O PSDB, aliás, agrega à sua “nova” condição de star da corrupção o
fato de que é também responsável pela implosão do Brasil promovida por
Michel Temer pois é o seu maior sócio, o que cedo ou tarde também
cobrará seu preço político.
A desagregação do golpismo e a Frente Antagônica
Por Ion de Andrade
A luta contra a ditadura exigiu mais de vinte anos para a formação de
uma força social capaz impor-se a ela. A Frente Democrática apontou
para a Constituinte como forma de implantar em definitivo a democracia
no Brasil.
Mais de meio século depois, cá estamos nós praticamente devolvidos ao
ponto de partida, porém, diferentemente do que ocorreu em 64, a
velocidade com que o atual governo de exceção se desagrega é
extraordinária.
Isto sugere hegemonia mais curta do que os mais de vinte anos que
durou a ditadura militar. Apressar o fim desse regime nefasto ao Brasil e
aos brasileiros é a mais importante tarefa do momento e a ela nenhuma
outra se sobrepõe.
No presente, a maior dificuldade é a de conseguir, no mais curto
espaço de tempo possível, aquilo que as lutas contra a ditadura levaram
20 anos para maturar: abrigar debaixo do mesmo guarda-chuvas político
setores antagônicos. Não sejamos ingênuos. Não há “programa comum de
governo” capaz de unir protagonistas prejudicados pelo arbítrio, como
seriam hoje a indústria da carne e o MST, ou como a Abimaq e a CUT.
Apesar disto, há um pacto possível que só será programático no que terá
de garantidor do único ambiente político e histórico capaz de sustentar
essa diversidade antagônica, o ecossistema “saudável” capaz de abrigar
presas e predadores: o Estado (nacional e social) organizado sob a forma
de um Estado de direito minimamente democrático e garantista.
Essa base de sustentação do golpe, à qual não deveríamos ter acesso
em condições normais, está sendo leiloada a preço de banana pela ação
lesa pátria do governo. A sua desagregação e desidentificação é rápida e
os seus prejuízos materiais não são passageiros, mas compõem a natureza
mesmo da economia de colônia a que estamos novamente submetidos.
Prova disto, diversos setores que emprestaram o seu apoio ao golpe
figuram como grandes perdedores: a engenharia pesada nacional, o
agronegócio, a indústria bélica e os seus projetos de defesa, a
indústria brasileira de máquinas, em breve a indústria farmacêutica,
(quando as aposentadorias forem para o ralo) além de médicos, militares,
alguns cientistas e da classe média. Todos ameaçados pelo arroxo, pela
desnacionalização e por mudanças na previdência social que teriam
provocado verdadeira panelo-convulsão fosse a presidenta Dilma a
propositora.
De resto, e está retratado na popularidade de 5% de Michel Temer, os
setores populares, até pouco tempo atrás desinteressados dessa, aos seus
olhos, “briga de brancos” estão se levantando, assim como os bispos
católicos, aliás com unanimidade e veemência de rara magnitude.
A lista de Facchin
Esse é o contexto no qual explode a lista Facchin/Odebrecht que pela
primeira vez, desde o início da Lava-Jato, inclui o PSDB paulista e
mineiro como protagonista maior dos malfeitos, até aqui atribuídos
apenas ao PMDB, PP e PT. Essa lista, que (irresponsavelmente) misturou
corrupção da mais deslavada com caixa 2, teve o mérito de demonstrar o
quão parcial vinha sendo a versão curitibana da operação. Eclético,
Facchin demoliu a política.
O PSDB, aliás, agrega à sua “nova” condição de star da corrupção o
fato de que é também responsável pela implosão do Brasil promovida por
Michel Temer pois é o seu maior sócio, o que cedo ou tarde também
cobrará seu preço político.
Mas, a pressa com que vêm sendo entregues as nossas riquezas e
perpetradas as crueldades com o nosso povo, demonstra, de fato, o pavor
de que tudo isso possa vir a ser transitório. Deseja-se dar-se por
consumado algo que a nação discorda hoje e que será inevitavelmente
objeto de anulações futuras.
