segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

O CALVÁRIO DO ELEITOR


Aí eu pergunto: por que fazer o povo sofrer tanto assim? Já não é demais vergonhoso viver numa “República” não republicana, participarmos de uma democracia que não é a nossa, mas sim, daqueles que nos exploram? Já não basta a humilhação de fingirmos que somos cidadãos, quando na realidade somos meros escravos assalariados? Para as castas privatistas, não é suficientemente regozijante a ignomínia da cruz de tantas injustiças sociais que, há séculos, carregamos calvário acima na esperança da emancipação humana, sempre prometida, sempre adiada e nunca alcançada.




Por Antonio Cavalcante Filho 


O mais interessante para se viver numa democracia (ainda que seja apenas a formal, como tínhamos antes de 2016), é a possibilidade de, mesmo enfrentando as forças do poder econômico, escolhermos periodicamente aqueles que irão nos representar nos poderes Legislativos e Executivos, para bem governar o país, representando-o com dignidade diante do mundo (algo que nunca teremos com o ilegítimo Michel Temer).

Viver numa democracia, ainda que seja a democracia burguesa (pois a democracia real, a popular, a do povo nunca tivemos), é também a possibilidade, mesmo vivendo num estado de gritante desequilíbrio social, haver uma convivência (ainda que conflituosa), certa “tolerância” (por mínima que seja), independentemente das raças, das classes, das nossas crenças políticas ou religiosas, das nossas opiniões, podendo inclusive, todos expressá-las livremente, para, a partir daí, podermos avançar rumo a uma sociedade mais justa, menos desigual.

Sem isso, para nós, trabalhadores, a democracia dos ricos, não faz nenhum sentido. Podemos até descartá-la a qualquer momento, o que nos faria muito bem.

Mesmo em um arremedo de democracia, como a do Brasil, antes de 2016, ainda era possível viver e ser governado, mais ou menos, segundo as regras estabelecidas na Constituição. Mas, está claro que, por meio de um consórcio de bandidos extremamente organizados, parte substancial disso nos foi roubado.

Deste momento em diante, todas as parafernálias institucionais do estado burguês, (incluindo o STF, o “guardião da Constituição”), que antes já eram “apequenados”, se apequenaram muito mais ainda.

Aliás, o impitimismo golpista, do Aécio/Cunha/Temer e Cia, “atualizou a definição” de crime organizado, de formação de quadrilha, desde quando, em 2014, o candidato da elite semifeudal, logo após perder a eleição presidencial, prometeu que não deixaria Dilma governar em paz.

Apoiado por uma rede de televisão, numa espécie de ação entre amigos da mídia (orquestrada por jornalões, TVs, rádios, portais de notícias e revistas semanais), deu desmedida importância a tal “pedalada fiscal”, inserindo no imaginário popular que aquela conduta era crime hediondo.

Graças a um parecer do TCU, um cabide de emprego de marajás, super assalariados e vitalícios, sobre um mero ato de gestão (que Temer faz, Taques faz, Alckmin faz, Doria faz, Emanuel Pinheiro faz e todos sempre fizeram, e que nunca foram punidos) é que tudo começou.

É claro que, desde o golpe, o eleitor não tem mais a certeza (garantia jurídica) de que o candidato a quem ele confiar o voto poderá assumir, e se assumir, possa concluir o mandato, mesmo sendo o escolhido pela maioria da população. E isso é uma dúvida cruel que nos remete a “célebre” frase do golpista Carlos Lacerda contra Getúlio Vargas nas eleições de 1950: "não pode ser candidato. Se for, não pode ser eleito. Se eleito, não pode tomar posse. Se tomar posse, não pode governar".

Exatamente isso foi o que fizeram com a presidenta Dilma Roussef. E dane-se o povo, que roubem seus direitos trabalhistas, que surrupiem suas aposentadorias, que aumentem o desemprego, dê-lhes gasolina a cinco reais o litro, gás de cozinha a “cem contos”, arranquem-lhes seus rins nas contas de energia elétrica, que voltem a morar nas favelas sem água, sem luz, sem esgoto.

Que fiquem sem saúde e educação, que triplique a população de pobres e miseráveis, e que joguem todos eles no submundo da criminalidade e da prostituição. E, não somente o petróleo, as riquezas minerais, o Aquífero Guarani, o território da Amazônia, mas sim, que entreguem todo o Brasil aos abutres internacionais a preço de pastel (quando o pastel ainda era barato).

