sábado, 10 de novembro de 2012

Brasil, país dos contrastes

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Com população de 192 milhões de habitantes, apenas 6,6 milhões de brasileiros se encontram na universidade




Por Frei Betto 

Stefan Zweig intitulou Brasil, país do futuro seu livro de ensaios lançado em 1941, quando veio conhecer o país que o acolheria e no qual morreria no ano seguinte. Ora, pode ser aplicado ao futuro o que diz Eduardo Galeano a respeito da utopia: como o horizonte, está sempre ali na frente, mas não se pode alcançá-la, por mais que se caminhe em sua direção. 

Prefiro afirmar que o Brasil é um país de contrastes. Com população de 192 milhões de habitantes (dos quais 30 milhões na zona rural, onde predomina o latifúndio com grandes extensões de terras improdutivas), apenas 6,6 milhões de brasileiros se encontram na universidade. E dos 92 milhões de trabalhadores, quase a metade não tem carteira assinada. 

Temos a maior área fundiária da América Latina e nunca se fez aqui uma reforma agrária. Somos o principal exportador de carne e temos a segunda maior frota de helicópteros das Américas, e convivemos com a miséria de 16 milhões de habitantes (dos quais 40% têm até 14 anos de idade e 71% são negros e pardos). 

As marcas de 350 anos de escravidão no Brasil ainda são visíveis no fato de a maioria da população negra ser pobre e, com frequência, discriminada. O Brasil, considerado hoje a 6ª economia do mundo, ocupa a vergonhosa posição de 84º lugar no IDH da ONU (2012). 

Embora 65% da renda nacional se concentrem em mãos de apenas 10% da população, o país experimenta sensíveis melhoras nesses primeiros anos do século XXI. Graças aos programas sociais dos governos Lula e Dilma, 30 milhões de pessoas deixaram a miséria. O controle da inflação, o crédito facilitado e a redução dos juros ampliam o segmento da classe média. A desoneração da indústria automobilística e dos produtos de linha branca (geladeiras, máquinas de lavar etc.) dão acesso a bens de consumo. 

No entanto, 4 milhões de menores de 14 anos de idade ainda se encontram fora da escola e submetidos a trabalhos indignos. Cinco milhões de agricultores sem-terra se abrigam em precários acampamentos à beira de estradas ou habitam assentamentos com baixo índice de produtividade. Dos domicílios, 47,5% carecem de saneamento básico. Isso abrange um universo de 27 milhões de moradias nas quais vivem 105 milhões de pessoas. 

Há cerca de 25 mil pessoas submetidas ao trabalho escravo, sobretudo nos estados da Amazônia, cujo desmatamento, provocado pelo agronegócio e a exploração predatória feita por empresas mineradoras, não cessa de despir a floresta de sua exuberância natural. 

Na ponta mais estreita da pirâmide social, os brasileiros gastam, em viagens no exterior, US$ 1,8 bilhão por mês! O rombo nas contas externas atingirá, este ano, a cifra recorde de US$ 53 bilhões. Nos últimos anos, a baixa cotação do dólar em relação ao real afetou a indústria nacional e favoreceu a entrada de produtos estrangeiros. 

Como a economia brasileira está ancorada principalmente na exportação de commodities, a crise financeira mundial reduz progressivamente as encomendas, tornando pífio o crescimento do PIB, previsto este ano para 1,2%. 

Considerado o segundo maior consumidor de drogas no mundo (atrás apenas dos EUA), o Brasil convive com expressiva violência urbana. Os homicídios são a principal causa de mortes de jovens entre 12 e 25 anos. 

Embora a situação social do Brasil tenha melhorado substancialmente na última década (a ponto de europeus afetados pela crise financeira migrarem para o nosso país em busca de emprego), falta ao governo implementar reformas estruturais, como a agrária, a tributária e a política. 

O sistema de saúde pública é precário e somente neste ano os deputados federais propuseram dobrar para 10% do PIB o investimento federal em educação. Convivemos com 13,6% de adultos analfabetos literais e 29% de adultos analfabetos funcionais (sabem ler e assinar o nome, mas são incapazes de escrever uma carta sem erros ou interpretar um texto). 

Segundo o Instituto Pró-Livro, o brasileiro lê apenas 4 livros por ano. E apenas 5% da população é capaz de se expressar em inglês, dos quais a maioria sem domínio do idioma. 

