"Há todo um velho mundo ainda por destruir e todo um novo mundo a construir. Mas nós conseguiremos, jovens amigos, não é verdade?". (Rosa Luxemburgo)
VAMOS MOSTRAR PRA POLITICALHA DO NOSSO ESTADO QUE A SAFADEZA TEM QUE ACABAR... VAMOS PEGAR DURO PELO JUGAMENTO DOS CANALHAS E VÂNDALOS QUE DEPREDARAM O DINHEIRO PUBLICO EM MATO GROSSO... O POVO QUER ESSES CORRUPTOS NA CADEIA E SEUS BENS CONFISCADOS...
POR QUE PROTESTAS?
Por Antonio Cavalcante Filho e
Vilson Nery*
Graças à evolução das pessoas em reconhecer cada vez
mais os seus direitos civis ao longo do tempo e exigir respeito a
eles, fica cada dia mais difícil aos trapaceiros enganar a todos (ou
a maioria) durante muito tempo.
Ora, se você vai ao supermercado e
encontra, na prateleira, um produto vencido, você protesta, reclama
com o gerente. Se vai a uma loja de móveis e compra uma geladeira
com defeito, de imediato aciona o Procon, pedindo pela intervenção
na defesa de seus interesses de consumidor.
Nas relações sociais é a mesma coisa.
Se o cidadão está insatisfeito, protesta!
E motivos de insatisfação generalizada é o que não
faltam em nossos dias, basta uma rápida observação no cotidiano da
política e da administração pública. Em todas as esferas de
governo, no judiciário e no legislativo, pululam motivos para
alimentar o desgosto popular.
Quer ver?
Começando por Brasília. A presidenta muda a composição
de sua equipe administrativa, nomeia ministros e dirigentes estatais
somente interessada na cooptação de lideranças (para a próxima
eleição), gere o país do mesmo modo como se administra uma
prefeitura da periferia do estado do Acre (desculpem, acrianos).
O partido político que dirige o Brasil há dez anos vem
a público e diz que é necessário e urgente extinguir o monopólio
do sistema financeiro, dos meios de comunicação e das oligarquias
rurais (sobre a terra). Ora, mas há uma década eles flertam com os
banqueiros (e lhes dão lucros generosos), ignoram solenemente a
reforma agrária e patrocinam os interesse da Editora Abril e da
Rede Globo (com gordas verbas publicitárias).
Em Mato Grosso, óh pobre Mato Grosso!
A gestão da educação ficou a cargo de um médico e a
administração da saúde entregue a um contador. Deu no que deu,
quatro bilhões do orçamento da educação e um bilhão e meio antes
destinados à saúde simplesmente jogados no ralo, enquanto existem
pessoas morrendo por falta de remédio no posto de saúde e crianças
vão à ruas (se drogar) por falta de escola.
“Até” o TCE já reclamou!
Políticas de saúde preventiva (fitoterapia, homeopatia
etc.) e escola em tempo integral (com aulas de teatro, música e
reforço de aprendizado), nem pensar!
Deram a gestão do setor de política cultural para uma
“artista” (e põe artista nisso) que precisava de foro
privilegiado.
O legislativo, esse não existe, não faz lei e não
fiscaliza (os demais). Igual ao Ministério Público e o Tribunal de
Contas. Os fiscais querem cobrar dos agentes políticos o zelo à tão
falada transparência (na arrecadação e gastos de recursos
públicos), mas ignoram eles próprios a Lei de Acesso a Informação
(Lei 12.527/2011).
Tente descobrir algo sobre a gestão do TCE e do MPE nos
respectivos sites!
O judiciário é outro mundo à parte. Mesmo que o
orçamento dobrou em sete anos, de 2006 até 2013 o incremento foi
espetacular, o atendimento aos cidadãos piorou em quantidade e
qualidade (não há pacificação social). O salário dos servidores
do judiciário também encolheu. Resta saber para onde foi destinado
o excesso de arrecadação e os recursos do Funajuris (um fundo sem
fundo e sem prestação de contas).