Todo este entreguismo lesa-pátria e é antipovo, colocando em risco o futuro e a soberania da nação, ocorrem com a conivência de escribas mercenários que vendem à caneta para a mídia corporativista burguesa, com o apoio, mesmo que inconsciente, de uma parcela de midiotas e de analfabetos políticos, e o que é pior, com o olhar complacente de importantes setores do Judiciário.

Quanto ao “O Calvário do Eleitor”, título deste texto, me intrigou uma visita que fiz ao portal da Justiça Eleitoral em Mato Grosso há cerca de uns seis meses, onde vi uma fotografia da presidente Maria Helena Póvoas com o juiz Sergio Moro, aquele mesmo que viaja seguidamente aos Estados Unidos, recebe prêmios do Tio Sam com bastante frequência, e suas decisões resultam em milhões em lucro para as empresas ianques.

Lembremos que todo o dinheiro “recuperado” pela tal operação Lava Jato é uma ninharia, se comparado aos prejuízos que Moro, Dalagnol e Cia deram ao Brasil. Em apenas em um dos acordos feitos em processos num tribunal dos EUA, contra a Petrobrás, provocou um dano ao Brasil de cerca de R$ 10 bilhões neste mês de janeiro de 2018.

Rodrigo Janot, em seus melhores dias, garganteou que a Lava Jato havia recuperado R$ 4 bilhões, o que não é verdade. O montante real do dinheiro devolvido não chega nem a metade disso e, portanto, somente neste acordo judicial, publicado em janeiro, o prejuízo foi dez vezes maior que o lucro.

Ô vitória de Pirro!

Que juiz é esse Moro que permite que isso aconteça? A quem realmente ele serve, ao Brasil ou ao “Tio Sam”? Mas, no portal do TRE/MT, está lá a foto dele com a presidente do tribunal. Não havia nenhum contexto, nenhuma notícia, nenhuma importância daquilo para a Justiça Eleitoral, e isso me deixa desacreditado ainda mais no sistema. Parte do Judiciário se contamina pelos preconceitos de classe, paixões políticas altamente ideológicas; com exceções, mas é!

Afinal, o que se espera dos dirigentes de órgãos públicos é que gaste seu tempo com os trabalhos de gestão e planejamento de suas atividades. Tietagem e homenagens vazias não fazem parte do que esperamos deles.

Neste sentido, vejo que o Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso está em franco débito com a sociedade mato-grossense. Cadê o julgamento da ação de Impugnação de Mandato Eletivo (caso de fraude na ata de registro de candidatura ao Senado) contra Pedro Taques, que se arrasta neste tribunal desde 2010?

Dia desses, passando em frente da tal “Casa da Democracia”, em Cuiabá, entristeceu-me a visão. Ali, bem antes dos primeiros raios da manhã, centenas de pessoas já se acotovelavam para obter uma senha para fazer a tal biometria. Aí eu pergunto: por que fazer o povo sofrer tanto assim?

Já não basta ao eleitor o sacrifício de enfrentar filas absurdas, com sol ou com chuva, para votar em alguém na incerteza de que naquele que ele votou irá atender às suas expectativas, ou se atender, irão permitir que ele cumpra o seu mandato?

Já não é demais vergonhoso viver numa “República” não republicana, participarmos de uma democracia que não é a nossa, mas sim, daqueles que nos exploram? Já não basta a humilhação de fingirmos que somos cidadãos, quando na realidade somos meros escravos assalariados?

Para as castas privatistas, não é suficientemente regozijante a ignomínia da cruz de tantas injustiças sociais que, há séculos, carregamos calvário acima na esperança da emancipação humana, sempre prometida, sempre adiada e nunca alcançada.

Agora, elas querem muito mais! Como diria Bertolt Brecht, “Privatizaram sua vida, seu trabalho, sua hora de amar e seu direito de pensar”. E como previsse o Brasil pós golpe, continua ele: “É da empresa privada o seu passo em frente, seu pão e seu salário. E agora, não contente, querem privatizar o conhecimento, a sabedoria, o pensamento, que à humanidade pertence.

Antonio Cavalcante Filho, o Ceará, é sindicalista e escreve neste espaço às sextas-feiras - E-mail: antoniocavalcantefilho@outlook.com

Fonte RD News