O problema de moradia de juízes e promotores de justiça está garantido. Agora podemos debater a necessidade das demais pessoas
ALUGUEL SOCIAL
Por Antonio Cavalcante Filho e Vilson Nery
Em recente decisão o
Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou a Resolução CNJ
nº 199, regulamentando a concessão do auxílio-moradia aos magistrados
brasileiros. A norma cumpre decisão do Supremo Tribunal Federal (STF),
que determinou ao CNJ, por meio de medida cautelar, que regulamentasse a
ajuda de custo prevista na Lei Orgânica da Magistratura Nacional
(Loman).
Deste modo o pagamento do benefício começou a ser obrigatório desde
15 de setembro de 2014, e é pago ao magistrado mesmo que este resida em
casa própria na comarca onde jurisdiciona. O valor do auxílio não será
superior àquele fixado para ministros do STF, atualmente em R$ 4.377,73 e
nem inferior ao auxílio-moradia pago aos integrantes do Ministério
Público.
Bem, o problema de moradia de juízes e promotores de justiça está
garantido, de modo que podemos debater agora a necessidade das demais
pessoas, notadamente famílias miseráveis e vulneráveis, ao exercício
pleno do direito de ter um teto para si.
Parcela importante de pessoas desabrigadas está nesta situação por
alguma decisão de juízes de direito, por vezes com base em pareceres do
ministério público. Trata-se de cidadãos desalojados de áreas de risco,
quadrantes de proteção ambiental, e demandados em ações de reintegração
de posse, quando há a proteção judicial à ganância.
Em Mato Grosso foi criada a Vara de Direito Agrário, e esperava-se
pela melhor qualificação e capacitação de juízes, promotores,
servidores, engenheiros e peritos em geral, na temática agrária. O
conflito vai além de um título de propriedade precário ou não. Mato
Grosso tem regiões onde as terras têm “segundo andar”, com sobreposição
de divisas e existência de mais de um documento da mesma área.
Infelizmente a Vara Especializada não se “especializou” e tem a mesma
função do tal “Comitê de Conflito Agrário”, da Casa Civil do Governo:
expulsar pessoas que exercem posse de áreas urbanas e rurais,
deixando-as ao relento.
Em cidades mais humanizadas, onde as relações sociais (e as decisões
judiciais) são produzidas por pessoas mais preparadas, já existe o
chamado Aluguel Social. Trata-se de um auxílio fornecido a pessoas
carentes, igual ao auxílio de magistrados e promotores, só que em valor
menor. São direcionados a pessoas vítimas de catástrofes naturais
(deslizamento, chuvas em excesso, alagamentos etc.) e a pessoas
despejadas ou que tenham perdido a sua posse em razão de alguma decisão
judicial.
O aluguel social é uma solução provisória, até que a família
beneficiária possa se estabelecer ou então o município onde reside
consiga fazer o cadastro em programas habitacionais como o “Minha Casa
Minha Vida” por exemplo.
Em Mato Grosso existem pelo menos três fundos que podem auxiliar na
instituição do Aluguel Social. O mais importante deles é o Fundo de
Transporte e Habitação – FETHAB, criado por meio da Lei nº 7263, de 27
de março de 2000. Há o Fundo Estadual de Moradia Popular, instituído
graças à Lei nº 6177, de 25 de janeiro de 1993, e por fim temos o Fundo
Estadual de Habitação, criado pela lei estadual nº 8940, de 24 de julho
de 2008.
As ações de reintegração de posse geralmente são movidas por
empreiteiras, construtoras e latifundiários, interessados em defender
seus lucros e um direito que a Constituição Federal veicula no artigo
5º, entre os direitos e garantias individuais. Mas o direito à moradia
está ali ao lado no mesmo espaço topográfico da Constituição, no artigo
6º, sendo um direito social de plasmada grandeza. Além do quê, um dos
fundamentos de existência da República Federativa do Brasil, a dignidade
da pessoa humana, está escrito logo no artigo 1º da Carta Magna, e
inaugura os princípios e garantias constitucionais.
Logo, nossas cidades precisam instituir o aluguel social, como
benefício temporário para o pagamento do aluguel, podendo ser repassado
pelas prefeituras ou ainda pelo Governo do Estado para as famílias que
não têm condições de pagar um aluguel ou que precisam ser retiradas de
áreas de risco.
À toda evidência deve-se adotar os cuidados de cadastrar as famílias
para que o benefício não seja pago mais de uma vez ao mesmo usuário,
prestigiando o princípio da boa-fé.
A própria decisão judicial que retira as pessoas de suas casas ou áreas rurais deveria parametrizar o aluguel social.
Para operacionalizar o benefício, o interessado deveria procurar a
prefeitura ou o CRAS (Centro de Referência em Assistência Social)
verificando os requisitos para o cadastro. Após a avaliação feita por um
assistente social, aquelas famílias cuja situação socioeconômica
recomende, seriam cadastradas para receber o benefício.
A sociedade brasileira, por meio dos contribuintes, já se solidarizou
com magistrados e promotores, custeando o auxílio-moradia a esses
profissionais. Descabe aqui dizer da justeza ou não, de tal medida. Mas é
necessário que a situação dos vulneráveis, vítimas de decisões
judiciais, seja tratada com cuidado, para que não fiquem ao relento. Que
se dê a eles o benefício de aluguel social (ou outro nome) a lhe
preservar a dignidade e o direito de morar.
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