Nesse particular é igualzinho ao Tribunal de Contas
(que tem o Fundecontas, outro fundo sem fundos e sem prestação de
contas). O TCE pediu um incremento ao orçamento no ano fiscal de
2006, dizendo que era para construir o tal prédio novo, mas se
“esqueceu” de retirar o anexo (plus) nos orçamentos seguintes. E
o engraçado é que, mesmo modernizado (e com muita grana), corrupto
punido pelo Tribunal de Contas somente aquele “prefeitinho” da
cidadezinha do fim do mundo.
E no judiciário aquele político ficha suja ainda continua escolhendo
a dedo os juízes que podem julgá-lo!
E a nossa prefeitura de Cuiabá?
Bom, parte dos secretários municipais deveria estar
numa delegacia sendo interrogado pelas autoridades ou no Presídio
Central, pagando seu débito com a sociedade (respondendo) pelos
processos de homicídio, lesões corporais, porte de arma, crime
eleitoral, peculato etc.. Mas não, por decisão do senhor prefeito,
os réus estão livremente propondo gestão, criando e executando as
políticas públicas, um achincalhe ao conceito de Ficha Limpa (tão
sonhado pelo povo).
O gestor-chefe de Cuiabá, antes de eleito prefeito era
um bem sucedido empresário, reclamava do alto salário dos políticos
e protestava contra a enorme carga tributária. E o que fez quando
assumiu o poder? Aumentou o IPTU (imposto sobre imóveis) e atrelou o
salário dos “amarelinhos” a quantidade de multas que pudessem
aplicar contra os contribuintes. Depois aumentou o próprio salário
e o vencimento dos nobres vereadores. Insatisfeito, criou uma “corte
de vassalos” para acompanhar a própria esposa (gabinete paralelo).
Certamente há motivos para que protestes!
*Antonio Cavalcante Filho e
Vilson Nery são ativistas do MCCE (Movimento de Combate à Corrupção
eleitoral0
LEIA MAIS:
A PRAÇA TAHIR É AQUI?
LEONARDO ATTUCH
Brasil 247
O “outono brasileiro” não tem dono, nem direção. E quem tentar se apropriar desse “movimento” será rapidamente devorado pela fúria das ruas
Quem são eles? O que querem? O que realmente motiva os milhares de jovens que tomaram as ruas das grandes cidades e, ontem, invadiram o próprio Congresso Nacional?
Serão mesmo os vinte centavos da passagens de ônibus? Ou há algo mais fundo? Há explicações para cada tipo de freguês. Para os petistas, a violência da Polícia Militar de São Paulo potencializou a reação desta segunda-feira. Para os tucanos, o que existe é uma insatisfação difusa contra os rumos do País e a precariedade dos serviços públicos.
Diante de uma catarse coletiva, sem direção e sem lideranças claras, cada grupo tenta impor sua própria agenda ao “movimento”, que, na verdade, não tem unidade alguma.
Nessa tentativa de se apropriar dos protestos, a Globo, por exemplo, enxergou um grande protesto nacional contra a PEC 37, que limita ações do Ministério Público, sem qualquer amparo na realidade. E acabou sendo alvo da fúria das ruas, diante de manifestantes que gritavam palavras de ordem contra a “Central Globo de Mentiras”.
Se a Praça Tahir é aqui, o que fica claro é que ela não tem dono. Há quem grite contra a corrupção, contra os gastos da Copa, contra a mídia e até mesmo contra as tarifas de ônibus.
No mundo político, a correnteza das ruas deixa um grande ponto de interrogação. À direita, os que ontem falavam em “baderna” hoje enxergam uma oportunidade de apontar a fúria da massa contra o PT e a presidente Dilma Rousseff. No Facebook, tanto o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso quanto o senador Aécio Neves saudaram o grito de indignação e a perspectiva de um eventual levante popular. No Palácio do Planalto, a presidente Dilma Rousseff limitou-se a elogiar o “caráter democrático” dos protestos. E o ex-presidente Lula jogou a batata quente para o prefeito Fernando Haddad, apostando numa negociação com o Movimento Passe Livre.
