados que os partícipes daquela encenação pomposa queriam mesmo era vencer, não fazer justiça.
Isto ficou mais do que evidenciado no mafuá da ação penal 470, com o relator Joaquim Barbosa usando e abusando de retórica intimidatória para obter as condenações e o revisor Ricardo Lewandowski reagindo às derrotas pessoais com incoerências típicas de um pavão pirracento, como suas mudanças de votos para fabricar empates.
O pouco de respeito que ainda tinha pelo Supremo Tribunal Federal, eu o
perdi nos julgamentos do Caso Battisti, ao constatar a tendenciosidade
extrema com que Cezar Peluso e Gilmar Mendes atuaram, alinhados
escancaradamente com a posição italiana.
Como a extradição era impossível segundo as leis brasileiras, os dois
não hesitaram em, alternando-se nas posições de presidente do STF e
relator do processo, promoverem um verdadeiro arrastão jurídico. Chegaram, p. ex., a estuprar a instituição do refúgio, sem que os demais ministros reagissem à altura.
Com isto, ambos alongaram artificialmente uma pendenga que jamais deveria ter prosseguido após a decisão do ministro da Justiça Tarso Genro em janeiro de 2009; e, menos ainda, depois da palavra final do presidente Lula em dezembro de 2010, tendo a mais alta corte do país, nos meses seguintes, se acumpliciado com um indiscutível SEQUESTRO!
Com isto, ambos alongaram artificialmente uma pendenga que jamais deveria ter prosseguido após a decisão do ministro da Justiça Tarso Genro em janeiro de 2009; e, menos ainda, depois da palavra final do presidente Lula em dezembro de 2010, tendo a mais alta corte do país, nos meses seguintes, se acumpliciado com um indiscutível SEQUESTRO!
Agora, o pastelão do mensalão
veio comprovar definitivamente que o Judiciário é mais um dos nossos
podres poderes, nada ficando a dever ao Executivo e Legislativo.
Quem consegue enxergar o óbvio, percebeu de forma cristalina que cada
ministro decidiu seus votos por motivos que nada tinham a ver com a
Justiça e depois foi garimpar as justificativas cabíveis, expondo-as
num juridiquês abominável.
E a veja (que um dia foi revista, mas hoje não passa de
house organ da extrema-direita) caiu no ridículo total, ao saudar o
desfecho que ela tudo fez para insuflar como uma "vitória suprema".
Para as pessoas equilibradas, mesmo as que acreditavam na culpabilidade
dos réus, a sensação que ficou foi a de eles terem sido linchados, não
julgados.
Eu iria além: tão pesaroso quanto Violeta Parra, concluo que "en mi
patria no hay justicia" quando a indústria cultural manipula as
consciências de forma tão avassaladora como desta vez.
Fonte: Náufrago da Utopia
Leia mais:
Marx diria: STF serve às elites, estúpido!
Por que Duda Mendonça não foi condenado com base no "Fato Motivador",
como foram os réus do núcleo político diante da ausência completa de
provas da PGR?
Por MARCUS VINÍCIUS
Além de filósofo, economista e "pai do comunismo", Karl Marx batia um bolão como jornalista. No próximo 25 de outubro completa-se 151 anos de uma das análises mais contundentes sobre a Guerra da Secessão. O texto foi escrito por Marx para o Die Presse, um diário austríaco burguês de tendência liberal, e mostra como a Corte Suprema dos Estados Unidos se tornou o último bastião das elites escravistas do Sul contra os brancos livres do Norte.
As elites sulistas se valiam de seu domínio sobre o Congresso Norte-Americano para manter e ampliar o regime escravagista. Esse poder, no entanto, erodia-se devido ao crescimento acelerado da população dos estados do Norte e Nordeste, não escravistas. Como a representação na Câmara dos Representantes é ligada à população dos estados, e as populações dos estados livres cresciam acima daquela dos estados escravistas, as elites escravistas perdiam gradativamente o controle da Câmara e dependiam cada vez mais do Senado, onde cada estado, independente da população, tinha dois representantes.
Ocorre que, os senhores de escravos também estavam perdendo o controle do Senado e para manter o status quo se valeram da JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA. Notou aí semelhanças com as elites do Brasil? Sim, as elites norte-americanas recorreram à Corte Suprema dos EUA para garantir seus privilégios, e foram os Juízes Supremos, que segundo Marx, deram veredicto pela escravidão:
"Ela (Corte Suprema) decidiu, em 1857, no notório caso Dred Scott, que todo cidadão americano possui o direito de levar consigo para qualquer território qualquer propriedade reconhecida pela Constituição. Consequentemente, com base na Constituição, os escravos poderiam ser forçados pelos seus donos a trabalhar nos territórios. E assim todo senhor de escravos estaria individualmente habilitado a introduzir a escravatura em territórios até agora livres conta a vontade da maioria dos colonos. O direito de eliminar a escravidão foi tirado das legislaturas territoriais e o dever de proteger os pioneiros do sistema escravagista foi imposto ao Congresso e ao governo da União (pela Corte Suprema)".