O poder público brasileiro, com raras exceções, é avesso à cultura. O orçamento 2012 do Ministério da Cultura é de apenas R$ 5 bilhões (o PIB atual do Brasil é de R$ 4,7 trilhões). O que explica o país dispor de apenas 3 mil livrarias, a maioria concentrada nas grandes cidades do Sul e do Sudeste do país. 

Apesar das dificuldades que o Brasil atravessa, somos um povo viciado em otimismo. Temos, por hábito, guardar o pessimismo para dias melhores... 

Agora o nosso horizonte de felicidade se coloca na Copa das Confederações em 2013; na Copa do Mundo em 2014; e nas Olimpíadas do Rio de Janeiro, em 2016. 

Como o nosso país estará no centro das atenções mundiais, o governo apressa obras, reforma estádios, aprimora a infraestrutura e promete festas que nos farão esquecer que ainda somos, socialmente, uma das nações mais desiguais do mundo. 

 Frei Betto é escritor, autor do romance “Minas do Ouro” (Rocco), entre outros livros.


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CONTRA A "CENSURA", DILMA RECEBE APLAUSOS EM VEJA


"Estou convencida de que, mesmo quando há exageros, e nós sabemos que em qualquer área eles existem, é sempre preferível o ruído da imprensa livre ao silêncio tumular das ditaduras". Frase da presidente é destacada em reportagem da revista desta semana, que critica "cúpula stalisnista" do PT; setores do partido, por sua vez, enxergam que Veja é peça central na eliminação de José Dirceu, na caçada a Lula e preveem futuro ataque a Dilma 


247 - José Dirceu ontem, Luiz Inácio Lula da Silva hoje, Dilma Rousseff amanhã. É assim que algumas alas do PT enxergam o comportamento "golpista" dos principais meios de comunicação do País, em especial da revista Veja. Dirceu já foi. Está condenado, sem passaporte e prestes a ser preso. Lula pode vir a ser o próximo alvo de um inquérito criminal, cuja origem da representação apresentada ao procurador Roberto Gurgel são duas reportagens não comprovadas da própria revista Veja, com declarações atribuídas a Marcos Valério. Depois disso, seria a vez do ataque à presidente Dilma Rousseff, para evitar sua reeleição em 2014. 

Tenha ou não fundo de verdade, essa tese, aparentemente, não incomoda a presidente da República. Nesta semana, ao participar de um seminário sobre o combate à corrupção em Brasília, ela disse uma frase (já pronunciada por ela própria em outras oportunidades) que, fatalmente, seria reproduzida na revista Veja desta semana. "Estou convencida de que, mesmo quando há exageros, e nós sabemos que em qualquer área eles existem, é sempre preferível o ruído da imprensa livre ao silêncio tumular das ditaduras". 

Não deu outra. No texto "Recado aos liberticidades", a frase de Dilma foi usada por Veja a seu favor e contra a "cúpula stalinista" do PT. Segundo a revista, Dilma reafirmou a defesa da liberdade de imprensa, "contrariando petistas e mensaleiros inconformados com a condenação no Supremo Tribunal". 

A revista destaca ainda que a frase vem num momento importante, em que o presidente da legenda, Rui Falcão, "anunciou como prioridade para o próximo ano convencer o governo a apoiar o projeto que visa, em última análise, a submeter a imprensa livre a constrangimentos ideológicos". 

A mesma reportagem qualifica o ex-presidente Lula e o ex-ministro José Dirceu como "liberticidas" e afirma que "o objetivo da falconaria petista é a instituição da censura no Brasil". Rui Falcão, no entanto, fala em "ampliar a liberdade de expressão" e combater monopólios, assim como a distribuição de concessões de rádio e televisão a grupos políticos. 

Como presidente da República, a presidente Dilma se equilibra entre as pressões do PT, dos seus aliados, de setores da sociedade e suas próprias convicções. Ao prestar a declaração da última semana, ela reafirmou um de seus princípios básicos, mas também assumiu um risco, ciente de que os aplausos recebidos em Veja, uma revista constantemente questionada por seus métodos, certamente poderão gerar atritos com seu próprio partido. 

