O Brasil é apenas um dos oito paises amazônicos, mas tem 60% da floresta. Para onde o Brasil for, o resto da floresta vai, já que ela é toda interconectada por uma gigantesca rede de rios. Isso significa que a XR, que tem sido bem sucedida em sua estratégia
de expansão, dará o próximo passo natural na campanha: propor o boicote a
produtos brasileiros.
Projeção feita na parede do hotel onde Bolsonaro está hospedado em Nova York
Infelizmente o Viomundo não tem recursos para traduzir este
vídeo. Porém, trata-se de uma palestra que faz um bom resumo das
posições que levaram um grupo considerável de ambientalistas a “romper”
com o IPCC
Da Redação
O presidente Jair Bolsonaro fará discurso nesta terça-feira 24, na
abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas, sob pressão que nenhum
outro líder brasileiro enfrentou.
Antes mesmo de completar nove meses de governo, Bolsonaro tirou o
Brasil do papel central que o País exercia no debate global sobre o meio
ambiente desde a Eco 92, a conferência do clima que aconteceu no Rio de
Janeiro.
Um artigo do diário New York Times foi intitulado “Imagine Jair Bolsonaro respondendo por Ecocídio em Haia”, uma possibilidade legal aventada pelo ativista Jojo Mehta, co-fundador do grupo Stop Ecocide.
Haia, na Holanda, é sede do Tribunal Penal Internacional.
Influenciado por Donald Trump e provavelmente acreditando que
dispunha do mesmo poder de fogo e de manobra do líder norte-americano,
Bolsonaro começou desistindo de sediar a Cop-25, a conferência do clima
prevista para o Brasil que as Nações Unidas teve de transferir às
pressas para o Chile.
A conferência será em novembro. O Brasil desistiu de sediar o encontro alegando falta de dinheiro.
O infortúnio de Bolsonaro é que ele e seu entorno são extremamente desinformados sobre a conjuntura mundial.
No mundo de hoje, mesmo às vezes contra suas convicções, um governo
tem de ser suficientemente maleável para defender mercados e abrir mão
de algumas ideias se estão em jogo interesses econômicos de longo prazo.
Porém, o guru do governo Bolsonaro, o autointitulado filósofo e
ex-astrólogo Olavo de Carvalho, baseado em Arlington, Virginia, é um
especialista em questões anais.
O chanceler do governo, Ernesto Araújo, balbucia discursos desconexos
sobre um certo “climatismo”, que mesmo um colunista do diário mainstream dos Estados Unidos, o Washington Post, classificou de — no popular — encheção de linguiça.
O discurso de Araújo, há alguns dias, foi num dos templos do
conservadorismo dos Estados Unidos, a Heritage Foundation. Causou
péssima impressão, pois ele não disse lé com cré.
Enquanto isso, em Londres, em maio de 2018, havia sido formalizada a
criação de um grupo que tem tido grande influência no debate sobre as
questões do clima desde então: o Extinction Rebellion, ou Rebelião da Extinção, ou XR para os íntimos.
O grupo de Ação Direta ou de Desobediência Civil, como queiram, se inspira nas ações de Gandhi e de Martin Luther King.
Dentre os fundadores estão Roger Hallam, um ambientalista britânico,
Gail Bradbrook, uma doutora em biofísica molecular, e o agitador Simon
Bramwell, além de muitos outros.
Gail, como se vê no vídeo acima, é uma espécie de porta-voz do grupo por causa de sua formação científica.
A XR nasceu de questionamentos ao IPCC, o Painel Intergovernamental
sobre Mudanças Climáticas, criado pelas Nações Unidas em 1988.
O painel é formado por grupos de trabalho, uma força de trabalho e uma unidade de apoio técnico.
A crítica é que, sob crescente pressão política de governos e grupos
econômicos importantes, o IPCC foi diluindo o trabalho puramente
científico e buscando um consenso que inclui economistas e políticos que
acaba atrasando o alerta necessário sobre a crise do clima.
Com isso, governos ganham tempo para utilizar recursos que aprofundam
a crise, com projetos de longo prazo para torrar carvão mineral,
petróleo e manter em funcionamento usinas nucleares.
