Entender a política não é apenas um direito, e, sim, um dever de todos trabalhadores que preservam a esperança de que ainda é possível, pelas vias institucionais que o sistema permite, reverter esta onda de retrocessos avassaladora que vem sendo esparramada diariamente pelos golpistas que assaltaram o poder.
Por Antonio Cavalcante Filho
Nesse início de século, vivemos em nosso país um dos momentos mais tenebrosos dos últimos 100 anos. Com tamanha decadência de valores humanísticos, de justiça social e ético, nunca ficou tão explícita a farsa da democracia burguesa, que muitos sociólogos e historiadores sérios já vinham denunciando há décadas.
Nesse início de século, vivemos em nosso país um dos momentos mais tenebrosos dos últimos 100 anos. Com tamanha decadência de valores humanísticos, de justiça social e ético, nunca ficou tão explícita a farsa da democracia burguesa, que muitos sociólogos e historiadores sérios já vinham denunciando há décadas.
O historiador Sergio Buarque de Holanda, lá pelos idos de 1930, dizia
que, “a democracia foi sempre, no Brasil, um lamentável mal-entendido.
Uma aristocracia rural e semifeudal importou-a e tratou de acomodá-la
aos seus direitos e privilégios”.
Hoje, enquanto a grande maioria dos países busca a sua soberania com
independência política e econômica, nessa pseuda-república, uma classe
escravagista-cleptocratica, após assaltar o poder através de um golpe
parlamentar-judiciário-midiático-empresarial-elitista, em pleno século
XXI, submete novamente o nosso país aos interesses
rentista-imperialista-colonialistas.
O Brasil é o nono país mais desigual do mundo. Aqui, os 5% mais ricos
detêm a mesma fatia de renda que os demais 95% da população. Isto faz
com que os seis brasileiros mais ricos concentrem a mesma riqueza que os
100 milhões de brasileiros mais pobres.
Democracia não é tão somente “igualdade perante a lei”, é muito mais,
é geração de emprego, distribuição de renda, oportunidade de educação e
saúde pública de qualidade para todos. Democracia é o direito à
moradia, ao lazer, à cultura e igualdade de bens materiais a todos os
cidadãos. Estas conquistas jamais alcançaremos, enquanto as mesmas
elites opulentas, antissociais e conservadoras, que sempre mandaram no
Brasil, perpetuarem-se no poder.
Se a nossa renda média é de apenas R$ 1.268,00 mensais, se mais de
100 milhões de trabalhadores ganham até um salário mínimo e, entre
esses, mais de 50 milhões vivem na linha da pobreza, e cerca de 16
milhões vegetam na penúria, como podemos afirmar ainda que somos uma
nação democrática?
Democracia não é também apenas o “direito de votar”. Tanto é que, a
representação política no Brasil não reflete em nada a realidade da
maioria do povo brasileiro. Aqui, 51,48% da população é mulher, no
entanto, apesar da grande maioria delas serem eleitas com o apoio dos
seus maridos, dos seus pais ou dos seus irmãos, a sua representação é de
apenas 9,9% na Câmara Federal. Já a população negra que atinge o
percentual de 54%, no entanto, ocupa somente um quinto das cadeiras da
Câmara.
E o que é ainda pior, se a bancada empresarial que representa o
interesse dos 5% mais ricos têm 246 parlamentares, enquanto a bancada
sindical que representa o interesse da maioria dos trabalhadores tem
apenas 46 parlamentares, não é uma ilusão acreditar que vivemos numa
democracia?
Lembremos que o judiciário (com letra minúscula mesmo), repetindo o
que já havia feito em 1964, também chancelou o golpe de 2016 com a
“preciosa” ajuda de seus “auxiliares” cristalizados nos promotores e na
polícia (federal), dando grande contribuição para a destruição da
indústria naval, da engenharia nacional, do petróleo, e agora ataca a
indústria da alimentação. Tudo isso contribuiu, de maneira perversa,
para a ampliação do número de pessoas desempregadas ou subempregadas.
Outra face visível do golpe é o registro de 40% de brasileiros
endividados, pagando juros exorbitantes ao sistema financeiro.
Mesmo já tendo uma tradição de golpes, desde a “Proclamação da
República”, o Exército Brasileiro, em 1944, é mandado para a Europa
“lutar contra o fascismo e defender a democracia”, pelo menos era isso o
que a grande maioria das cerca de 25.834 pessoas arregimentadas para
servir à Força Expedicionária Brasileira acreditavam.
No Brasil de 2018, o Exército está nas ruas. Desta vez, ao contrário
de “defender a democracia” ou “lutar contra o fascismo”, sobre o
pretexto de combater a bandidagem nas ruas do Rio de Janeiro, está, na
realidade, defendendo os interesses do usurpador-lesa-pátria, Michel
Temer, e de um conluio de bandidos e fascistas a serviço do golpe, cujo
interesse maior é o de entregar o nosso subsolo, a água e as nossas
empresas rentáveis para os conglomerados financeiros e produtivos
internacionais. Nessa guerra suja, o jogo é bruto, onde vale a mentira, a
traição, o roubo dos direitos dos trabalhadores e tudo mais.
Mas, se nós, os eternos explorados e excluídos, somos 95% da
população, por que permitimos, durante tanto tempo, esta equação
perversa, desumana e injusta, imposta por 5% dos habitantes do andar de
cima contra os interesses da esmagadora maioria do povo brasileiro?