Mas o fato é que o poder está cercado. E a polícia, intimidada pela repercussão negativa de suas ações na semana passada. Hoje, há apenas incerteza. E quem tentar se apoderar desse movimento sera rapidamente devorado por ele.
Fonte: Brasil 247
Por Aurélio Munhoz
Carta Capital
Ícone da Sociologia Política Brasileira, o jurista Raymundo Faoro (1925-2003) foi um dos melhores intérpretes da alma nacional nas últimas décadas.
Da sua mente lúcida e privilegiada emergiu uma obra primorosa sobre o patronato político brasileiro: “Os donos de poder” - dois encorpados livros nos quais o autor esmiúça, lastreado por uma sólida base histórico-cultural, a gênese do modus operandi arcaico, autoritário e fisiológico da fauna política verde e amarela.
É possível dizer que o fio condutor do pensamento de Faoro em “Os donos do Poder” foi basicamente o mesmo que o inspirou a cunhar uma frase lapidar sobre a democracia brasileira: “A conquista da cidadania é um processo lento e doloroso”.
Foi este o jeito de dizer aos incautos que não se constroem verdadeiras democracias sobre os escombros de rupturas drásticas, pontuais e indolores. Nem unicamente por meio do voto ou da verborragia desenfreada e contundente.
A cidadania é possível apenas como resultado de uma longa e complexa trajetória histórica, muitas vezes permeada de medo e violência, na qual uma densa rede de fatores interage para produzir as mudanças que a sociedade deseja.
Possivelmente não há frase que traduza melhor o Brasil do recente protesto contra a tarifa do transporte coletivo em São Paulo ou das vexatórias vaias à presidenta Dilma Rousseff na abertura da Copa das Confederações, sábado passado, no agora renomeado e portentoso Estádio Nacional de Brasília Não faltou quem tenha enxergado conexões inexistentes entre as duas manifestações, contrapondo-se aos bordões que identificam a indolência política da Nação, como os manjados “O Brasil é um gigante adormecido” ou “O povo não sabe a força que tem”.
O que Faoro nos ensina sobre estas manifestações, transportando-se sua frase para o Brasil de junho de 2013, são duas coisas essenciais para se compreender o Brasil de hoje. Mas, por favor, entenda-se: elas servem não para desqualificar as citadas manifestações, mas para nos mostrar o quanto nosso entusiasmo com certas iniciativas espontâneas da massa pode levar a avaliações precipitadas e reducionistas sobre a realidade.
A primeira é que, na verdade, o “gigante” já acordou e o está fazendo há décadas, bem antes da ocorrência do protesto sonoro contra o governo Dilma ou da manifestação reprimida pela bestialidade imposta pela PM de São Paulo.
Ele já dava o ar da sua graça nos anos 60, quando o Brasil que pensava reagiu - porém, tardiamente e sem sucesso - à entronização dos homens da caserna no poder, em março de 1964. E prosseguiu assim na década seguinte, apoiado pelos sonhos e as atitudes da moçada que curtia liberdade, mas também rock, Tropicália e uma boa dose de rebeldia, embalados pela célebre máxima “é proibido proibir”.
O mesmo ocorreu nos anos 80, quando milhões de brasileiros pediram (e conseguiram) transformar as Diretas Já no início da abertura política brasileira. E ainda nos anos 90, quando, sob a pressão dos caras-pintadas, o Congresso Nacional mandou o ex-presidente Fernando Collor de Mello de volta para sua mansão, no belo estado de Alagoas.