Medidas para proteger florestas tropicais são adiadas, quando não
completamente desconhecidas — no caso do governo Bolsonaro, há planos
para implantar hidrelétricas, rodovias, fazer mineração em terras
indígenas, legalizar o garimpo e ocupar a Amazônia praticamente nos
mesmo moldes do que já foi feito em Rondônia ou no Sul do Pará.
O bolsonarismo, por sua vez, argumenta que a ONU representa um
projeto de globalismo, ou seja, pretende restringir a soberania
brasileira usando ONGs, movimentos sociais e a igreja Católica, dentre
outros.
Também argumenta que não é justo que o Brasil deixe de desenvolver a
Amazônia depois que os Estados Unidos, por exemplo, praticamente
dizimaram sua população indígena e devastaram o meio ambiente.
Com razão, aponta para o fato de que o Brasil está longe de ser o
maior produtor de gás carbônico do mundo — os EUA seguem sendo
disparadamente o maior vilão.
Por outro lado, Jair Bolsonaro pretende desconhecer a montanha de
evidências científicas que se acumula sobre o aquecimento global, parte
dela produzida por cientistas brasileiros.
A conjuntura, infelizmente para o Brasil, mudou.
Mesmo o cidadão comum reconhece que, como os cientistas vinham
alertando, temos vivido extremos de frio e calor inusitados e
tempestades de intensidade inesperada.
A justificativa dos cientistas ligados à XR para o “modo de alerta”
que assumiram nos últimos meses é de que os modelos do IPCC estão se
mostrando, na prática, muito conservadores.
O maior exemplo está na observação, feita sempre em setembro, sobre a camada de gelo que derrete no Ártico.
O gráfico acima mostra: a linha em vermelho registra as observações REAIS.
A linha mais escura mostra a mediana dos modelos projetados pelo IPCC.
As observações foram confirmadas pela NASA, a agência espacial dos
Estados Unidos, já para setembro de 2019: registrou-se empate no segundo
índice mais alto de degelo da História.
O que argumentam os cientistas ligados à XR?
Que por algum motivo ainda não exatamente esclarecido os efeitos do
aquecimento global estão se autoalimentando e acelerando a partir de
determinado patamar.
Daí a emergência.
Os editores do diário britânico esquerdista Guardian foram convencidos, e passaram a usar o termo “emergência climática” em seus textos.
A turma da XR, como se vê na palestra de Gail, quer ação imediata: emissões zero a partir de 2025.
Faz previsões catastróficas: um aquecimento global, em média, de 3,2 graus celsius ao longo da vida das crianças de hoje.
Desertificação e colapso da produção agrícola em algumas regiões, por causa da mudança do regime de ventos e chuvas.
No Brasil, sabemos que as chuvas que abastecem o Sudeste se originam na Amazônia.
Se este regime de chuvas for alterado de maneira significativa, o agronegócio brasileiro poderá sofrer perdas bilionárias.
Toda a infraestrutura para transporte de grãos para exportação, por exemplo, teria de ser alterada em curto espaço de tempo.
A turma da XR prevê 200 milhões de migrantes até o ano de 2050, por causa das mudanças climáticas.
Para desgraça do Brasil, a XR já escolheu Bolsonaro como um dos
vilões do clima, dada a importância da Amazônia para absorver gás
carbônico.
O Brasil é apenas um dos oito paises amazônicos, mas tem 60% da floresta.
Para onde o Brasil for, o resto da floresta vai, já que ela é toda interconectada por uma gigantesca rede de rios.
Isso significa que a XR, que tem sido bem sucedida em sua estratégia
de expansão, dará o próximo passo natural na campanha: propor o boicote a
produtos brasileiros.
Justamente num momento em que a adolescente sueca Greta Thunberg, de
16 anos de idade, mobiliza milhões de adolescentes e crianças nas ruas e
pelas redes sociais.
Em Nova York, o pessoal da XR se juntou a outros grupos para protestar contra Bolsonaro.
Participou da carta enviada ao secretário-geral da ONU, protestando
contra a presença do presidente brasileiro na ONU (ver no pé do post).
