sexta-feira, 14 de outubro de 2011

FISCALIZAÇÃO DOS JUÍZES ESTÁ PREVISTA EM EMENDA CONSTITUCIONAL

Criador do CNJ diz que a fiscalização de juízes está prevista na emenda constitucional que criou o conselho

Ex-deputado Jairo Carneiro em comissão da reforma do Judiciário.


Por Bruno Góes

RIO - O ex-deputado Jairo Carneiro, relator da comissão especial da reforma do Judiciário em 1995, sugeriu a criação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Em entrevista, ele diz que a fiscalização e punição de magistrados está prevista na emenda constitucional 45, que criou o conselho e foi aprovada em 2004. O Supremo Tribunal Federal (STF) deve votar nos próximos dias a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) em que a Associação de Magistrados Brasileiros (AMB) questiona a resolução 135 da CNJ. A resolução padronizou as regras dos processos administrativos contra juízes e desembargadores, determinando, por exemplo, que o CNJ pode também investigar os magistrados antes mesmo dos tribunais estaduais. A AMB defende que o conselho não tem competência para tratar do assunto e que só atue após o término da investigação do próprio tribunal a que pertence o magistrado.

Jairo defende ainda que nenhum poder deve estar imune ao controle da sociedade. E lamenta não ter conseguido aprovar, na época da votação da emenda, a perda do cargo como punição para magistrados corruptos, assim como a lei prevê para o Executivo (impeachment) e para o Legislativo (cassação do mandato).


O GLOBO : Como foram as negociações para a criação do CNJ?

JAIRO CARNEIRO : Desde o início eu defendi algumas reformas no Poder Judiciário. E uma delas foi a criação do Conselho Nacional de Justiça. Outra foi a súmula vinculante. Eu participei de congressos de magistrados em diversos estados do Brasil. Recordo-me de um no Rio Grande do Sul, em Gramado, onde estavam mais de 3 mil magistrados de todo o país, incluindo ministro de tribunais superiores. Houve também em Fortaleza um congresso da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). Estive em eventos e simpósios da Ordem dos Advogados do Brasil, como no Rio de Janeiro. Estive na Associação dos magistrados do estado de São Paulo, onde houve uma grande reunião, e em outros estados. Estive com ministros do Supremo, com então ministro da Defesa Nelson Jobim. Havia reuniões de trabalho com ministros do Supremo, ministros do STJ (Superior Tribunal de Justiça), com outros tribunais, até com o Superior Tribunal Militar (STM).

O GLOBO : E nessas discussões, quais eram os pontos de difícil negociação?

CARNEIRO : Sobre o CNJ, a resistência maior era sobre a composição. Eu defendia uma presença maior da magistratura na sua composição do que de membros de fora. Mas prevaleceu a tese de ampliar os membros de fora. E aí, houve uma certa resistência. Outro ponto de resistência, para mim, era quanto a uma tese que eu defendi e, no final, ela foi afastada. A exemplo do que ocorre com o agente político, seja do Executivo ou do Legislativo, que podem estar sujeitos -no caso Executivo ao Impeachment e no caso do Legislativo a perda do mandato -, eu defendia também que em situações como corrupção, improbidade, etc., este conselho, o CNJ, deveria reunir poder para declarar a perda do cargo do magistrado, assegurada a ampla defesa. E isso estava nas versões que eu redigi e que defendi, inclusive, nesses congressos com grande participação da magistratura. Havia resistência, e esse ponto não prevaleceu. Prevaleceu apenas a demissão para o magistrado que ainda não alcançou a vitaliciedade. Mas eu defendia a perda do cargo porque eu acho que não faz nenhuma diferença, assim como acontece com os parlamentares.

O GLOBO : Mas não houve tantas contrariedades...

CARNEIRO : De um modo geral, naquela época da reforma do Judiciário, nós tivemos a sua aprovação, promulgação, sem maiores contendas, sem maior resistência. E eu até me admiro de estar havendo o que acontece hoje.

O GLOBO : Como o senhor vê a ação da AMB, que considera inconstitucional a resolução 135 do CNJ?

CARNEIRO : É um problema que é da economia interna do poder em atuais desavenças do próprio poder. Se você atentar para a leitura da resolução 135, ela estabelece todo o regramento e o procedimento a ser observado, assegurando a ampla defesa e com todas as cautelas. A resolução, pela leitura que fiz, não se distancia em nenhum ponto daquilo que são as atribuições definidas e deferidas na Emenda Constitucional de nº 45.

O GLOBO : Há uma Proposta de Emenda Constitucional do senador Demóstenes Torres que pode ser apresentada se o Supremo julgar procedente a ação da AMB. O que o senhor acha dela?