O corajoso movimento que pede tarifas de ônibus mais baratas país afora merece respeito, aplausos, admiração, apoio e solidariedade, especialmente os inocentes que foram agredidos pela Polícia Militar paulista. Assim como merecem respeito os torcedores que emprestaram suas vozes ao coro de vaias à presidenta Dilma Rousseff .
Mas, com o devido pedido de perdão aos milhões de otimistas e revolucionários virtuais do Facebook, as manifestações de São Paulo e de Brasília estão longe de ser um divisor de águas na cidadania brasileira, uma conjugação única e inédita de fatores histórico-sociais que resultará em uma drástica e urgente ruptura da exploração existente no carcomido modelo político- econômico nacional brasileiro. É puro exagero dizer que o povo, agora unido, finalmente começa a se rebelar nas ruas para cobrar os seus direitos e a cabeça dos poderosos em bandejas de prata.
É preciso muito mais que um conjunto de manifestações contra o transporte coletivo ou os excessos nas obras da Copa para que isto ocorra. É preciso que decorra um longo (e, como sempre, sofrido) processo histórico de construção da nossa consciência política e da cidadania, como nos ensina Faoro em sua segunda lição, para que a exploração seja banida da vida nacional. Não é o que ocorre nos protestos em análise, por mais respeitáveis que sejam.
As manifestações que ocorrem nas ruas do Brasil são muito mais a indicação de um desejo que todos nós acalentamos no nosso imaginário de libertários (o da revolução nas ruas, pelas mãos do povo) do que a tangibilização de um incipiente e irreversível movimento social de caráter nacional destinado a questionar a fundo as mazelas da sociedade brasileira.
Por enquanto, o que as pessoas fazem é protestar com veemência. Mas ainda sem a aspiração de derrubar governos ou prender empresários. E não todo o povo. Nem em todos os cantos. Nem por todas as causas, aliás. A unanimidade em torno da tarifa do transporte coletivo ou dos gastos da Copa do Mundo de 2014 ainda permanece distante no horizonte.
A manifestação de São Paulo foi tão sublime, em seu escopo, quanto o gesto dos milhões de manifestantes que pediram o impeachment do presidente do Senado, Renan Calheiros, em fevereiro deste ano. Mas não pode ser classificada de estopim de uma generalizada e vigorosa rebelião das massas, até porque não ocorreram protestos similares em situações recentes da vida nacional que justificariam uma revoada de indignações país afora.
Por exemplo, os assaltos chancelados pela economia de mercado praticados por muitos supermercados nos recentes aumentos de preços dos alimentos, que são provavelmente os principais responsáveis pela volta da inflação. Não custa dizer o óbvio: que, tanto quanto as tarifas do transporte coletivo, alimentos são produtos essenciais às vidas de todos nós. A despeito disso, porém, não se viu grupos organizados ocupando as ruas em protesto contra os supermercados ou os grandes atacadistas de alimentos. O mesmo ocorreu em relação a outros problemas mais óbvios, graves e contundentes da vida nacional.
Já o coro anti-Dilma foi prova de repúdio aos gastos exorbitantes do contribuinte na construção do Estádio Nacional de Brasília. Tem razão esta gente barulhenta de reclamar do desperdício. A construção de um novo estádio Mané Garrincha jamais poderia mesmo custar 1 bilhão de reais, embora o palco do futebol mais caro da Copa do Mundo de 2014 seja a Fonte Nova, em Salvador, que beira bizarros 2,2 bilhões.
O problema é que, ainda que corretos no mote do seu protesto, os autores das vaias perderam a oportunidade única de também satanizar gente que tem tanta responsabilidade pelas excrescências pré-Copa do Mundo quanto Dilma. Poderiam ter direcionado seu brado de revolta também a Joseph Blatter, presidente da Fifa, que fez vistas grossas aos abusos cometidos não apenas no Estádio Nacional de Brasília, mas em todos os palcos da Copa. Ou a José Maria Marin, presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), igualmente cúmplice dos exacerbados derrames de dinheiro da viúva no antigo estádio Mané Garrincha e comandante de uma das instituições esportivas mais corruptas do planeta.
