Resta saber agora se a
Justiça Eleitoral vai agir. Há um candidato cuja lista de apontamentos de
irregularidades chega a 40 páginas, e ficamos aqui curiosos em saber se o mesmo
terá o “benefício” de aprovação das contas de sua campanha. Se passar por este
filtro da “Justiça” logo, logo será alcançado pelos noticiários policiais, será
mais um “metendo a mão” em recursos públicos.
O motivo que levou à
criação do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) foi a constatação
de que os grandes problemas de desvios de recursos públicos, corrupção
envolvendo fraudes na atuação dos gestores, eram decorrentes de vícios que
haviam se dado, antes, no processo eleitoral.
É bem fácil de ver que o
candidato pede apoio financeiro a empresas para custear a sua campanha
eleitoral, e em troca da doação feita, aquelas serão fornecedoras do ente
público tão logo seja declarado o vencedor da eleição. E é lógico de se esperar
que no sistema capitalista não exista a figura do “financiador samaritano”, se
ele aplica recursos financeiros no candidato é porque deseja gordos contratos
públicos. É um simples e esfomeado investidor, não um apaixonado por política
ou por boas práticas de gestão. Nessas contratações, geralmente por meio de
processos viciados, é que são “quitados” os débitos que restaram da campanha
eleitoral, de modo que as caríssimas peças de propaganda (incluindo os horrorosos
cavaletes e as “novelinhas” com choro na tevê) são pagas indiretamente por toda
a sociedade.
Com essas premissas
podemos concluir que o “ovo da serpente” de toda a corrupção é a especialíssima
Corrupção Eleitoral. E institucionalmente quem deve combate-la é a Justiça
Eleitoral, ramo do Poder Judiciário que ganhou importância, mas ainda está em
débito com a sociedade. A demora para decidir, somada à incapacidade de punir
as infrações eleitorais, levam a uma insegurança jurídica, quebra de confiança e
políticos acusados de corrupção exercem o mandato integralmente, seus inúmeros processos
nunca são julgados.
Nesta campanha de 2014 o
Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso lançou mão de um aplicativo chamado
“Pardal”, na verdade um software que permite o envio de denúncias de infrações
eleitorais a uma plataforma eletrônica. A ideia é boa, o cidadão pode
fotografar ou gravar em formato de áudio, e enviar pelo smartphone diretamente
a quem tem atribuição de punir. Segundo notícias do próprio TRE centenas de denúncias
foram registradas durante o processo eleitoral por meio do sistema Pardal,
prova de que o cidadão flagrou ilicitudes.
Mas uma pergunta ainda não
teve resposta: quantos infratores foram ou serão punidos?
Ora, a eleição de 2014
foi atípica, graças a Copa do Mundo e a um grupo de candidatos ficha-suja que
insistiram em desafiar a paciência do eleitor (apresentando candidaturas
juridicamente inviáveis). Isso afastou o bom debate eleitoral, e para se ter
uma ideia da apatia geral, um contingente de 900 mil eleitores, mais robusto
que os 830 mil que depositaram voto no governador eleito, deixaram de comparecer
às urnas em Mato Grosso.
Deixar de votar também é
uma forma de protesto. Para o cargo de senador a abstenção, somada aos votos brancos
e nulos chegou a 46%, o que gera um déficit de representação a rondar os
eleitos.
Neste cenário podemos
afirmar que o volume de infrações eleitorais foi igual ou superior às eleições
anteriores. Só houve menos flagrantes, ainda que o Pardal estivesse ativo. Na
eleição de 2010 o MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral) preventivamente
entregou um “mapa” da corrupção que ocorreria na cidade de Campo Verde. O
Ministério Público Eleitoral e a Polícia Federal flagraram, investigaram, mas a
Justiça Eleitoral não puniu os crimes. Na eleição anterior (2006) o “mapa da
compra de voto” era de Santo Antonio do Leverger.
Um dado importante. O
candidato eleito não pode ser diplomado se as contas não tiverem sido
apreciadas e aprovadas. Graças a um “acordo de cavalheiros” em 2010 houve
diplomação sem a votação e aprovação das contas. Ali nasceu o chamado “cheque
guarda-chuva” de 1 milhão, 5 milhões de reais. Os emitentes de tais cártulas (para
saques em “dinheiro vivo”) seriam depois, no curso do mandato, “abraçados” pela
Operação Ararath, entre outras.
Isto quer dizer que o
filtro da Justiça Eleitoral falhou em 2010 e isso obrigou a sociedade a
conviver com gestores corruptos, que fizeram dos mandatos a extensão de seus negócios,
impuseram a toda a sociedade as obras milionárias de “mobilidade urbana” cujos prejuízos
serão pagos pelas gerações futuras. Os idealizadores do milionário projeto do
VLT (ao custo de 1,5 bilhão), só para citar um exemplo de política pública absolutamente
equivocada, não seriam eleitos e empossados se a fiscalização da Justiça
Eleitoral fosse efetiva.
Agora em 2014 o cenário
não é muito diferente.
Os abusos de poder
político, o uso da máquina pública, a contratação irregular de cabos
eleitorais, compra de votos, corrupção de lideranças, utilização de “caixa
dois”, foram práticas comuns e usadas sem cerimônia por diversos candidatos,
eleitos e não eleitos.
O MCCE apresentou ao
Ministério Público Eleitoral alguns contratos assinados por candidatos evidenciando
despesas “por fora” e inclusive listagem com “lideranças” cooptadas, neologismo
para a captação ilícita de sufrágio (compra de voto). Cópias de cheques, indicação de fontes ilícitas de recursos
financeiros, benefícios recebidos de fontes vedadas etc. Tudo isso ocorreu
nessas eleições.
Resta saber agora se a
Justiça Eleitoral vai agir. Há um candidato cuja lista de apontamentos de
irregularidades chega a 40 páginas, e ficamos aqui curiosos em saber se o mesmo
terá o “benefício” de aprovação das contas de sua campanha. Se passar por este
filtro da “Justiça” logo, logo será alcançado pelos noticiários policiais, será
mais um “metendo a mão” em recursos públicos. E utilizando o foro privilegiado
para não ser preso.
O “passer domesticus”
(Pardal) da Justiça Eleitoral vai cair no descrédito?
A sociedade não merece
isso.
Antonio Cavalcante e Vilson Nery são ativistas do MCCE (Movimento
de Combate à Corrupção Eleitoral) em Cuiabá/MT.
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