Jair Bolsonaro é um ex-capitão do Exército brasileiro, que foi para a reserva precocemente para virar político profissional, inicialmente como vereador e depois como deputado federal, estando atualmente no seu sétimo mandato, e que, juntamente com três de seus filhos (Eduardo/dep. federal, Flávio/dep. estadual e Carlos/vereador), vive exclusivamente da política.
Por Celso Napolitano*
Uma parcela significativa do eleitorado, decepcionado com o volume
crescente de denúncias de corrupção no País, passou a ver na candidatura
do deputado Jair Bolsonaro (PSL-RJ) uma solução, porque seria alguém
com disposição para enfrentar, com firmeza, essa suposta degradação
moral.
Isso é extremamente preocupante, porque essas pessoas podem estar
comprando gato por lebre ao tomar tal decisão sem antes examinar as
causas da sensação de degradação moral e sem refletir sobre o que
representa a candidatura de Bolsonaro.
Um cidadão nunca deve eleger ninguém, muito menos um Presidente da
República, apenas pela retórica de combate à corrupção nem pela postura
de linha dura do candidato. É preciso que o eleitor, além de saber se o
postulante será realmente capaz de resolver os graves problemas do País,
esteja de posse de informações seguras para tomar uma decisão
consciente e que expresse sua real manifestação de vontade.
É preciso, por exemplo, ter clareza de que a corrupção no Brasil
sempre existiu, e num volume que antes não era possível de ser
mensurada, e continuará existindo. Somente nos últimos 20 anos é que a
relação do Estado com a sociedade e com o mercado passou a ser mais
transparente. Resultado, de um lado, de um conjunto de leis que jogou
luzes sobre os agentes públicos e suas relações com o setor privado (lei
de compra de votos, Lei de Acesso à Informação, lei de transparência,
lei de responsabilização da pessoa jurídica, atualização da lei de
lavagem de dinheiro, lei de combate ao crime organizado e da delação
premiada, entre outras), e, de outro, do empoderamento dos órgãos de
fiscalização e controle, que passaram a atuar como instituição de Estado
e não mais de governo, inclusive transferindo a eles prerrogativas que
antes eram exclusivas de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).
É preciso, ainda, ter presente que o Poder Executivo, cujo titular é
o presidente da República, dispõe de muito poder e é o principal
operador dos monopólios do Estado, entre os quais: a) de impor conduta e
punir seu descumprimento – o poder coercitivo; b) de legislar, ou seja,
elaborar leis obrigatórias para todos e para cada um; e c) de tributar,
mediante a cobrança compulsória de taxas, contribuições e impostos de
toda a sociedade.
Não é razoável, portanto, eleger um presidente da República, com os
poderes de Chefe de Governo e Chefe de Estado que tem no Brasil,
pensando apenas no combate à corrupção, que aliás é mais função dos
órgãos de controle – dos Ministério Público, do Tribunal de Contas e do
Poder Judiciário do que do presidente da República.
É preciso analisar vários outros aspectos, principalmente o que
pensa e o que representa o candidato, como empregará os monopólios do
Estado, quais suas propostas e quais as consequências de sua
implementação, qual será sua equipe e o que ela pensa em relação aos
graves problemas do País para tomar uma decisão consciente e
responsável. Senão, o voto vira apenas um instrumento de desopilação, de
protesto, de ressentimento ou até de ódio, que em lugar de resolver vai
criar mais e novos problemas e dificuldades.
Quem é, então, Jair Bolsonaro? Qual é sua visão de mundo? Que
solução apresenta para os principais problemas do País? Quem é e o que
pensa sua equipe econômica? São perguntas que passamos a responder e que
dão pistas sobre um eventual governo Bolsonaro.
Jair Bolsonaro é um ex-capitão do Exército brasileiro, que foi para a
reserva precocemente para virar político profissional, inicialmente
como vereador e depois como deputado federal, estando atualmente no seu
sétimo mandato, e que, juntamente com três de seus filhos (Eduardo/dep.
federal, Flávio/dep. estadual e Carlos/vereador), vive exclusivamente da
política.