Bolsonaro até agora não demonstrou preocupação pública com os protestos.
Na noite da segunda-feira, deixou o hotel Intercontinental Barclay,
em Nova York — diária de R$ 2.500 para um quarto simples — vestindo um
colar que teria ganhado de presente da indígena youtuber Ysani Kalapalo.
Os dois teriam ido jantar em uma pizzaria.
Ysani foi denunciada por caciques do Xingu como o liderança indígena fake, que Bolsonaro teria arrastado a Nova York apenas para enfeitar sua comitiva.
Por cartazes vistos em Nova York nos últimos dias, o boicote a produtos brasileiros pode mobilizar ativistas num futuro próximo.
A ligação entre o hambúrguer consumido pelos norte-americanos e o
corte de árvores para a abertura de pastagens na Amazônia, ainda que não
corresponda 100% à realidade, apela ao imaginário dos consumidores
estadunidenses.
O boicote foi defendido por Maria Luisa Mendonça, diretora da Network
for Social Justice and Human Rights no Brasil, numa entrevista ao Democracy Now (ver abaixo).
O Democracy Now é um canal extremamente popular entre ativistas dos Estados Unidos.
Maria Luisa ligou Bolsonaro diretamente aos grandes interesses
econômicos dos produtores de carne, soja, cana de açúcar e madeira —
produtos que, portanto, para ela deveriam encabeçar a lista do boicote.
10 de setembro de 2019
Estimado Secretário-geral Guterres:
Nós, os signatários desta carta, representamos uma coalizão muito
ampla de organizações da sociedade civil e indivíduos preocupados de
vários setores da academia, empresas e governo.
Estamos escrevendo para expressar nossa indignação ao fato da 74ª
Assembléia Geral das Nações Unidas de 2019, com dedicação especial à
Cúpula de Ação Climática, ser inaugurada por Jaír Bolsonaro, Presidente
do Brasil, um negador da mudança climática que, durante o curto período
de sua presidência, supervisionou a destruição sem precedentes da
Amazônia e a rápida reversão de décadas de tentativa de progresso
ambiental e de direitos humanos na região.
A Amazônia é predominantemente um patrimônio brasileiro, lar de mais de um milhão de indígenas e também um patrimônio mundial.
O ataque à Amazônia e seus habitantes viola vários princípios básicos
que hoje determinam algumas das diretrizes mais proeminentes das Nações
Unidas: a necessidade de ação climática, inclusão, diversidade e ao
mesmo tempo reverter os ganhos sociais do último meio século em relação à
equidade e inclusão.
Nós, abaixo-assinados, exortamos a V. Exa. a assumir uma posição de
princípio e necessária condenando Bolsonaro e suas ações. Pedimos a V.
Exa. que, como Secretário-Geral, repreenda Bolsonaro formalmente.
Recentemente, os incêndios na Amazônia chamaram a atenção do mundo,
mas as manchetes não retratam toda a extensão da catástrofe ambiental e
dos direitos humanos na região.
Na atual taxa de desmatamento da floresta amazônica (equivalente a um
campo e meio de futebol a cada minuto), os cientistas alertam que em
breve chegaremos a um “ponto de inflexão” sem retorno.
Os recentes e bem documentados casos de violência que visam deslocar
as comunidades indígenas da região são alarmantes e fazem parte de uma
tendência crescente.
Esses casos foram recebidos pelo governo brasileiro com impunidade.
A situação na Amazônia, os incêndios, o desmatamento, o deslocamento
forçado das comunidades indígenas ameaçam fundamentalmente o ecossistema
e seus habitantes.
Isso já impactou diretamente os países vizinhos e é, obviamente, uma
ameaça planetária, pois a capacidade da Amazônia de absorver carbono é
crucial para mitigar as mudanças climáticas.
A atual aceleração na destruição da Amazônia é o resultado de uma
atividade humana deliberada e concertada, diretamente encorajada pelo
governo de Bolsonaro.
Cientistas e organizações da sociedade civil como a APIB (Articulação
dos Povos Indígenas no Brasil) vêm alertando há meses que as políticas
arbitrárias do governo Bolsonaro teriam impactos desastrosos.