É de se perguntar ainda por que os autores das vaias, quando frequentam os estádios dos seus times do coração, não dedicam o mesmo tratamento aos quadrilheiros que conduzem muitos dos clubes nacionais - uma gente que tem muito a esconder do Judiciário e que não hesita em perpetrar maracutaias fora dos gramados para manter seus clubes. Nem se constrange de sonegar impostos. Ou de usar sua voracidade para sugar o dinheiro dos governos e das grandes empresas estatais no patrocínio das suas camisas. Ou seja: se Dilma errou na condução dos preparativos para a Copa, está longe de ser a única.
É desejo de todos nós que as manifestações contra os abusos nas tarifas do transporte coletivo e nas obras da Copa do Mundo não só continuem, mas se expandam, e o façam sem a repressão de trogloditas fardados. É preciso, porém, que o foco da revolta popular seja ampliado e direcionado não só a governos (do PT, do PSDB ou de qualquer outro partido), mas também a todos os empresários facínoras - e seus prepostos - que se apropriam do aparato estatal para encher as burras de dinheiro, em todos os campos da atividade econômica, inclusive no esporte. Não apenas no quesito transporte coletivo, portanto.
Acima de tudo, contudo, é preciso compreender que a rebelião popular que alavancará as mudanças que o Brasil deseja não é exatamente um fato novo. Já ocorreu e continua ocorrendo em vários momentos da nossa história. Ainda é muito cedo para se dizer se as manifestações contra a tarifa do ônibus serão suficientes para alavancar mudanças mais significativas, mas o que parece é que - se prosseguir - este movimento só atingirá seus objetivos será possível a longo prazo e, assim mesmo, apenas se adquirir um nível de maturidade política elevado, além de uma amplitude bem maior, envolvendo um conjunto significativo de cidadãos e de instituições representativas da sociedade civil organizada.
Ainda não é o que ocorre na sociedade brasileira de junho de 2013. Não há sinais de engajamento popular realmente massivo e rebelde, em escala nacional, nestas duas causas nobres. Em boa parte, os cidadãos permanecem inertes diante destes problemas e se contentam apenas em acompanhar as notícias pela grande mídia, junto com o lixo cultural despejado por boa parte das rádios, TVs e veículos impressos nacionais.
Os heróicos manifestantes de São Paulo e os barulhentos autores das vaias em Brasília ganharam visibilidade, o que ótimo, mas ainda não são milhões - e, como se viu, são frágeis. A revolução da cidadania que queremos tarda a aparecer no horizonte.
*Aurélio Munhoz é graduado em Jornalismo e em Sociologia. Pós-graduado em Sociologia Política e em Gestão da Comunicação Corporativa, foi repórter, editor e colunista na imprensa do Paraná. É assessor governamental e de comunicação e presidente da ONG de educação ambiental Pense Bicho.
Fonte: Carta Capital
Brasil 247
O “outono brasileiro” não tem dono, nem direção. E quem tentar se apropriar desse “movimento” será rapidamente devorado pela fúria das ruas
Quem são eles? O que querem? O que realmente motiva os milhares de jovens que tomaram as ruas das grandes cidades e, ontem, invadiram o próprio Congresso Nacional?
Serão mesmo os vinte centavos da passagens de ônibus? Ou há algo mais fundo? Há explicações para cada tipo de freguês. Para os petistas, a violência da Polícia Militar de São Paulo potencializou a reação desta segunda-feira. Para os tucanos, o que existe é uma insatisfação difusa contra os rumos do País e a precariedade dos serviços públicos.
Diante de uma catarse coletiva, sem direção e sem lideranças claras, cada grupo tenta impor sua própria agenda ao “movimento”, que, na verdade, não tem unidade alguma.