CARNEIRO : Ainda não tive acesso à proposta, mas o Conselho tem poder para rever, de ofício, processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados a menos de um ano. Tem esse poder, que é um poder amplo. E tem o poder de avocar processos também. Se houver um conluio, uma excessiva morosidade, se houver uma demonstração cabal por manifestações de autoridades, etc., o conselho tem que estar atento e ele tem que ser provocado. Então esse poder está concedido, está assegurado na reforma. Se falava que o Judiciário era uma caixa preta, um poder inacessível, que (os juízes) eram os deuses na terra, então tudo isso ... acho que mudou radicalmente com a reforma e a tendência é de amadurecimento.

O GLOBO : A AMB diz que o CNJ não pode virar um tribunal...

CARNEIRO : A AMB pode mudar de opinião em algum momento. Mas a sociedade tem o direito do controle social e o conselho deve ser uma expressão dessa manifestação da necessidade do acompanhamento e controle da sociedade. Nenhum poder pode estar imune ao controle. Assim como o Legislativo e o Executivo estão sujeitos ao controle do Judiciário, é preciso que alguém também possa fiscalizar o Judiciário.

O GLOBO : Qual foi a recepção da sociedade à época da aprovação da emenda 45?

CARNEIRO : Foi um momento festivo, solene, importante para história do parlamento, do Congresso Nacional, para o aperfeiçoamento das nossas instituições. Foi um trabalho feito com muitas mãos e com uma ampla participação.

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REDUZIR AS ATRIBUIÇÕES DO CNJ É UM PASSO PARA SEU ESVAZIAMENTO





Themis Chorando
Por Benedito Calheiros Bomfim*


Todo poder sem controle tende ao abuso e ao autoritarismo. Os integrantes de uma corporação que não se sujeita à delimitação e à fiscalização pendem para o corporativismo. É o que ocorre com parte de nossa magistratura, que se julga intocável, insuscetível de erro e de crítica.

O Judiciário brasileiro sempre se mostrou lento, distante do povo, deficiente, mas se conduz como se pairasse no Olimpo. As Corregedorias regionais, incumbidas de corrigir tais deslizes e punir os responsáveis, e que não exerciam autoridade sobre desembargadores, seus pares, mas somente sobre os juízes de 1º grau, mostraram-se inoperantes. Sabe-se que os desembargadores, máxime nas cortes de menor porte, que constituem a maioria delas, formam relações de amizade, às vezes até de natureza familiar, o que lhes retira a isenção para investigar e punir seus pares. Daí por que fez-se necessária a criação do Conselho Nacional de Justiça, com a atribuição de controlar a gestão administrativa, financeira, os deveres do magistrado e punir os infratores.

É inquestionável a capacidade, o espírito público, a dignidade da grande maioria de nossos magistrados, mas também é verdade que faltam tais qualidades a muitos juízes que, com sua conduta comprometem o funcionamento e a imagem da Justiça. O CNJ já puniu 35 desembargadores e investiga outros 15 por irregularidades, tais como venda de sentença, desvio de verbas, apropriação de recursos públicos, formação de quadrilha.

O magistrado é investido em tão alto posto para julgar conflitos sociais, questões familiares e patrimoniais, e de suas decisões depende a própria liberdade das pessoas. Para garantia de sua independência é que goza de garantias, tais como vitaliciedade, salários elevados, inamovibilidade, aposentadoria com proventos integrais, mesmo afastado para investigação ou condenação criminal, o que equivale a um prêmio. O juiz há de ter uma conduta pública e privada exemplar. Seus desvios devem ser punidos, devido ao seu papel institucional, com maior rigor. A pena há de ser aplicada de acordo com o grau de responsabilidade social e pessoal do agente, e, tratando-se de juiz, antagonicamente ao do bandido, cuja função é a de transgredir a ordem jurídica, a punição deve ser agravada.

Reduzir as atribuições do CNJ, tais como veem sendo exercidas, é um passo para seu esvaziamento. 

Fonte: O GLOBO, 13/10/2011

*BENEDITO CALHEIROS BOMFIM: Advogado trabalhista atuante desde 1944 e escritor reconhecido na área do Direito. Autor de vários livros, entre os quais: “Conceito sobre Magistratura, Justiça e Direito, atualmente na 6ª edição; “Conselhos aos Jovens Advogados, 2ª edição e “Dicionário de Decisões Trabalhistas”, em parceria com Silvério dos Santos, sua obra mais divulgada, 36ª edição, e que teve grande importância para a formação de um corpus do Direito do Trabalho. É membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho. Ocupou importantes cargos em entidades do meio jurídico. Foi presidente da Associação Carioca de Advogados Trabalhistas (ACAT), vice-presidente da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (ABRAT), presidente do Instituto de Advogados Brasileiros (IAB) e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Conselheiro Federal e Seccional da OAB. Está no seleto grupo daqueles que foram contemplados com a medalha Teixeira de Freitas, uma das maiores honrarias do mundo jurídico. Recebeu medalhas do Tribunal Superior do Trabalho, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro e do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região, que também o agraciou com a entrega de uma placa comemorativa de seus 80 anos de idade.

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