Quem for às ruas no dia 15 vai estar vomitando seu ódio com o patrocínio de empresas e políticos que querem tirar o foco da lista de políticos da Lava Jato
Impeachment S.A.: uma empresa de capital aberto e mente fechada
Por Antonio Lassance (*)
Que ninguém se engane ou se faça de
desavisado. As organizações Impeachment S.A. - uma sociedade mais ou
menos anônima - está aí não só para promover eventos, mas, sobretudo,
para se capitalizar.
Quem quiser ir
às ruas no dia 15, com nariz de palhaço e cartazes pró-impeachment, vai
estar batendo o bumbo e vomitando seu ódio com o patrocínio de empresas e
políticos que querem bombar o desgaste de um governo por razões nada
republicanas.
Algumas
das organizações mais ativas na mobilização das manifestações do dia 15
de março são um negócio patrocinado pela oposição partidária e
empresarial, com os préstimos sempre valiosos do cartel midiático, que
dá uma boa força para a sua divulgação.
Tal
e qual nos bons tempos do golpismo dos anos 1950 e 1960, trabalhar pela
derrubada de um governo é, em parte, ideologia, mas tem seu lado
'business'. Dá dinheiro.
Os grupos
que organizam os protestos e clamam pelo impeachment começam como rede
social, mas crescem com apoio partidário e empresarial.
Nenhum
desses grupos deixa de pedir, publicamente, recursos para financiar seu
'trabalho' - seria melhor dizerem 'seu negócio'. Até aí, nada de mais.
Porém,
o grosso das contribuições que algumas dessas pessoas recebem não são
públicas e nem de pessoas que dão 5, 10, 100 reais. Hoje, a maior parte
da grana que rola em prol do impeachment de Dilma tem outra origem.
Empresários
em pelo menos três estados (São Paulo, Pernambuco e Paraná) relatam ter
recebido telefonemas pedindo dinheiro para a organização dos atos do
dia 15. A fonte da informação são advogados consultados para saber da
legalidade da doação e possíveis implicações jurídicas para as empresas.
Em
um dos casos, o pedido não foi feito diretamente por alguém ligado aos
perfis de redes sociais que convocam o ato, mas por um deputado de
oposição, com o seguinte argumento: "precisamos ajudar esse pessoal que
está se mobilizando para tirar esses vagabundos do poder".
O
curioso é que o deputado oposicionista faz parte do seleto grupo de
parlamentares que teve o privilégio de contar, entre seus financiadores
de campanha, com empresas citadas na Lava Jato. Portanto, pelo critério
da Impeachment S.A., o deputado amigo é, de fato, um honorável
vagabundo.
É bom lembrar que quase a metade dos nomes da famigerada lista do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa, estava ligada às campanhas de Aécio ou Marina Silva
As
empreiteiras pegas na Operação Lava Jato doaram quase meio bilhão de
reais aos políticos e aos partidos com as maiores bancadas no Congresso,
o que inclui os de oposição, como PSDB e DEM. Será que alguém vai se
lembrar disso no dia 15?
Como o negócio funciona e prospera
A
Impeachment S.A. virou franquia. Uma pessoa ou um pequeno grupo monta
um perfil, sai à cata de adesões e seguidores e cria memes para serem
espalhadas na rede. Com alguma sorte, essa 'produção' se torna viral -
pronto, a fórmula de sucesso deu resultado.
Os
grupos que organizam o protesto do dia 15 são muitos. Cada estado tem
um ativista ou grupo de maior proeminência. Eles hoje disputam o mercado
do protesto de forma cada vez mais empresarial. Com naturalidade, eles
são absolutamente francos em dizer que o capitalismo é seu sonho de
consumo. Qualquer maneira de ganhar dinheiro vale a pena.
Dependendo
da força de adesão de cada perfil, o criador usa sua lista de
seguidores, com ou sem nariz de palhaço, como portfólio para negociar
patrocínio privado.
Quanto mais o
impeachment se tornar um oba-oba, do tipo "atrás do trio elétrico só não
vai quem já morreu", tanto melhor para o negócio de derrubar a
presidenta.
