Será portanto abastecido desse tipo de desinformação que muito provavelmente milhares de pessoas tomem as ruas no próximo dia 15 de março para pedir o impeachment de Dilma Roussef. A dúvida que fica é se querem entregar o posto a Michel Temer ou se nem pensaram sobre isso.
O impeachment é um processo que qualquer deputado pode pedir à Mesa
da Câmara baseado em parecer jurídico? Sim. Porém, como o próprio Ives
Gandra Martins reconheceu no parecer que fez sob encomenda de um dos
diretores do Instituto FHC, publicado na Folha de S.Paulo e responsável
por levar o tema novamente para o fogo alto, a conclusão é sempre muito
mais política do que jurídica.
E é com essa perspectiva que todo um cenário favorável ao pedido da
derrubada de Dilma se articula através de um golpe travestido de
impeachment. É um golpe dado no tapetão. Se depois absolvido, como foi
Collor, daí paciência. O objetivo terá sido alcançado.
Como se cria esse cenário, quem é o principal estimulador e
proprietário do tapete? É complexo, mas o maior responsável é aquilo que
se chama “grande mídia”.
Uma pesquisa divulgada neste domingo, revelou o estrago que a forma
de informar praticada por esses oligopólios faz na cabeça do cidadão
comum.
Segundo a pesquisa, 81% dos entrevistados acredita que a inflação irá
subir. De onde vem essa percepção profética e catastrofista? Todo mundo
agora é versado em economia e futurologia? Não. Quem fomenta esse clima
de pessimismo é a grande mídia. A campanha alarmista da subida de
taxas, tarifas e impostos é intensa, porém nem sempre verdadeira e
completa.
O IPTU não iria subir para todos em São Paulo (só para uma minoria
privilegiada ao passo que para outros haveria até redução) mas isso
nunca era informado nos telejornais. Criar pânico é uma forma de
terrorismo executado à perfeição por esses veículos. Vide os Datenas da
vida e suas bem sucedidas carreiras.
Martelar o tema corrupção exaustivamente associando-o exclusivamente a
um único partido e à estatal fazendo com que o problema seja visto, ao
lado da saúde, como o que mais preocupa os brasileiros e que quase a
metade (47%) das pessoas avaliem Dilma como “desonesta” sem haver ainda
nenhuma prova de que ela seja mentora ou mesmo beneficiária é resultado
dessa maquinação.
Não estou defendendo Dilma, o PT, ou alegando inocência total no
caso. Há fortes indícios de que os desvios se confirmem. Mas a
disparidade de tratamento é absurda e visivelmente manipuladora. A
“formadora de opinião do brasileiro médio” tem veiculado obsessivamente
apenas o que atinge a presidente. Nada se vê ou ouve acerca da Alstom,
do cartel do metrô paulista, da irresponsabilidade na Sabesp. Neste
último exemplo, a massa foi levada a acreditar que a culpa é da falta de
chuvas.
Por tratar-se de um recurso natural e vital para a sobrevivência,
penso que a maneira como governo do estado de São Paulo e a Sabesp
trataram a questão da água deveria ser considerada crime contra a
humanidade. Isso é muito mais sério e de consequências muito mais graves
do que ficar noticiando que o dólar subiu, a bolsa de valores caiu, as
ações X desvalorizaram. Quem tem esses investimentos? Que implicação
isso tem na vida da imensa maioria? Nenhuma, só aduba o solo
propiciamente ao que se quer plantar.
Ainda segundo a pesquisa, 60% dos paulistas concordam com a
implantação do rodízio no abastecimento de água. Mas antes do povo
acatar bovinamente e se submeter a mais um sacrifício, foi informado
qual o percentual de água potável é destinada ao consumo direto e quanto
é direcionada para o agronegócio, a indústria e a mineração? Ou
preparou-se um terreno de modo a não causar uma revolta popular contra
quem é do time da mídia?
Dirão que exagero, mas a chamada grande mídia exerce hoje um papel
idêntico àquele que a igreja católica teve durante o fascismo na Italia.
Deseja manter tudo como está de modo a ser a reconhecida como “religião
única” e ganhar seu “estado” em forma de concessões.
Ela sente-se ameaçada pela possibilidade de uma regulação que irá
minar sua força e por isso hoje articula a saída da atual governante.
Ninguém quer perder o que já tem e é isso que é explorado através dessa
prática. O povo sentir-se sob ameaça facilita que personagens como
Mussolini se sobressaiam e ganhem voz.
Será portanto abastecido desse tipo de desinformação que muito
provavelmente milhares de pessoas tomem as ruas no próximo dia 15 de
março para pedir o impeachment de Dilma Roussef. A dúvida que fica é se
querem entregar o posto a Michel Temer ou se nem pensaram sobre isso.
Saiba mais
Relatividade e racionalidade
Por GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO
Interessante notar como os textos resumidos nos têm chamado mais
atenção que aqueles produzidos com maior racionalidade e profundidade.
A vida corrida que levamos, sem tempo para quase nada, a não ser para a busca de sobrevivência própria e dos familiares, nos relega à inferioridade intelectual.
Com a teoria da relatividade, Einstein recria a dialética e a necessidade da reflexão constante, não só na física, mas igualmente em todos os ramos do conhecimento.
