O desaparecimento nos últimos meses fez da pergunta “Cadê o Queiroz?” um bordão popular nas redes sociais e entre políticos da oposição sempre que querem cutucar o presidente. “Cabe a ele explicar. Eu também quero saber onde está o Queiroz”, diz Flávio Bolsonaro, ao ser perguntado sobre o tema.
Reportagem de Daniel Pereira, Adriana Dias Lopes e Fernando Molica na Veja.
Por volta das 17h50 do último dia 26, o desaparecido
mais famoso do Brasil passou, sem chamar atenção de ninguém, pela porta e
se encaminhou para a recepção do Centro de Oncologia e Hematologia do
Hospital Albert Einstein, em São Paulo. Ali são oferecidos consultas e
serviços como quimioterapia e radioterapia. De boné preto e óculos de
grau, o paciente chegou sem seguranças nem familiares o acompanhando — e
ficou sozinho por lá. Antes do compromisso agendado, fez hora na
lanchonete e tomou café tranquilamente, sem ser importunado por ninguém.
Cerca de uma hora depois, Fabrício Queiroz, o ex-assessor do senador
Flávio Bolsonaro, sumido desde janeiro, deixou o local. Ao longo dos
últimos três meses, VEJA seguiu pistas e entrevistou dezenas de pessoas
para identificar seu paradeiro. Conforme mostram as fotos desta
reportagem, achamos finalmente o desaparecido mais famoso do país.
Queiroz hoje reside no Morumbi, o mesmo bairro da Zona Sul de São
Paulo onde se encontra o Einstein. A proximidade facilita os
deslocamentos até o hospital, normalmente feitos de táxi ou Uber.
Queiroz, que raramente sai de casa, luta contra o mesmo câncer no
intestino que o levou para a mesa de cirurgia no fim do ano passado,
pouco antes do estouro do escândalo da movimentação suspeita de 1,2
milhão de reais (600 000 entrando e 600 000 saindo) em sua conta na
época em que trabalhava para Flávio Bolsonaro. Sua última aparição
pública foi justamente no Einstein. Em 12 de janeiro, ele postou um
vídeo na internet em que surgia dançando no hospital durante a
recuperação de uma cirurgia. Segundo uma pessoa próxima, a operação não
resolveu o problema do tumor. Um possível agravante é o de que Queiroz
teria se descuidado por um tempo, para dar prioridade nos últimos meses
ao esforço de se manter longe dos holofotes. As “férias” forçadas do
tratamento cobraram um preço: há sinais de que a doença continua
ameaçando perigosamente seu organismo. Um de seus amigos, o deputado
estadual Rodrigo Amorim (PSL-RJ), trocou mensagens com Queiroz há alguns
meses. “Ele escreveu que ainda estava baqueado”, conta. No aspecto
físico, Queiroz não aparenta seu delicado estado de saúde. Está apenas
ligeiramente mais magro do que no ano passado.
Na movimentada seara de escândalos nacionais, Queiroz surgiu como
um cometa e sumiu do espaço sem deixar vestígios. A aparição
espetacular, como se sabe, ocorreu no fim de 2018, a partir do momento
em que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) detectou
em sua conta a dinheirama suspeita. A tese do Ministério Público é a de
que ela é fruto de um sistema de coleta e de repasse de dinheiro de
funcionários do gabinete do senador Flávio Bolsonaro, quando o Zero Um
era deputado estadual no Rio de Janeiro. O órgão identificou também
emissão de cheques de Queiroz no total de 24 000 reais para a conta da
então futura primeira-dama Michelle Bolsonaro. O enrolado Queiroz
enrolou-se ainda mais nas explicações. Mencionou em um primeiro momento
lucros de vendas de carros usados e, depois, disse que recolhia parte
dos salários dos funcionários do gabinete a fim de contratar mais gente
para a equipe do chefe, sem conhecimento do próprio. No caso de
Michelle, os depósitos seriam para quitar um empréstimo pessoal
concedido a ele por Jair Bolsonaro. Em público, o clã Bolsonaro procurou
se distanciar do ex-policial, incluindo o presidente, amigão de Queiroz
desde o início dos anos 80, quando se conheceram no serviço militar da
Brigada de Infantaria Paraquedista, no Rio. Tal distanciamento, no
entanto, está mais no terreno da retórica. Foi do entorno de Bolsonaro a
ideia de levar Queiroz para uma entrevista no SBT, no dia 26 de
dezembro, para falar sobre o relatório do Coaf e tentar explicar a
origem do dinheiro. Não convenceu ninguém, e o presidente, em sintonia
com essa percepção, chamou de “roleiro”, em manifestação pública, o
velho amigo de pescarias, churrascos e serviços prestados à família. As
perguntas foram inevitáveis: Queiroz fazia as transações com ou sem a
anuência do filho do presidente? Quais os nomes desses contratados? Não
houve respostas. Pressionado, o ex-assessor decidiu sumir do mapa.
O desaparecimento nos últimos meses fez da pergunta “Cadê o
Queiroz?” um bordão popular nas redes sociais e entre políticos da
oposição sempre que querem cutucar o presidente. “Cabe a ele explicar.
Eu também quero saber onde está o Queiroz”, diz Flávio Bolsonaro, ao ser
perguntado sobre o tema. Bolsonaro, o pai, sempre entoou a mesma
cantilena, terceirizando a responsabilidade dos problemas ao parceiro de
longa data. Segundo um dos boatos surgidos para explicar o
desaparecimento, Queiroz estaria escondido, fugindo de ameaças de morte
para não abrir a boca. Em outra hipótese, neste caso, na direção
contrária, teria sumido para escapar do assédio de pessoas interessadas
em depoimentos capazes de incriminar os Bolsonaro. Ganharia em troca o
fim das encrencas que enfrenta na Justiça e segurança para sua família.
(…)
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Fonte Vi o Mundo