terça-feira, 18 de dezembro de 2018

A SAGA DA "FAMIGLIA EMBOLSONARAM"


Bolsonaro – e filhos – se amoldam à segunda categoria, o baixo clero. Estes não foram talhados para a política com (P) maiúsculo, a política como a arte de bem governar os povos. Os caras do baixo clero fazem miséria, recebem mesadas, patrocínios de empresas que possuem interesse em votações, e até mesmo surrupiam uma parte dos salários de funcionários dos seus gabinetes. 




Por Antonio Cavalcante Filho 


Sempre desconfiei dos políticoides carreiristas, daqueles fisiológicos que não possuem nenhuma ocupação na vida que não seja brigar por cargos públicos (sem se submeter a uma suada aprovação em concursos), e seu único sonho é galgar o poder e se locupletar rápido e facilmente, mesmo que para isso tenham que atropelar todos os escrúpulos. Cargo público nenhum é para o engrandecimento pessoal do agente e muito menos para acumulação de fortunas às custas da grande maioria da população atirada na miséria e no abandono.

Quando escolho em quem votar, me interessa saber se ele é um trabalhador preocupado com a sua categoria, se milita nos movimentos sociais em defesa do meio ambiente, dos direitos humanos, dos explorados e das minorias, se é um bom professor, um médico, um advogado, um engenheiro, um artista; enfim, um profissional liberal ético, exemplar. Se é religioso, quero saber se ele preocupa-se com os problemas das injustiças sociais ou somente com questões espirituais.

Quando percebo que o candidato é um politicalhão que jamais teve uma carteira de trabalho assinada, que é um servidor público sem nunca ter passado num concurso, e mesmo assim, ostenta riqueza, fujo dele. A origem da sua fortuna, em via de regra, é ilícita, e tal sujeito tinha que estar bem distante do centro de decisões da administração pública e, não exercendo mandatos eletivos, seja lá qual for.

O ex-deputado federal Jair Bolsonaro é um desses carreiristas que, por 30 anos, desde quando foi afastado do exército, faz da política uma profissão, sempre fez parte do chamado “baixo clero”, como a exemplo dos golpistas Eduardo Cunha, Michel Temer e tantos outros. Só para explicar ao leitor: no Congresso Nacional, se convencionou tratar distintamente duas categorias de parlamentares. Os primeiros são os cardeais, os que de fato decidem que tipo de lei e política pública deve ser aprovada. São os “cabeças pensantes”, e atuam acima de seus partidos políticos e das bancadas temáticas. São poucos. A grande massa, os políticos locais, sem expressão, conhecimento técnico ou liderança, são chamados de “baixo clero”. Atuam em manada, geralmente porque recebem algum benefício para atuar nas votações em determinado sentido.

Bolsonaro – e filhos – se amoldam à segunda categoria, o baixo clero. Estes não foram talhados para a política com (P) maiúsculo, a política como a arte de bem governar os povos. Os caras do baixo clero fazem miséria, recebem mesadas, patrocínios de empresas que possuem interesse em votações, e até mesmo surrupiam uma parte dos salários de funcionários dos seus gabinetes.

No início do ano, a Polícia Federal investigava o delito de lavagem de dinheiro que envolvia políticos do Rio de janeiro, e percebeu que 60 dos 70 deputados estaduais teriam algum tipo de envolvimento. Pediram a prisão de 10 desses parlamentares, e também a quebra do sigilo bancário de 75 assessores lotados na Assembleia Legislativa. A decisão judicial, que foi tomada durante as eleições de 2018 e “não vazou”, revelou que um assessor do deputado Flavio Bolsonaro recebeu e movimentou R$ 1,3 milhão, estranha para quem recebe salário de R$ 8 mil.

O mais grave soube-se depois. O motorista endinheirado embolsou (e aí fica estreita a sua ligação com os “Embolsonaro”) dinheiro de outros 7 assessores do deputado estadual Bolsonaro, e depositou um cheque de R$ 24 mil na conta de Michelle Bolsonaro, a terceira esposa do presidente eleito.

A explicação dada pelos acusados, 2 ou 3 dias após a revelação do malfeito, é que se tratava de um empréstimo feito por Jair Bolsonaro ao motorista, que passava por dificuldades financeiras. Mas o sujeito que movimentou mais de R$ 1,3 milhão em um ano possui dificuldade financeira? Confrontado pela imprensa, Jair Bolsonaro diz que a quantia emprestada é ainda maior que os R$ 24 mil, mas que nada disso foi declarado à Receita federal, nem o empréstimo, e menos ainda os pagamentos feitos na conta corrente de Michelle Bolsonaro.

Trata-se de uma transação típica de quem quer ocultar algum negócio ilícito que a Lei de Lavagem de Dinheiro e a Lei da Sonegação Fiscal oferecem punição. No caso comentado, ao admitir o crime de sonegação fiscal, Jair Bolsonaro pode ser apenado com reclusão de 6 meses a 2 anos de cadeia.

O fato merece uma investigação bem mais séria do que feito até o momento, a quebra de sigilo deve aplicar os alvos, e retroagir pelo menos uns cinco anos no tempo, porque seguramente o “buraco” da sonegação é bem maior. Outra questão é a origem do dinheiro. Sabe-se que o motorista Fabricio é amigão da família Bolsonaro, assim de participar do churrasco e da pescaria. Mas isso não o exime de explicar porque a funcionária do gabinete de Jair Bolsonaro depositou dinheiro na sua conta, o mesmo que os 7 assessores de Flávio Bolsonaro. E, principalmente, deve justificar qual a origem da volumosa quantia que passou por suas contas, o que não combina com o salário de PM e motorista da família Bolsonaro.

O caso do motorista que mora em um muquifo com uma movimentação bancária milionária em sua conta pessoal, e agora revelado mais um, o do tenente-coronel, Wellington Servulo, que, trabalhando no gabinete de Flávio Bolsonaro por um ano e quatro meses, ficou 115 dias fora do país recebendo os salários e as gratificações pagas pela Assembleia Legislativa do Rio, nos faz lembrar das tramoias escabrosas dos vereadores do baixo clero cuiabano que denunciamos em 1999.

Para quem não se lembra, há 18 anos, escancaramos que a Câmara Municipal de Cuiabá, na época, conhecida como a “A Casa dos Horrores”, tinha em seus quadros com vultosos salários funcionários fantasmas, nepotismo e “contratados” que sequer sabiam que eram lotados na “Casa”. Nos processos, ficou comprovado que o dinheiro pago a tais servidores escorriam para os bolsos dos vereadores.

Para quem vive apenas do salário parlamentar, é espantoso o crescimento patrimonial dos bolsonaros (mais de R$ 15 milhões). Nas tramoias do Rio de Janeiro, será que os Bolsonaro não “embolsonaram” alguns caraminguás, algumas bufunfas?

Antonio Cavalcante Filho, o Ceará, é sindicalista e escreve neste espaço às sextas-feiras - E-mail: antoniocavalcantefilho@outlook.com

Fonte RD News