É evidente que foi o ódio da “elite” contra os despossuídos, que no século XXI começou a entrar no mercado formal de trabalho, comprar casa própria e carro financiado, que passou a frequentar shopping center, matricular filhos na faculdade e transitar por aeroportos, que fez aumentar mais ainda a ira da “Casa Grande”, que, histérica, batendo panelas do alto dos seus luxuosos edifícios gritava: “quero o meu país de volta!”. Daí, para a deflagração do golpe de 2016, foi apenas um passo.
Vejo a crise ardente do Pedro Taques em Mato Grosso e me assombra a
capacidade que este político tem de ignorar os compromissos feitos com a
cidadania e a ética, de criar problemas onde não existem (antes dele
chegar!!) e de se beneficiar eleitoralmente do clima de medo e
insegurança que espraiam sobre as pessoas. Lembro-me que o grande
triunfo eleitoral que levou como troféu no ingresso à arena política foi
a prisão do comendador Arcanjo, o bicheiro que tocava terror em Mato
Grosso.
Mas ignorou os nomes dos 20 promotores de Justiça do MPE que atuaram
no caso, dos mais de 100 policiais, vários deles integrantes da Polícia
Militar e da Polícia Civil estadual, agentes que executaram as ordens de
busca e apreensão e as diligências para instruir os inquéritos. É bom
lembrar também que a primeira condenação de Arcanjo foi do ex-juiz
federal Julier, as demais sentenças são oriundas da justiça estadual,
inclusive pelas acusações de homicídio.
Então, a operação que desmontou a organização criminosa do
“comendador” não foi de um homem só! Este só levou os louros da glória
midiática para se projetar na carreira política.
Só que o clima de medo e insegurança, mesmo que seja artificial, é
uma boa tática eleitoral, rende votos, ainda que seja baseada em
mentiras e nada acresça à melhoria dos seres humanos. Recordo ainda que,
uma das grandes mentiras recentes, que foi a criação do tal “kit gay”,
uma armação de políticos conservadores, que ganhou ares de verdade, e
que abortou uma série de medidas contra o ódio e discriminação que eram
preparados pelo governo Dilma.
A iniciativa de um programa contra a discriminação e homofobia viera
do Ministério Público e do Legislativo. O ministro de Educação na época,
Fernando Haddad, buscou explicar à imprensa e às bancadas evangélica e
católica do Congresso sobre o que se pretendia. Ocorre que, no mesmo
período, começou a circular um material preparado pelo Ministério da
Saúde e que se destinava à prevenção de DST/Aids. Tinha como
público-alvo caminhoneiros e profissionais do sexo nas estradas de
rodagem e, portanto, a linguagem era bem direta e escancarada.
Porém, o então deputado federal Anthony Garotinho, que seria preso
alguns anos depois, pegou esse material de propaganda e disse que era o
tal “kit gay” do MEC para as escolas brasileiras. Essa mentira foi o
suficiente para que uma onda de ódio e discriminação se espalhasse pelo
país sem que nada de real tivesse acontecido. Foi o poder da boataria se
beneficiando do ódio latente contra as minorias, contra o “diferente”.
Nos Estados Unidos a Guerra ao terror é outro (mau) exemplo. O então
presidente George Bush garantiu que Sadam Hussein possuiria armas de
destruição em massa, o que semeou ódio anti-islâmico e permitiu a
destruição do Iraque. As armas nunca foram encontradas porque
simplesmente não existiam, mas um país inteiro foi destruído, mulheres e
crianças sacrificadas. Os bombardeios não respeitaram escolas,
hospitais e creches. Tudo foi destruído, e o motor da guerra eram o ódio
e medo injustificados.
O atual mandante ianque, Donald Trump, se elegeu porque havia
campanhas de mentira nas redes sociais existentes na internet, e ainda
porque a candidata adversária, Hillary Clinton, era uma péssima opção
eleitoral. Era despreparada como uma Marta Suplicy votando os projetos
destrutivos do Michel Temer e do PSDB.
Temo pelo futuro do Brasil.
Nossa classe dominante é profundamente conservadora e egoísta. Há
muita gente por aqui, com vontade de lamber botas de um ditador militar.
Então, devemos gritar nas ruas e nas entidades sobre as pessoas mortas e
torturadas da ditadura militar, dos retrocessos econômicos, inclusive
lembrar que foi gestada pelos militares a impagável dívida externa,
criada a partir de desgovernos que não foram votados pelo povo. O país
era chefiado por pessoas da estirpe de Castello Branco, Costa e Silva,
Médice (o mais sanguinário dos ditadores), Ernesto Geisel e Figueiredo,
que odiava cheiro de suor do trabalhador e preferia o odor dos cavalos.
Os fascistas liderados pela mídia golpista, Fiesp, MBL e partidos
políticos como PSDB, DEM, PMDB e PPS, que batiam panelas contra Dilma,
não queriam combater a corrupção, o que os movia era o ódio de classe.
