segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Nós somos os 99%!


«E eu pergunto aos economistas, políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar à miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infâmia, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico?» Almeida Garrett, “Viagens na minha terra”






O último relatório da OXFAM em que se revela que, já no próximo ano, 1 por cento da população mundial terá mais riqueza do que os restantes 99 por cento vem dar especial significado à expressão criada por um anarquista (David Graeber) e popularizada pelo movimento Occupy nos Estados Unidos: we are the 99%.

O relatório refere que este fosso entre os mais ricos e os mais pobres não pára de crescer (em 2006 a relação era de 2% para 98%, aqui). Segundo a OXFAM, as 80 pessoas mais ricas do mundo detêm tanta riqueza como os 3.500 milhões (três mil e quinhentos milhões) das mais pobres.

Quando se trata de sacrifícios é comum ouvirmos que a crise obriga a que todos tenhamos que nos sujeitar a cortes nos salários, aumento da jornada de trabalho, impostos a dobrar, desemprego e tudo o mais. Todos não: há sempre um grupo todo-poderoso que ganha com as crises e que a austeridade nunca afecta, mas, antes pelo contrário, continua a acumular (e cada vez mais) lucros fantásticos.

Se da riqueza que produzimos uma parte importante vai sempre para o bolso dos patrões (através das mais valias) ou para o Estado (através dos impostos) a acumulação crescente de riqueza por parte de um número tão pequeno de grandes capitalistas significa que a exploração que sentimos na pele é também crescente e que cada vez afecta mais trabalhadores e mais pessoas a nível mundial, colocando a muitos em patamares de fome, má nutrição, miséria absoluta.

Cada vez tem mais actualidade a velha pergunta formulada por Almeida Garrett: “quantos pobres são necessários para produzir um rico?”. E a resposta é evidente: para haver um rico é necessário que existam cada vez mais pobres. Indicam-no os estudos, mas indica-o também a nossa percepção, a percepção de quem percorre as ruas dos nossos bairros, das nossas cidades e dos nossos países e vê por todo o lado miséria e exclusão por entre pequenos oásis de luxo e riqueza, geralmente fortemente protegidos. Muita miséria e muita exclusão lado a lado com a riqueza por todos produzida, mas de que um pequeno punhado se apropriou e apropria diariamente. Claro, enquanto os de baixo, os explorados e espoliados de todo o mundo consentirmos. E não será já tempo de acabarmos com este fosso e fazermos com que a riqueza seja distribuída de forma mais igualitária entre todos?
 
Arregacemos, então, as mangas…

David Santos (por email)





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