O ’resuminho’ ficou com os dias contados. Tanto isso é verdade, que a sociologia jurídica alemã avançou, ainda antes da segunda grande guerra, no descobrimento da essência do debate político antecedente ao resultado positivado, ou seja, da lei.
Posteriormente, tal relatividade passou a ser inquietação da filosofia do Direito, tendo como expoente o pensador alemão Robert Alexy, com a sua renomada teoria da ponderação.
Hoje, por ironia tecnológica, até pela facilidade da internet, lemos o resumo do resumo e ficamos satisfeitos por estarmos ’bem’ informados.
O tempo, de aliado, virou vilão num mundo sem peia e freio. O ócio reflexivo não nos é permitido. As manchetes falam pelo conteúdo, apesar de que nem sempre o retratam com fidelidade.
De relatividade, passamos ao absoluto vindicado pelo rolo compressor da informação de massa, deseducadora e mentirosa, serva fiel de quem lhe paga as contas e farras. Inquérito de polícia virou peça acusatória.
Denúncia virou fato subsumido à decisão final da verdade, processual ou não. Do necessário trânsito em julgado, somente remotas lembranças de um sistema de justiça que já teve seu momento e tempo.
Somado a isso, e já tivemos a oportunidade de expor neste espaço, temos a falta de regulamentação das atividades das bibliotecas virtuais, em especial do Google.
O efeito dessa libertinagem é devastador, como, por exemplo, o direito ao esquecimento.
Apesar de ter sido debatido recentemente na comunidade jurídica europeia, com o apoio integral pela sua incidência sob a perspectiva dos direitos humanos, com a ferramenta de consulta universal, esquecer algo sobre alguém, ainda que inocente,virou poeira ou fumaça cibernética.
Como voltar no tempo nessa temática? Como ensinar, apesar dos ’resuminhos’, a relatividade das coisas e a necessária ponderação antes do julgamento da ’mass media’?
Como o estado mental das pessoas, projetado atualmente pela busca de facilidades, resumos, manchetes etc, pode ser trabalhado em busca de uma maior dialética política e social?
Não tenho as respostas; as daremos considerando a relatividade de tudo e o pensamento reflexivo de cada qual.
Aliás, perguntar não ofende - já amou a teu próximo como a si mesmo? Já julgou a teu vizinho com a medida e peso com que julgas seu filho? -.Cuidado, não basta a igreja e a confissão, o buraco da agulha é muito pequeno para a pata do camelo.
É por aí...
GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO é juiz de Direito em Cuiabá.
A vida corrida que levamos, sem tempo para quase nada, a não ser para a busca de sobrevivência própria e dos familiares, nos relega à inferioridade intelectual.
Com a teoria da relatividade, Einstein recria a dialética e a necessidade da reflexão constante, não só na física, mas igualmente em todos os ramos do conhecimento.
O ’resuminho’ ficou com os dias contados. Tanto isso é verdade, que a sociologia jurídica alemã avançou, ainda antes da segunda grande guerra, no descobrimento da essência do debate político antecedente ao resultado positivado, ou seja, da lei.
Posteriormente, tal relatividade passou a ser inquietação da filosofia do Direito, tendo como expoente o pensador alemão Robert Alexy, com a sua renomada teoria da ponderação.
Hoje, por ironia tecnológica, até pela facilidade da internet, lemos o resumo do resumo e ficamos satisfeitos por estarmos ’bem’ informados.
O tempo, de aliado, virou vilão num mundo sem peia e freio. O ócio reflexivo não nos é permitido. As manchetes falam pelo conteúdo, apesar de que nem sempre o retratam com fidelidade.
De relatividade, passamos ao absoluto vindicado pelo rolo compressor da informação de massa, deseducadora e mentirosa, serva fiel de quem lhe paga as contas e farras. Inquérito de polícia virou peça acusatória.
Denúncia virou fato subsumido à decisão final da verdade, processual ou não. Do necessário trânsito em julgado, somente remotas lembranças de um sistema de justiça que já teve seu momento e tempo.
Somado a isso, e já tivemos a oportunidade de expor neste espaço, temos a falta de regulamentação das atividades das bibliotecas virtuais, em especial do Google.
O efeito dessa libertinagem é devastador, como, por exemplo, o direito ao esquecimento.
Apesar de ter sido debatido recentemente na comunidade jurídica europeia, com o apoio integral pela sua incidência sob a perspectiva dos direitos humanos, com a ferramenta de consulta universal, esquecer algo sobre alguém, ainda que inocente,virou poeira ou fumaça cibernética.
Como voltar no tempo nessa temática? Como ensinar, apesar dos ’resuminhos’, a relatividade das coisas e a necessária ponderação antes do julgamento da ’mass media’?
Como o estado mental das pessoas, projetado atualmente pela busca de facilidades, resumos, manchetes etc, pode ser trabalhado em busca de uma maior dialética política e social?
Não tenho as respostas; as daremos considerando a relatividade de tudo e o pensamento reflexivo de cada qual.
Aliás, perguntar não ofende - já amou a teu próximo como a si mesmo? Já julgou a teu vizinho com a medida e peso com que julgas seu filho? -.Cuidado, não basta a igreja e a confissão, o buraco da agulha é muito pequeno para a pata do camelo.
É por aí...
GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO é juiz de Direito em Cuiabá.
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