Nessa tentativa de se apropriar dos protestos, a Globo, por exemplo, enxergou um grande protesto nacional contra a PEC 37, que limita ações do Ministério Público, sem qualquer amparo na realidade. E acabou sendo alvo da fúria das ruas, diante de manifestantes que gritavam palavras de ordem contra a “Central Globo de Mentiras”.
Se a Praça Tahir é aqui, o que fica claro é que ela não tem dono. Há quem grite contra a corrupção, contra os gastos da Copa, contra a mídia e até mesmo contra as tarifas de ônibus.
No mundo político, a correnteza das ruas deixa um grande ponto de interrogação. À direita, os que ontem falavam em “baderna” hoje enxergam uma oportunidade de apontar a fúria da massa contra o PT e a presidente Dilma Rousseff. No Facebook, tanto o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso quanto o senador Aécio Neves saudaram o grito de indignação e a perspectiva de um eventual levante popular. No Palácio do Planalto, a presidente Dilma Rousseff limitou-se a elogiar o “caráter democrático” dos protestos. E o ex-presidente Lula jogou a batata quente para o prefeito Fernando Haddad, apostando numa negociação com o Movimento Passe Livre.
Mas o fato é que o poder está cercado. E a polícia, intimidada pela repercussão negativa de suas ações na semana passada. Hoje, há apenas incerteza. E quem tentar se apoderar desse movimento sera rapidamente devorado por ele.
Fonte: Brasil 247
Saiba mais:
Opinião
Um processo lento e doloroso
Manifestantes no Estádio Mané Garrincha, em Brasília
Por Aurélio Munhoz
Carta Capital
Ícone da Sociologia Política Brasileira, o jurista Raymundo Faoro (1925-2003) foi um dos melhores intérpretes da alma nacional nas últimas décadas.
Da sua mente lúcida e privilegiada emergiu uma obra primorosa sobre o patronato político brasileiro: “Os donos de poder” - dois encorpados livros nos quais o autor esmiúça, lastreado por uma sólida base histórico-cultural, a gênese do modus operandi arcaico, autoritário e fisiológico da fauna política verde e amarela.
É possível dizer que o fio condutor do pensamento de Faoro em “Os donos do Poder” foi basicamente o mesmo que o inspirou a cunhar uma frase lapidar sobre a democracia brasileira: “A conquista da cidadania é um processo lento e doloroso”.
Foi este o jeito de dizer aos incautos que não se constroem verdadeiras democracias sobre os escombros de rupturas drásticas, pontuais e indolores. Nem unicamente por meio do voto ou da verborragia desenfreada e contundente.
A cidadania é possível apenas como resultado de uma longa e complexa trajetória histórica, muitas vezes permeada de medo e violência, na qual uma densa rede de fatores interage para produzir as mudanças que a sociedade deseja.
Possivelmente não há frase que traduza melhor o Brasil do recente protesto contra a tarifa do transporte coletivo em São Paulo ou das vexatórias vaias à presidenta Dilma Rousseff na abertura da Copa das Confederações, sábado passado, no agora renomeado e portentoso Estádio Nacional de Brasília Não faltou quem tenha enxergado conexões inexistentes entre as duas manifestações, contrapondo-se aos bordões que identificam a indolência política da Nação, como os manjados “O Brasil é um gigante adormecido” ou “O povo não sabe a força que tem”.
O que Faoro nos ensina sobre estas manifestações, transportando-se sua frase para o Brasil de junho de 2013, são duas coisas essenciais para se compreender o Brasil de hoje. Mas, por favor, entenda-se: elas servem não para desqualificar as citadas manifestações, mas para nos mostrar o quanto nosso entusiasmo com certas iniciativas espontâneas da massa pode levar a avaliações precipitadas e reducionistas sobre a realidade.
A primeira é que, na verdade, o “gigante” já acordou e o está fazendo há décadas, bem antes da ocorrência do protesto sonoro contra o governo Dilma ou da manifestação reprimida pela bestialidade imposta pela PM de São Paulo.