Luta de classes
No Brasil, desde a eleição do presidente Luis Inácio Lula da Silva (PT), as elites conservadoras, que se valeram do Golpe Militar de 1964 para chegar ao poder, têm perdido gradativamente espaço na Câmara Federal e no Senado. O DEM (ex-PFL, ex-PDS, ex-Arena), desmilinguiu-se. No período(1995-2002) de governo do presidente Fernando Henrique Cardoso(PSDB) o partido chegou a ter 105 deputados federais e 17 senadores na legislatura de 1999. Os eleitos em 2010 foram 4 senadores e 43 deputados, número que reduziu-se a 28, pela migração para outras siglas como o PSD. Em 2004 o PFL tinha 6.460. Em 2012 o DEM reduziu-se a 3.271, ou seja 3.189 vereadores a menos! Em 1996, o PFL elegeu 934 prefeitos, saltou a 1.028 no ano 2000 e em 2012, o DEM elegeu somente 271, ou seja 757 prefeitos a menos!
Até o segundo mandato do presidente Lula, o equilíbrio de forças no Senado era desfavorável ao petista. Com a eleição de sua sucessora, a aliança trabalhista formada por PT-PMDB-PSB-PC do B-PDT e outros partidos, passou a ter domínio no Congresso Nacional. A presidenta Dilma Roussef assumiu com uma bancada de 311 votos(de 513) na Câmara Federal e de 50(de 81) no Senado. Assim como Karl Marx testemunhou a JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA via Corte Suprema nos EUA, numa reação conservadora a perda de comando no Legislativo, o Brasil assiste movimento similar, no STF que se expressa com mais vigor no julgamento da Ação 470, o dito, "Julgamento do Mensalão".
Exagero? Não.
O que justifica que no julgamento do publicitário Duda Mendonça os ministros do Supremo Tribunal Federal tenham considerado lícito o pagamento de seus serviços na campanha de 2002, com recursos oriundos do Banco Rural, mas em relação aos empréstimos feitos no mesmo banco, para pagamento de despesas de campanha no PR, de Waldemar Costa Neto, no PP, de Pedro Henry, ou pelo PT de Delúbio Soares e José Genoíno, o mesmo dinheiro do Banco Rural transformou-se em "corrupção passiva" e lavagem de dinheiro?
Não houve, nos dois casos, pagamento de despesas de campanha?
Por que apesar da ausência completa de provas no relatório da Procuradoria Geral da República, os chamados "réus do núcleo político" foram condenados com base no "Fato Motivador", no entanto, apesar do esculacho do ministro Joaquim Barbosa contra o procurador Roberto Gurgel, pela PGR não ter produzido provas contra Duda Mendonça, o empresário não foi enquadrado no mesmo "Fato Motivador"?
O Fato Motivador só se aplica a Puta, Preto, Pobre e Petista, como diria o ator José de Abreu?
Por que o caixa dois do PSDB, o chamado "Mensalão Tucano", efetivado na tentativa de reeleição do governador Eduardo Azeredo em 1998, teve seu processo desmembrado para julgamento em 1ª e 2ª instâncias, enquanto o "mensalão do PT" teve direito a apenas uma instância de julgamento?
Por que o ministro relator, que colheu as provas na fase de inquérito, também participa do julgamento, tal e qual nos Tribunais da Inquisição?
As respostas estão novamente na análise cento-cinquentenária de Karl Max: as elites, quando perdem o poder popular, recorrem aos últimos nacos de poder que controlam: seus pares no judiciário e às armas.
Em 1860 foram à guerra contra Lincoln. Em 1964, ao golpe contra Jango. E em 2012, ao STF contra Lula e o PT.
Nos EUA, os aristocratas do Sul, no Brasil, os Barões da Mídia a comandar a Corte Suprema.
Ah, diriam alguns, mas o relator da Ação 470, Joaquim Barbosa é um
filho do povo, um ministro cujo pai era pedreiro, que veio do interior
do país, de Paracatu-MG. Sim, de lar humilde, mas, ao que tudo indica,
sem compromissos com sua classe de origem, pois somente isto justifica
sua frase: "Presidente, o Supremo Tribunal Federal não tem que dar
satisfação a ninguém!"
Se o Supremo como Poder da República, segundo o ministro Barbosa, não
deve satisfações ao povo, é porque do povo está divorciado. Se a Corte
Suprema Brasileira não está casada com o povo que banca neste ano de
2012, com impostos, os R$ 614,073 milhões aprovados na LDO para
manutenção do STF, cumpre a este povo perguntar: a quem serve o STF?
Marx responderia: "Serve às elites, estúpido"!