Um dos mais famosos gritos de protesto, e que nos apontam caminhos
que devemos trilhar contra essa situação de incivilidade e maldade
contra a classe trabalhadora, vêm de 1848, feito por Marx e Engels:
"Trabalhadores do mundo, uni-vos, vós não tendes nada a perder a não ser
vossos grilhões"!
Como continuamos alimentando a esperança de que é possível construir a
verdadeira democracia, a democracia do povo, a democracia popular, com
eleições livres, sem a contaminação do poder econômico, sem a
intervenção de uma toga ou de uma baioneta, com a revogação de todos
esses atrasos que nos remetem à Idade Média, impostas por uma elite
predadora, a solução pode vir da organização e luta dos trabalhadores e
trabalhadoras, aos quais eu me dirijo.
Se é verdade que queremos uma representação política, em todos os
níveis e escalões da república, na justa proporção do conjunto de todos
os segmentos sociais, a hora é de buscar a sua entidade sindical, sua
associação representativa e conhecer sobre as candidaturas e as
propostas que estão sendo colocadas nesse pleito de 2018. Se os
explorados se omitem da política, os exploradores agradecem.
E não me venham com a velha cantilena de que sindicatos não podem se
envolver em debates políticos, não podem apoiar candidatos de suas
bases, comprometidos com suas reivindicações de classe, ou que a Lei
9.504/97, no artigo 24, inciso VI, veta a participação dessas entidades
na atividade de campanha eleitoral. Esse discurso é hipócrita, mero
palavreado astucioso para nos iludir, nos enganar e, assim, nos dividir
para mais facilmente nos dominar.
As organizações representativas da “Casa Grande”, como a FIEMT, a
FIESP e tantas outras, fazem isso todos os dias, não apenas para apoiar
os seus candidatos, como também para derrubar, através de golpes, os
eleitos que representam os interesses dos trabalhadores, como fizeram
com João Goulart, em 1964, e Dilma Rousseff, em 2016. Quem financiou os
coxinhas nazi-doidos para irem às ruas contra a democracia e defenderem
intervenção militar não foram eles? Quem financia as campanhas
eleitorais dos representantes da burguesia não são as suas empresas e
suas entidades patronais?
Querer anular a organização sindical, como um espaço legítimo de
lutas dos trabalhadores contra a exploração capitalista, é negar a luta
de classes. Seria como um marxista negar a ideia de mais-valia, como um
cristão não crer na ressurreição, ou um budista negar a reencarnação.
Dizer que a trincheira sindical não pode ser a barricada da
resistência dos trabalhadores contra a opressão da burguesia, é como
dizer aos professores e alunos que a escola não é um espaço de
aprendizado, ou dizer aos religiosos que igreja não é um ambiente de
oração. Seria como o dia negar a luz do sol, ou a noite não se
reconhecer na escuridão.
Se a classe dominante insiste atacar os direitos dos trabalhadores e
trair os interesses nacionais, a hora é de reagirmos. Vamos defender os
nossos direitos e o nosso país, nas ruas, nos bares, nas escolas, nas
igrejas, em nosso ambiente de trabalho e, em qualquer lugar,
principalmente dentro das nossas organizações sindicais, nos clubes de
mães, nos grêmios estudantis, nos movimentos populares, enfim, aonde o
povo estiver!
Quem diz que sindicato não é lugar de debater política partidária e
que lideranças sindicais não devem se candidatar a cargos de vereador,
prefeito, deputado estadual, governador, deputado federal, senador, ou
presidente da república, além de não saber o que se fala, está prestando
um grande serviço às elites mais conservadoras, as mais retrógradas e
corruptas do Brasil, pois é exatamente assim que elas querem que o povo
continue pensando.
Um cidadão consciente não vota em quem atua frontalmente contra os
trabalhadores, em quem renega direitos, quem apoia o golpismo, quem
vende o seu país, quem viola a vida e fragiliza quem já é extremamente
fraco. Este sentimento de solidariedade e compromissos com as causas dos
oprimidos, dos explorados, é dentro do sindicato que devemos
compartilhar, debater e encontrar solução.
Entender a política não é apenas um direito, e, sim, um dever de
todos trabalhadores que preservam a esperança de que ainda é possível,
pelas vias institucionais que o sistema permite, reverter esta onda de
retrocessos avassaladora que vem sendo esparramada diariamente pelos
golpistas que assaltaram o poder.
Para aqueles que ainda resistem em dar ao Golpe o sentido do que ele
realmente é, a academia está provando que, de fato, o povo brasileiro
foi enganado, e estudar o golpe virou disciplina em pelo menos 13
universidades brasileiras, entre elas a UFPR onde o Moro é professor. Só
a ministra Cármem Lucia, alguns atores do sistema de justiça e os
coxinhas midiotizados pela mídia corporativa burguesa insistem em não
querer acreditar no óbvio.
Oxalá que todos os sindicatos pudessem também proporcionar aos seus
filiados este curso que trata do golpe de 2016 e da democracia no
Brasil.
Antonio Cavalcante Filho, o Ceará, é sindicalista e
escreve neste espaço às sextas-feiras - E-mail:
antoniocavalcantefilho@outlook.com
Fonte RD News