Ele já dava o ar da sua graça nos anos 60, quando o Brasil que pensava reagiu - porém, tardiamente e sem sucesso - à entronização dos homens da caserna no poder, em março de 1964. E prosseguiu assim na década seguinte, apoiado pelos sonhos e as atitudes da moçada que curtia liberdade, mas também rock, Tropicália e uma boa dose de rebeldia, embalados pela célebre máxima “é proibido proibir”.
O mesmo ocorreu nos anos 80, quando milhões de brasileiros pediram (e conseguiram) transformar as Diretas Já no início da abertura política brasileira. E ainda nos anos 90, quando, sob a pressão dos caras-pintadas, o Congresso Nacional mandou o ex-presidente Fernando Collor de Mello de volta para sua mansão, no belo estado de Alagoas.
O corajoso movimento que pede tarifas de ônibus mais baratas país afora merece respeito, aplausos, admiração, apoio e solidariedade, especialmente os inocentes que foram agredidos pela Polícia Militar paulista. Assim como merecem respeito os torcedores que emprestaram suas vozes ao coro de vaias à presidenta Dilma Rousseff .
Mas, com o devido pedido de perdão aos milhões de otimistas e revolucionários virtuais do Facebook, as manifestações de São Paulo e de Brasília estão longe de ser um divisor de águas na cidadania brasileira, uma conjugação única e inédita de fatores histórico-sociais que resultará em uma drástica e urgente ruptura da exploração existente no carcomido modelo político- econômico nacional brasileiro. É puro exagero dizer que o povo, agora unido, finalmente começa a se rebelar nas ruas para cobrar os seus direitos e a cabeça dos poderosos em bandejas de prata.
É preciso muito mais que um conjunto de manifestações contra o transporte coletivo ou os excessos nas obras da Copa para que isto ocorra. É preciso que decorra um longo (e, como sempre, sofrido) processo histórico de construção da nossa consciência política e da cidadania, como nos ensina Faoro em sua segunda lição, para que a exploração seja banida da vida nacional. Não é o que ocorre nos protestos em análise, por mais respeitáveis que sejam.
As manifestações que ocorrem nas ruas do Brasil são muito mais a indicação de um desejo que todos nós acalentamos no nosso imaginário de libertários (o da revolução nas ruas, pelas mãos do povo) do que a tangibilização de um incipiente e irreversível movimento social de caráter nacional destinado a questionar a fundo as mazelas da sociedade brasileira.
Por enquanto, o que as pessoas fazem é protestar com veemência. Mas ainda sem a aspiração de derrubar governos ou prender empresários. E não todo o povo. Nem em todos os cantos. Nem por todas as causas, aliás. A unanimidade em torno da tarifa do transporte coletivo ou dos gastos da Copa do Mundo de 2014 ainda permanece distante no horizonte.
A manifestação de São Paulo foi tão sublime, em seu escopo, quanto o gesto dos milhões de manifestantes que pediram o impeachment do presidente do Senado, Renan Calheiros, em fevereiro deste ano. Mas não pode ser classificada de estopim de uma generalizada e vigorosa rebelião das massas, até porque não ocorreram protestos similares em situações recentes da vida nacional que justificariam uma revoada de indignações país afora.
Por exemplo, os assaltos chancelados pela economia de mercado praticados por muitos supermercados nos recentes aumentos de preços dos alimentos, que são provavelmente os principais responsáveis pela volta da inflação. Não custa dizer o óbvio: que, tanto quanto as tarifas do transporte coletivo, alimentos são produtos essenciais às vidas de todos nós. A despeito disso, porém, não se viu grupos organizados ocupando as ruas em protesto contra os supermercados ou os grandes atacadistas de alimentos. O mesmo ocorreu em relação a outros problemas mais óbvios, graves e contundentes da vida nacional.
