segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

O golpismo e a última pesquisa Datafolha


Será portanto abastecido desse tipo de desinformação que muito provavelmente milhares de pessoas tomem as ruas no próximo dia 15 de março para pedir o impeachment de Dilma Roussef. A dúvida que fica é se querem entregar o posto a Michel Temer ou se nem pensaram sobre isso. 





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O impeachment é um processo que qualquer deputado pode pedir à Mesa da Câmara baseado em parecer jurídico? Sim. Porém, como o próprio Ives Gandra Martins reconheceu no parecer que fez sob encomenda de um dos diretores do Instituto FHC, publicado na Folha de S.Paulo e responsável por levar o tema novamente para o fogo alto, a conclusão é sempre muito mais política do que jurídica.

E é com essa perspectiva que todo um cenário favorável ao pedido da derrubada de Dilma se articula através de um golpe travestido de impeachment. É um golpe dado no tapetão. Se depois absolvido, como foi Collor, daí paciência. O objetivo terá sido alcançado.

Como se cria esse cenário, quem é o principal estimulador e proprietário do tapete? É complexo, mas o maior responsável é aquilo que se chama “grande mídia”.

Uma pesquisa divulgada neste domingo, revelou o estrago que a forma de informar praticada por esses oligopólios faz na cabeça do cidadão comum.

Segundo a pesquisa, 81% dos entrevistados acredita que a inflação irá subir. De onde vem essa percepção profética e catastrofista? Todo mundo agora é versado em economia e futurologia? Não. Quem fomenta esse clima de pessimismo é a grande mídia. A campanha alarmista da subida de taxas, tarifas e impostos é intensa, porém nem sempre verdadeira e completa.

O IPTU não iria subir para todos em São Paulo (só para uma minoria privilegiada ao passo que para outros haveria até redução) mas isso nunca era informado nos telejornais. Criar pânico é uma forma de terrorismo executado à perfeição por esses veículos. Vide os Datenas da vida e suas bem sucedidas carreiras.

Martelar o tema corrupção exaustivamente associando-o exclusivamente a um único partido e à estatal fazendo com que o problema seja visto, ao lado da saúde, como o que mais preocupa os brasileiros e que quase a metade (47%) das pessoas avaliem Dilma como “desonesta” sem haver ainda nenhuma prova de que ela seja mentora ou mesmo beneficiária é resultado dessa maquinação.

Não estou defendendo Dilma, o PT, ou alegando inocência total no caso. Há fortes indícios de que os desvios se confirmem. Mas a disparidade de tratamento é absurda e visivelmente manipuladora. A “formadora de opinião do brasileiro médio” tem veiculado obsessivamente apenas o que atinge a presidente. Nada se vê ou ouve acerca da Alstom, do cartel do metrô paulista, da irresponsabilidade na Sabesp. Neste último exemplo, a massa foi levada a acreditar que a culpa é da falta de chuvas.

Por tratar-se de um recurso natural e vital para a sobrevivência, penso que a maneira como governo do estado de São Paulo e a Sabesp trataram a questão da água deveria ser considerada crime contra a humanidade. Isso é muito mais sério e de consequências muito mais graves do que ficar noticiando que o dólar subiu, a bolsa de valores caiu, as ações X desvalorizaram. Quem tem esses investimentos? Que implicação isso tem na vida da imensa maioria? Nenhuma, só aduba o solo propiciamente ao que se quer plantar.

Ainda segundo a pesquisa, 60% dos paulistas concordam com a implantação do rodízio no abastecimento de água. Mas antes do povo acatar bovinamente e se submeter a mais um sacrifício, foi informado qual o percentual de água potável é destinada ao consumo direto e quanto é direcionada para o agronegócio, a indústria e a mineração? Ou preparou-se um terreno de modo a não causar uma revolta popular contra quem é do time da mídia?