Mas, como diz o título de sua biografía, escrita pelo competente jornalista Ricardo Amaral, "A vida quer é coragem". E Dilma, aparentemente, não tem medo.

Fonte Brasil 247


Saiba mais:

Dilma, mídia e a iniciativa popular

Chega de esperar a democratização da mídia pelo governo Dilma!


 


Por Altamiro Borges, em seu blog
 
Se depender do governo, o Brasil nunca terá uma legislação democrática sobre os meios de comunicação. Não há qualquer sinal de que a presidente Dilma esteja disposta a enfrentar os barões da mídia. Pelo contrário. Na 15ª Conferência Internacional Anticorrupção, realizada nesta semana em Brasília, ela repetiu: “Como já disse várias vezes, eu estou convencida de que mesmo quando há exageros, e nós sabemos que eles existem, é sempre preferível o ruído da imprensa livre ao silêncio tumular das ditaduras”. Pura platitude!

Governo teme enfrentar os barões da mídia

A presidenta insiste em confundir liberdade de expressão com liberdade dos monopólios midiáticos. Pior: por razões pragmáticas, ela finge desconhecer que esta mesma mídia, que hoje comete “exageros”, apoiou o golpe militar e o “silêncio tumular da ditadura”. A democratização dos meios de comunicação, com uma regulação que garanta maior diversidade e pluralidade informativas, é o que poderia garantir a verdadeira liberdade de expressão e uma “imprensa livre”. Mas a presidenta teme tocar no vespeiro.

Neste sentido, não adianta criticar apenas o Ministério das Comunicações e o seu titular, Paulo Bernardo. Ele segue ordens! Não é para menos que o projeto sobre o novo marco regulatório do setor, elaborado pelo ex-ministro Franklin Martins no final do governo Lula, foi enterrado. Até mesmo a tímida proposta de uma consulta democrática à sociedade sobre o tema foi arquivada nas gavetas do Palácio do Planalto. Em setembro, o ministro confessou que “a consulta não vai sair já”. Deveria ser mais sincero: ela não vai sair!

Veja aplaude a presidenta

O governo atual não reuniu convicção e coragem para enfrentar a mídia – a mesma que promove diariamente uma campanha de cerco e aniquilamento do governo e das forças de esquerda. Lógico que o discurso desta semana agradou os barões da mídia. A revista Veja até aproveitou para dar mais uma estocada na “cúpula stalinista” do PT. No artigo “Recado aos liberticidas”, ela festejou o discurso de Dilma, que “contraria petistas e mensaleiros inconformados com a condenação no Supremo Tribunal Federal”.

Para Bob Civita, que até hoje não foi convocado para explicar as suas ligações com a máfia de Carlinhos Cachoeira, a defesa da “liberdade de imprensa” veio em ótima hora. A revista lembra que o presidente do PT, Rui Falcão, “anunciou como prioridade para o próximo ano convencer o governo a apoiar o projeto que visa submeter a imprensa livre a constrangimentos ideológicos”. Ela rotula Lula e o ex-ministro José Dirceu de “liberticidas” e afirma que “o objetivo da falconaria petista é a instituição da censura no Brasil”.

Milhares de assinaturas no país

Ou seja: a revista elogia Dilma e ataca seu partido e as forças que dão sustentação ao seu governo. Mesmo assim, a ficha não cai e o governo repete o discurso enfadonho do “controle remoto” ou da “imprensa livre”. A conclusão é óbvia. Não dá para esperar qualquer atitude deste governo no rumo da democratização deste setor estratégico. Neste sentido, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) acertou ao lançar neste ano a campanha “Para expressar a liberdade”, que exige a regulação da mídia.

Passadas as eleições, ela precisa agora ganhar as ruas. Os movimentos sociais, principais vítimas da mídia patronal, são os maiores interessados nesta batalha. Esta demanda é transversal e afeta todas as lutas dos trabalhadores. Para ter êxito, a campanha dependerá de intensa mobilização que ajude a alterar a correlação de forças na sociedade e a intensificar a pressão sobre o governo. 

Neste sentido, talvez seja o momento de defender um projeto legislativo de iniciativa popular sobre o tema. A coleta de milhares de assinaturas no país ajudaria na mobilização e conscientização da sociedade. Não dá para mais esperar qualquer iniciativa do atual governo!

Fonte: Blog do Miro





 
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