Já o coro anti-Dilma foi prova de repúdio aos gastos exorbitantes do contribuinte na construção do Estádio Nacional de Brasília. Tem razão esta gente barulhenta de reclamar do desperdício. A construção de um novo estádio Mané Garrincha jamais poderia mesmo custar 1 bilhão de reais, embora o palco do futebol mais caro da Copa do Mundo de 2014 seja a Fonte Nova, em Salvador, que beira bizarros 2,2 bilhões.
O problema é que, ainda que corretos no mote do seu protesto, os autores das vaias perderam a oportunidade única de também satanizar gente que tem tanta responsabilidade pelas excrescências pré-Copa do Mundo quanto Dilma. Poderiam ter direcionado seu brado de revolta também a Joseph Blatter, presidente da Fifa, que fez vistas grossas aos abusos cometidos não apenas no Estádio Nacional de Brasília, mas em todos os palcos da Copa. Ou a José Maria Marin, presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), igualmente cúmplice dos exacerbados derrames de dinheiro da viúva no antigo estádio Mané Garrincha e comandante de uma das instituições esportivas mais corruptas do planeta.
É de se perguntar ainda por que os autores das vaias, quando frequentam os estádios dos seus times do coração, não dedicam o mesmo tratamento aos quadrilheiros que conduzem muitos dos clubes nacionais - uma gente que tem muito a esconder do Judiciário e que não hesita em perpetrar maracutaias fora dos gramados para manter seus clubes. Nem se constrange de sonegar impostos. Ou de usar sua voracidade para sugar o dinheiro dos governos e das grandes empresas estatais no patrocínio das suas camisas. Ou seja: se Dilma errou na condução dos preparativos para a Copa, está longe de ser a única.
É desejo de todos nós que as manifestações contra os abusos nas tarifas do transporte coletivo e nas obras da Copa do Mundo não só continuem, mas se expandam, e o façam sem a repressão de trogloditas fardados. É preciso, porém, que o foco da revolta popular seja ampliado e direcionado não só a governos (do PT, do PSDB ou de qualquer outro partido), mas também a todos os empresários facínoras - e seus prepostos - que se apropriam do aparato estatal para encher as burras de dinheiro, em todos os campos da atividade econômica, inclusive no esporte. Não apenas no quesito transporte coletivo, portanto.
Acima de tudo, contudo, é preciso compreender que a rebelião popular que alavancará as mudanças que o Brasil deseja não é exatamente um fato novo. Já ocorreu e continua ocorrendo em vários momentos da nossa história. Ainda é muito cedo para se dizer se as manifestações contra a tarifa do ônibus serão suficientes para alavancar mudanças mais significativas, mas o que parece é que - se prosseguir - este movimento só atingirá seus objetivos será possível a longo prazo e, assim mesmo, apenas se adquirir um nível de maturidade política elevado, além de uma amplitude bem maior, envolvendo um conjunto significativo de cidadãos e de instituições representativas da sociedade civil organizada.
Ainda não é o que ocorre na sociedade brasileira de junho de 2013. Não há sinais de engajamento popular realmente massivo e rebelde, em escala nacional, nestas duas causas nobres. Em boa parte, os cidadãos permanecem inertes diante destes problemas e se contentam apenas em acompanhar as notícias pela grande mídia, junto com o lixo cultural despejado por boa parte das rádios, TVs e veículos impressos nacionais.
Os heróicos manifestantes de São Paulo e os barulhentos autores das vaias em Brasília ganharam visibilidade, o que ótimo, mas ainda não são milhões - e, como se viu, são frágeis. A revolução da cidadania que queremos tarda a aparecer no horizonte.
*Aurélio Munhoz é graduado em Jornalismo e em Sociologia. Pós-graduado em Sociologia Política e em Gestão da Comunicação Corporativa, foi repórter, editor e colunista na imprensa do Paraná. É assessor governamental e de comunicação e presidente da ONG de educação ambiental Pense Bicho.
Fonte: Carta Capital
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