Dirão que exagero, mas a chamada grande mídia exerce hoje um papel idêntico àquele que a igreja católica teve durante o fascismo na Italia. Deseja manter tudo como está de modo a ser a reconhecida como “religião única” e ganhar seu “estado” em forma de concessões.

Ela sente-se ameaçada pela possibilidade de uma regulação que irá minar sua força e por isso hoje articula a saída da atual governante. Ninguém quer perder o que já tem e é isso que é explorado através dessa prática. O povo sentir-se sob ameaça facilita que personagens como Mussolini se sobressaiam e ganhem voz.

Será portanto abastecido desse tipo de desinformação que muito provavelmente milhares de pessoas tomem as ruas no próximo dia 15 de março para pedir o impeachment de Dilma Roussef. A dúvida que fica é se querem entregar o posto a Michel Temer ou se nem pensaram sobre isso.

 
Saiba mais
 
Relatividade e racionalidade 
 
 
 
 
Por  GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO
 
Interessante notar como os textos resumidos nos têm chamado mais atenção que aqueles produzidos com maior racionalidade e profundidade. 

A vida corrida que levamos, sem tempo para quase nada, a não ser para a busca de sobrevivência própria e dos familiares, nos relega à inferioridade intelectual. 

Com a teoria da relatividade, Einstein recria a dialética e a necessidade da reflexão constante, não só na física, mas igualmente em todos os ramos do conhecimento. 

O ’resuminho’ ficou com os dias contados. Tanto isso é verdade, que a sociologia jurídica alemã avançou, ainda antes da segunda grande guerra, no descobrimento da essência do debate político antecedente ao resultado positivado, ou seja, da lei. 

Posteriormente, tal relatividade passou a ser inquietação da filosofia do Direito, tendo como expoente o pensador alemão Robert Alexy, com a sua renomada teoria da ponderação. 

Hoje, por ironia tecnológica, até pela facilidade da internet, lemos o resumo do resumo e ficamos satisfeitos por estarmos ’bem’ informados. 

O tempo, de aliado, virou vilão num mundo sem peia e freio. O ócio reflexivo não nos é permitido. As manchetes falam pelo conteúdo, apesar de que nem sempre o retratam com fidelidade. 

De relatividade, passamos ao absoluto vindicado pelo rolo compressor da informação de massa, deseducadora e mentirosa, serva fiel de quem lhe paga as contas e farras. Inquérito de polícia virou peça acusatória. 

Denúncia virou fato subsumido à decisão final da verdade, processual ou não. Do necessário trânsito em julgado, somente remotas lembranças de um sistema de justiça que já teve seu momento e tempo. 

Somado a isso, e já tivemos a oportunidade de expor neste espaço, temos a falta de regulamentação das atividades das bibliotecas virtuais, em especial do Google. 

O efeito dessa libertinagem é devastador, como, por exemplo, o direito ao esquecimento. 

Apesar de ter sido debatido recentemente na comunidade jurídica europeia, com o apoio integral pela sua incidência sob a perspectiva dos direitos humanos, com a ferramenta de consulta universal, esquecer algo sobre alguém, ainda que inocente,virou poeira ou fumaça cibernética. 

Como voltar no tempo nessa temática? Como ensinar, apesar dos ’resuminhos’, a relatividade das coisas e a necessária ponderação antes do julgamento da ’mass media’? 

Como o estado mental das pessoas, projetado atualmente pela busca de facilidades, resumos, manchetes etc, pode ser trabalhado em busca de uma maior dialética política e social? 
Não tenho as respostas; as daremos considerando a relatividade de tudo e o pensamento reflexivo de cada qual. 

Aliás, perguntar não ofende - já amou a teu próximo como a si mesmo? Já julgou a teu vizinho com a medida e peso com que julgas seu filho? -.Cuidado, não basta a igreja e a confissão, o buraco da agulha é muito pequeno para a pata do camelo. 

É por aí...

GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO é juiz de Direito  em Cuiabá.
 


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