O deputado Jair Bolsonaro – defensor da ditadura militar – tem uma
visão de mundo associada ao Estado penal, que advoga a prevalência da
penalização, da disciplina, da repressão e da criminalização da pobreza
sobre as políticas sociais, sobre a tolerância, sobre a paz, sobre a
dignidade da pessoal humana. É defensor do Estado policial em detrimento
do Estado social.
Para ele, antes do Estado provedor; prestador de serviços públicos,
que combata desigualdades regionais e de renda e garanta oportunidades e
acesso a bens e serviços gratuitamente a todos, especialmente aos mais
pobres e necessitados; vem o Estado repressor, voltado para o aumento do
encarceramento e da repressão criminal, para o preconceito e para a
intolerância.
Sabedor de que a sociedade não tolera a violência urbana e rural nem
os pequenos roubos e furtos, utiliza, por exemplo, a retórica de que
“bandido bom é bandido morto” e que eventual invasão de propriedade
privada – independentemente de ela ser improdutiva ou de não cumprir sua
função social – por movimentos como o dos trabalhadores rurais sem
terra ou o dos sem teto deve ser combatida com lança-chamas (labaredas
de fogo), como forma de alimentar seu exército de fundamentalistas.
Sem o menor respeito pela diversidade, diz preferir ter um filho
morto a um filho gay, declarou que uma deputada não merecia ser
estuprada por ser feia, afirmou ter ido a uma comunidade quilombola na
qual só viu obesos que não servem nem para procriação, além de ter
votado a favor do impeachment de uma ex-presidente em homenagem a um
torturador.
Na marcha dos prefeitos de 2018 demonstrou seu total despreparo para
ser Presidente. Indagado sobre sua proposta para o saneamento básico,
respondeu que a solução desse problema passa pelo controle da
natalidade. E perguntado sobre seu modelo de educação, citou como
exemplo um colégio militar em Goiânia.
Não bastasse seu despreparo para governar o Brasil e sua visão
ditatorial, ainda escolheu como coordenador de seu programa de governo o
economista e banqueiro Paulo Guedes, um fundamentalista liberal e
fiscal, que defende o Estado mínimo. “Cabeça de planilha”, o responsável
pelo programa é daqueles neoliberais capazes de considerar a
mortalidade infantil como benéfica ao controle das contas públicas.
O discurso do deputado se vale da ignorância, do ódio e da sede de
vingança das pessoas para apontar culpados e sugerir soluções, numa
narrativa rasa e infantil, mas que denota uma relação de causa e efeito,
como forma de disparar o gatilho mental dos revoltados. A fórmula
consiste sempre em identificar culpados e promover o julgamento moral,
supostamente usando um “problema” e uma “solução”. É o raciocínio
pronto, que atende aos descontentes, sem requerer nenhum esforço
adicional.
Até mesmo sob o prisma da probidade, é questionável a sinceridade do deputado Jair Bolsonaro. Em 19 de janeiro de 2018, a Folha de S. Paulo
publicou extensa matéria, apontando 32 perguntas não respondidas sobre o
patrimônio do deputado e seus familiares, com fortes indícios de
enriquecimento ilícito, como recebimento indevido de auxílio moradia e a
propriedade de imóveis com valor de mais de R$ 16,5 milhões.
O eleitor pode votar em quem quiser, mas seu ato deve expressar sua
real manifestação de vontade, o que pressupõe ter conhecimento sobre o
candidato e o que ele representa. Se tiver essas informações e mesmo
assim resolver votar, não há problema. O sujeito está, conscientemente,
disposto a chancelar na urna seu potencial algoz. Entretanto, votar sem
conhecimento sobre quem é o candidato e o que pensa, pode levar à
frustração e ao desencanto. Não existe ética sem verdade.
*Celso Napolitano é professor da Fundação Getúlio Vargas em São
Paulo (FGV-SP), diretor do Sindicato dos Professores de São Paulo
(Sinpro-SP), presidente da Federação dos Professores do Estado de São
Paulo (Fepesp) e presidente do Departamento Intersindical de Assessoria
Parlamentar (DIAP)
Fonte Congresso em Foco
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