De fato, duas coisas ameaçam a longevidade das propostas:
- A primeira é a perda total da legitimidade do golpe, reduzido a ato de vingança política de um Eduardo Cunha, cujo curriculum fala por si mesmo, e
- A segunda é o verdadeiro exército de parlamentares corruptos presentes nas listas Facchin/Odebrecht como tomadores de decisões da ida da nação aos infernos.
Essas duas singelas singularidades selarão o destino das decisões
tomadas nesses dias de sombra, o que ocorrerá assim que as dores
começarem a ser sentidas pelas vítimas.
A pergunta que deverá ser respondida a seu tempo é: Por que deveria a nação sacrificar-se por decisões tomadas por bandidos?
“Investidores” e políticos deveriam cuidar-se melhor, uns porque
podem perder bilhões e outros porque a nação poderia querer julgá-los
por traição. Constato que as crueldades aprovadas umas atrás das outras
são de natureza a acumular um ódio difícil de ser dimensionado, mas o
mais provável é que venha a verter em proporções diluvianas quando o
sofrimento de milhões começar a ser cobrado.
Porém, para além das hipóteses, o mais importante agora é a
viabilização da aglutinação dos antagônicos em torno de um projeto
comum de ecossistema.
O Estado de direito, nacional, social e democrático como projeto aglutinador da Frente Antagônica
Em primeiro lugar, personagens como Ciro Gomes, Kátia Abreu, Roberto
Requião, Armando Monteiro, Leonardo Boff, Bresser Pereira, Cláudio
Lembo, Eduardo Suplicy, Aldo Rebelo e evidentemente Lula, dentre outros
raros, cuja trajetória, temperamento, valores ou o que for lhes auferiu
representatividade e credibilidade justamente entre forças antagonistas,
têm a tarefa inadiável de construir o veículo que vai nos levar do
naufrágio.
Tal nau flutua sobre os princípios que materializam o projeto
aglutinador: (a) Prosperidade fundamentada numa política de melhoria da
renda da população, entendida como sustentadora do mercado interno e do
crescimento econômico, (b) Inclusão à contemporaneidade dos milhões de
deserdados do Brasil que vivem nas periferias e zonas rurais, (c)
Garantia universal aos direitos sociais, à educação e à saúde, (d)
Prioridade estratégica à ciência e à tecnologia nacionais, (e)
Compromisso do Estado com indústria estratégica e com a segurança
alimentar, (f) Política externa soberana, além de outras obviedades. Não
se trata, portanto de um projeto identitário da esquerda, mas de um
projeto de país: o Teatro de Operações onde a vida da nação possa ser
dignamente encenada em substituição do picadeiro do Mishell.
Compõe, naturalmente a viabilidade dessa plataforma a escolha de um
nome para disputar as eleições de 2018 e não há dúvidas de que o
primeiro nome é o de Lula. Dito isto, devemos compreender que no
contexto atual, apesar da importância estratégica da candidatura Lula e
da sua sobrevivência política, que espelha uma impressionante
resiliência política do nosso povo, a construção da Frente é que é a
prioridade transcendental. Lula deve aspirar à condição de aglutinador
dessa diversidade antagônica.
Historicamente, a tarefa de erguer essa frente ultrapassa até mesmo
as eleições de 2018, pois aspira, não a uma vitória eleitoral, mas uma
hegemonia estável e durável capaz de garantir o Estado de direito
nacional e democrático em meio às lutas e antagonismos que a compõem.
Esse pacto pelo Brasil exige “apenas” que as forças que venham a
subscrevê-lo reconheçam nos diversos antagônicos (não sem as devidas
alergias recíprocas e repulsas figadais) a pertinência àquilo que os
franceses, de há muito, denominam de Comunidade Nacional.
Não há tempo a perder.
Fonte GGN
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