O governo de Bolsonaro retirou, de forma radical, o financiamento das
agências de proteção ambiental e indígena. Ele nomeou como Ministro do
Meio Ambiente outro negador da mudança climática, que foi acusado de
conduta criminal.
Não se retirou do Acordo de Paris apenas devido à pressão nacional e
internacional, mas parou efetivamente de cumprir os seus termos.
Substituiu todo o conselho da única agência ambiental autônoma do Brasil por policiais da Polícia Militar.
Deu um “sinal verde” ao desmatamento e apropriação ilegal de terras
para aqueles que destruiriam a maior floresta tropical remanescente do
mundo.
Diante de fatos, o regime Bolsonaro respondeu com teorias da conspiração e tentou silenciar os dissidentes.
No mês passado, o principal cientista do Brasil, Ricardo Galvão,
diretor do INPE (Instituto Nacional de Pesquisa Espacial) foi demitido
por divulgar imagens de satélite, evidências científicas, do rápido
desmatamento em 2019.
O próprio Bolsonaro acusou repetidamente ONGs e povos indígenas pelos
incêndios, dando ainda mais o aval à onda de violência contra os
habitantes da Amazônia e aqueles que a defendem.
Mais de 40% da floresta queimada até agora estava em terras públicas
e, no entanto, Bolsonaro recusou generosa ajuda dos países do G7 para
controlar os incêndios.
Simplesmente não podemos ficar parados e deixar que essa catástrofe se desdobre.
Reconhecemos que, solicitando que V. Exa. formalmente repreenda o
presidente do Brasil, estamos pedindo algo sem precedentes e não fazemos
essa solicitação sem gravidade.
No entanto, as Nações Unidas e, em particular, o recém-eleito
Presidente da ONU, Muhammad-Bande, se comprometeram com a promoção de
“Paz e segurança, erradicação da pobreza, fome zero, educação de
qualidade, ação climática e inclusão” no próximo ano.
Para manter a integridade desses valores, as opiniões de Bolsonaro devem ser rejeitadas completa e definitivamente.
Permitir que ele fale sem ser contestado como orador de abertura de
uma sessão dedicada à Ação Climática ridiculariza a ONU e seus órgãos.
Em maio de 2019, vários dos grupos abaixo-assinados ajudaram a
protestar contra um prêmio que Bolsonaro deveria receber na cidade de
Nova York em um prédio público que abriga o Museu Americano de História
Natural.
Vinte e cinco mil pessoas assinaram uma petição, os cientistas pressionaram, e o museu cancelou a realização da gala.
Posteriormente, foram coletadas 82 mil assinaturas em 48 horas contra o Marriott Hotel, que realizou o mesmo evento.
O prefeito da cidade de Nova York, Bill De Blasio, entendeu a ofensa aos cidadãos, e fez um pronunciamento público.
Bolsonaro cancelou sua visita a Nova York. As ações diretas e
pacíficas da sociedade civil serviram de maneira muito eficaz para
mostrar ao mundo que a cidade de Nova York não toleraria homenagear um
homem que promove hostilidade em relação a povos indígenas, pessoas das
comunidades LGBTQ e Afro-brasileiras, além de supervisionar a destruição
da Amazônia.
Não devemos nos permanecer calados diante de tais injustiças,
violência e ataques contra as pessoas e o meio ambiente. Ao permanecer
em silêncio, nos tornamos cúmplices.
Respeitosamente,
Comitê Defend Democracy in Brazil — Nova York
Articulação dos Povos Indígenas (APIB)
Amazon Watch
ANSWER Coalition NYC (Act Now to Stop the War and End Racism)
Rise And Resist NY
Extinction Rebellion International
Extinction Rebellion NYC
Extinction Rebellion Amazonia
Earthstrike NYC
Rede dos Estados Unidos pela Democracia no Brasil
Reverend Billy & the stop shopping choir
UNEAFRO Brasil
Revolting Lesbians
Women’s Earth and Climate Action Network (WECAN)
Fonte Vi o Mundo
https://www.facebook.com/antoniocavalcantefilho.cavalcante