Lembremos que os grandes esquemas de corrupção, ora descobertos,
nasceram nos governos de José Sarney (que herdou contratos da Odebrecht
assinado com os generais), se alastrou com Fernando Henrique Cardoso e
chegou a era Lula/Dilma.
A sociedade brasileira é profundamente desigual, a concentração de
renda é absurda, e a origem desse problema vem de várias fontes, gerando
danos irreparáveis à sociedade, e isso vem se repetindo a mais de 500
anos. Nossa riqueza natural foi levada pelos colonizadores europeus, e
aí eu menciono a madeira (Pau Brasil), o ouro e as pedras preciosas. E o
que dizer da monstruosa ignomínia de trazerem seres humanos
escravizados a partir da África, e estes, serem aqui tratados como
“coisa”, sendo obrigados a trabalhar de sol a sol, levando chicotadas
quando o “amo” assim desejasse? O escritor Gilberto Freyre mostra no
livro “Casa Grande e Senzala” como a classe dominante se beneficiou da
mão de obra escrava e nutre preconceito contra os empobrecidos.
Em outra obra igual, o escritor registra que as propagandas dos
jornais da época mostravam seres humanos à venda, e o tratamento
dispensado era o mesmo que se dedicava aos cavalos. Atributos como
dentes perfeitos, fala mansa e falta de orelhas eram comuns nos anúncios
de compra e venda de escravos e comunicados de fuga. “Vende-se uma
preta muito moça, com cria”, dizia um. “Vende-se uma negra de 38 anos
com um filho de 3 anos de cor clara, e compra-se uma negrinha de 10, 12
anos” era o texto de outro anúncio.
O fato é que a pressão capitalista europeia ajudou na libertação
legal dos escravizados no Brasil, mas a lei apenas os jogou na rua, sem
casa, sem terra para plantar e sem comida. Mulheres, crianças e idosos
se aboletaram nas matas, criando os espaços de resistência que se chamam
Quilombos.
Ainda outro dia, o deputado Nilson Leitão (PSDB/MT) apresentou uma
proposta de lei na Câmara dos Deputados que praticamente ressuscitava o
período escravagista, em que os trabalhadores eram tratados como coisa e
trabalhavam em troca de casa e comida. Parece que só o Blairo Maggi
apoiou o tal projeto.
É evidente que foi o ódio da “elite” contra os despossuídos, que no
século XXI começou a entrar no mercado formal de trabalho, comprar casa
própria e carro financiado, que passou a frequentar shopping center,
matricular filhos na faculdade e transitar por aeroportos, que fez
aumentar mais ainda a ira da “Casa Grande”, que, histérica, batendo
panelas do alto dos seus luxuosos edifícios gritava: “quero o meu país
de volta!”. Daí, para a deflagração do golpe de 2016, foi apenas um
passo.
O brasileiro médio é profundamente mal informado (graças à Rede Globo
e suas congêneres televisivas, radiofônicas e impressas) e analfabeto
político. Uma pesquisa recente mostra que o eleitor mais conservador, e
com tendência fascista, se identifica em todas as classes, inclusive
entre os letrados de ensino superior, possuindo capacidade intelectual.
Desses, 100% são movidos pelo medo e pelo ódio. São boçais que acreditam
no “perigo comunista”.
Só para fechar o tormentoso raciocínio e dizer da tendência de termos
a estruturação do ensino militar e educação para o trabalho em nossas
escolas, (parece ser esse o desejo de Pedro Taques em Mato Grosso), é
criar alunos submissos e obedientes, que se submeteriam às ordens de um
“chefe”, e quem sabe, se prontifiquem até mesmo “grampear” adversários
políticos. Eu já falei isso antes e recebi, algumas críticas e rasgados
elogios. O segundo veio como fundamento e os primeiros como impropérios
verbalizados por coxinhas, que repercutem o que diz o jornalismo de
esgoto, que, além de escravagista, é antinacionalista, antirrepublicano e
elitista.
As empresas brasileiras gastam com treinamentos de empregados a média
de R$ 518 por funcionário, e os donos de grandes empresas querem
economizar esse dinheiro, que pode chegar a R$ 1,38 milhão anuais por
empresa com mais de 500 funcionários. Com isso em mente, os donos de
bancos e executivos de grandes empresas estão convencendo o governo
golpista a implantar o ensino para o trabalho e as escolas em tempo
integral.
Nada de ensinar esporte, música, teatro, filosofia e história para
nossas criancinhas. Nossos alunos receberão educação para o trabalho,
serão preparados para a subserviência, para o capitalismo, serão os
escravos modernos, sem licença para pensar.
Será que a Senzala vai aceitar pacificamente o que nos impõe a Casa
Grande, ou teremos uma guerra civil em um futuro bem próximo? Parece ser
isso o que nos reserva essa “política das elites” que alimenta o ódio
de cada dia.
Antonio Cavalcante Filho é sindicalista e escreve neste espaço às sextas-feiras - E-mail: antoniocavalcantefilho@outlook.com
Fonte RD News
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