Em relatório anual, grupo de estudos da Sciences Po levanta dúvidas se Temer chegará até o fim de 2018 e afirma que país está atolado. "Já em uma crise econômica e política, mergulha agora em uma crise de regime."
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DW Made For Minds
O Observatório Político da América Latina e do Caribe (OPALC), ligado
ao renomado Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences Po), fez
um balanço sombrio sobre a crise brasileira em seu novo relatório anual
sobre a região. Segundo o texto, "a alternância não eleitoral de 2016 desafia um quarto de século de consolidação democrática".
"Como na maioria dos períodos de crise que o Brasil conheceu em sua
história, a solução de conflitos políticos acontece fora da arena
eleitoral, em um círculo fechado das elites. Mas, desta vez, a solução
não foi negociada. Ela foi imposta pelo desvio de um instrumento da democracia [o impeachment]. Agindo assim,
os representantes corromperam a democracia brasileira", aponta o
relatório. "Essa corrupção moral do regime constitucional foi somada a
uma corrupção moral e financeira do sistema político, reforçando o
descrédito da democracia."
O documento também afirma que o procedimento foi realizado de
"maneira brutal, abusiva e indecente" e "teve o efeito de reforçar a
polarização política e fragilizar as instituições democráticas".
O OPALC aponta que "as revelações que se sucedem no contexto da Lava Jato
[...] alimentam o descrédito da classe política e fazem tremer o
sistema político em seu todo". E que "ao fim de 2016, a democracia
brasileira parece esfarrapada, corroída pelos excessos de seus
representantes."
O documento também apontou um caráter ilegítimo na ascensão do presidente Michel Temer e
de um novo projeto de reformas. "Apesar de o procedimento
de destituição (impeachment) ter como objetivo punir as ações pessoais
de um indivíduo, a queda de Dilma provocou um expurgo governamental e a
ascensão de um projeto político que havia sido minoritário nas eleições
de 2014. Nesse sentido, a alternância política que resultou da
destituição pode ser qualificada como ilegítima."
De guerra fria a união sagrada
O relatório também levanta dúvidas sobre a capacidade do governo
Temer. "O ano de 2016 foi concluído em um clima de profunda incerteza. A
democracia brasileira está literalmente atolada. Já em uma crise
econômica e política, o Brasil mergulha em uma crise de regime."
"Apresentada como uma solução para melhorar a governabilidade do
País, o impeachment de Dilma acabou abrindo um período de instabilidade
(...). A sociedade brasileira está mais dividida do que nunca, e a
sequência do impeachment desempenhou um papel importante no reforço
dessa polarização. Os antipetistas e os pró-petistas, no entanto,
compartilham uma rejeição comum às suas elites políticas", diz o texto.
"Ilegítimo e impopular, o governo Temer
encarna uma geração política que já chega acossada por ter usado o
poder em excesso e abusado dele. Só falta um gatilho para que a 'guerra
fria' se transforme em uma 'união sagrada' [referência à trégua e à
aliança entre a direita e a esquerda francesas durante a Primeira
Guerra] contra Temer, às custas do regime democrático".
Por fim, o relatório aponta a crise de apoio à democracia no Brasil.
"O apoio à democracia passou de 54% a 32% entre 2015 e 2016. Nenhum
outro país da América Latina experimentou um recuo parecido."
O capítulo brasileiro no relatório foi elaborado por Frédéric
Louault, vice-presidente do OPALC e professor da Universidade Livre de
Bruxelas, na Bélgica.
Em entrevista à DW, Louault afirma que 2017 deve ser mais um ano imprevisível na política brasileira. Ele diz que a morte do ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, pode desacelerar a Lava Jato, mas não vai ser suficiente para parar a operação.
"Ainda vamos continuar vendo essa dinâmica de tensão entre o
Judiciário e o mundo político. A operação pode perder velocidade, mas a
máquina vai continuar em andamento mesmo que Temer coloque uma figura
amigável no STF. Há muitos juízes e investigadores que vão continuar a
trabalhar. É provável que em marco apareçam novos elementos que venham a
criar dificuldades para Temer", opina.
Louault também afirma que, sem apoio popular e legitimidade, o
governo Temer só pode esperar aguentar até 2018 se a economia melhorar.
"Se ela não se mexer, essa frágil estabilidade do seu governo vai
enfrentar ainda mais dificuldades".
No ano passado, em seu relatório sobre 2015, o OPALC já havia
previsto um período difícil em 2016 por causa dos efeitos colaterais do
modelo de presidencialismo de coalizão, apontando que a democracia
brasileira precisava de "reformas políticas profundas para se
consolidar".
Fonte DW Made For Minds
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