A
busca de um mercado do protesto veio a partir do momento em que esses
mascates do impeachment bateram às portas dos partidos, como o PSDB, o
DEM e o PPS.
Pelo menos no caso de
Pernambuco, houve tentativas também junto ao PSB, cujo ex-candidato à
presidência, Eduardo Campos, também consta citado na delação de Paulo
Roberto Costa. O PSB hoje abriga, entre outros, 'socialistas' da estirpe
do antigo PFL, como os renomados Heráclito Fortes (PI) e Paulo
Bornhausen (SC)
Alguns
dos ativistas da Impeachment S.A., de espírito empreendedor mais
aguçado, pegaram a lista de financiadores de campanhas de políticos da
oposição com os quais mantêm contato e foram pedir ajuda para
conseguir abrir portas em empresas dispostas a financiar a campanha do
impeachment.
Os políticos
tucanos, ao que parece, têm sido os mais empenhados em redirecionar os
pedidos de patrocínio privado para o universo das empresas.
Publicamente,
só para variar, os tucanos definiram, com o perdão ao vocábulo
'definir', que apoiam o ato pró-impeachment, mas são contra o
impeachment. Hein? Precisamos de pelo menos uns dois minutos para
entender o raciocínio e pegar algum tucano pelo colarinho branco,
escondido atrás de mais esse muro.
Os
tucanos querem o protesto, torcem pelo protesto, ajudam a patrocinar o
protesto, mas fingem que não têm nada a ver com isso. Faz sentido - e
ainda tem gente que acredita que eles realmente não trabalham pelo
impeachment.
Por que 15 de março?
A própria data do protesto foi calculada politicamente, pela Impeachment S.A., com um propósito evidente.
O
alvo do protesto é a presidenta Dilma Rousseff, convenhamos, justamente
no mês em que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, divulgará
a lista dos políticos envolvidos no escândalo. Mais exatamente, na
semana seguinte àquela em que a lista de políticos será tornada pública.
Os
revoltontos do dia 15 pedirão o impeachment de Dilma, que sequer
aparece citada na Lava Jato. Será que vão pedir também o impeachment do
senador Aécio Neves, cuja campanha recebeu doações das mesmas honoráveis
empreiteiras, diretamente para o comitê de campanha desse candidato?
Vão
pedir pelo menos o impeachment de Agripino Maia (DEM-RN), acusado de
receber R$ 1 milhão em propina? Delator por delator, Agripino tem o seu e
merece algum cartaz de algum revoltonto mais bem informado.
Irão
pedir a apuração rigorosa e a prisão dos envolvidos com o trensalão
tucano? Ou a falta d'água em São Paulo racionou também a memória e o
senso de moral e ética dos que se dizem fartos - principalmente depois
de seu repasto?
Irão eles pedir o
impeachment dos parlamentares do PMDB? Eles fazem parte do segundo maior
partido da Câmara, o primeiro no Senado, e seriam decisivos para a
chance de impeachment. Só que, por coincidência, estão entre os
preferidos das empreiteiras na hora de financiar campanhas.
Os
revoltontos do dia 15 ainda não pararam para pensar que querem um
impeachment de Dilma a ser feito por um Congresso cujo financiamento de
campanha desenfreado deixa a maioria de seus parlamentares abaixo de
qualquer suspeita - se for para generalizar o 'argumento' de quem vê
Dilma como uma inimiga a ser banida.
Serão
esses, de fato, os que podem abrir a boca para falar em afastar a
presidenta eleita ? Estranho. Não deveriam ser eles os primeiros alvos
de cassação?
Quem promove a
campanha pelo impeachment está dando sua contribuição voluntária ou
patrocinada para tirar o foco dos corruptos que de fato têm nome no
cartório da Lava Jato - o que não é o caso da presidenta.
Seria
melhor, antes de falarem em impeachment de uma presidenta eleita pelo
voto de 54,5 milhões, que os revoltontos do dia 15 esperassem a lista de
Janot e a usassem para escrever seus cartazes.
Por que não o fazem? Talvez por que isso não seja lá um bom negócio.