sexta-feira, 28 de julho de 2017

OS LIAMES ENTRE CORRUPÇÃO, CAPITALISMO E AGRONEGÓCIO


O movimento chamado “Jornada do MST” mobiliza nove estados em todas as regiões do país e tem a pretensão de chamar a atenção da sociedade para o uso do agronegócio pela corrupção, a concentração de renda e a entrega da soberania nacional. 





Por Vilson Pedro Nery[1]

Em tempos tão cinzentos ainda impera no Brasil o mito de que o agronegócio seria a “tábua de salvação” para todos os males econômicos, alegam seus defensores que os fazendeiros só fariam bem ao país, de que esse ramo da atividade empresarial traria renda para todas as pessoas, que produz distribuição de riqueza e que resultaria em prosperidade geral. Enfim, seria a representação do “capitalismo ideal”, ignorando a postura hobbesiana (O homem é o lobo do homem).

Sabemos que não é bem isso, e as jornadas do Movimento Sem Terra (MST) estão a escancarar uma face perversa e hipócrita do agronegócio: sua ligação intrínseca com os atos de corrupção, a utilização de ativos dessa atividade econômica para a “lavagem de dinheiro”, o que empobrece toda a sociedade brasileira sob o aspecto cultural, econômico e espiritual.

O movimento chamado “Jornada do MST” mobiliza nove estados em todas as regiões do país e tem a pretensão de chamar a atenção da sociedade para o uso do agronegócio pela corrupção, a concentração de renda e a entrega da soberania nacional.

Pelos cálculos do MST existem hoje no Brasil cerca de 120 mil famílias esperando pela política de assentamento estatal, e a pretensão desses agricultores é ter a chance de produzir alimentos da cesta básica para alimentar a população, sem a utilização de pesticidas, e alguns assentamentos de trabalhadores rurais apresentam experiencias exitosas na produção orgânica. Estudos científicos demonstram que o consumo de alimentos orgânicos é altamente benéfico à saúde humana.

Desde que o Brasil sofreu as implicações do golpe parlamentar de 2016, ato perverso que provoca sucessivas crises nos mais diversos setores da vida social, os gestores que “herdaram” o poder submeteram as finanças nacionais a uma destruição nunca antes vista. Setores estratégicos como a construção civil e a produção de automóveis estão em franca desaceleração e a riqueza do subsolo, representada pelos trilhões de dólares do pré-sal e por nossos minérios, estão sendo entregues a empresas estrangeiras. Por essa razão e em nome da soberania nacional, os trabalhadores sem-terra bloquearam o acesso à Base Militar de Alcântara, no Estado do Maranhão, para denunciar a tentativa de entrega deste território aos Estados Unidos, numa postura antinacional da política de Michel Temer.

Só para constar: a base de Alcântara é geograficamente o melhor local para lançamento de foguetes, e os EUA pretendem se apossar desse território como se dele fosse, por razões econômicas, estratégias e naturalmente militares.

A sociedade não faz ideia do mal que se aproxima, e essa ignorância lembra a agonia de SANDINO[2]: “Fazem-nos falta, não armas, nem dinheiro, nem munição, mas o apoio moral, a simpatia que sempre tivemos de todos os povos da América”.

As decisões e leis aprovadas pelo governo ilegítimo estão gerando uma horda de miseráveis, com cerca de 14 milhões de pessoas oficialmente desempregadas, brasileiros se sujeitando à fome, e o MST deseja que as terras improdutivas que estão a serviço desses corruptos sejam destinadas à reforma agrária, pois não cumprem com sua função social. De acordo com a Constituição Federal a natureza absoluta do direito de propriedade é relativizada pois o artigo 5° em seu inciso XXII prevê que a todos é garantido o direito de propriedade, todavia o inciso XXIII do mesmo artigo exige que essa propriedade atenda a função social.

As ações da jornada de ocupações feitas pelo MST se destinam a chamar a atenção sobre pessoas como o senador piauiense pelo PP (Partido Progressista), Ciro Nogueira, denunciado por corrupção e lavagem de dinheiro. Também foram ocupadas as propriedades rurais do ex presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) Ricardo Teixeira. O mandachuva da CBF, indiciado por mais de uma dezena de crimes em investigação do parlamento brasileiro, é acusado pelo FBI (a Polícia Federal estadunidense) de negociar a venda de votos na escolha de sedes para as “Copas do Mundo”. Também pesa contra ele suspeitas de estelionato e lavagem de dinheiro, e por isso sua prisão foi decretada por um juiz espanhol, e, finalmente, o Ministério Público brasileiro estuda pedir sua prisão por processos que envolvem uma poderosa empresa nacional de mídia.

Outro alvo do MST é o senador e ministro Blairo Maggi, que ocupa o Ministério da Agricultura, mas as empresas de sua família continuam a fazer negócios com o Governo Federal, o que é um contrassenso. Maggi teve seus bens bloqueados em janeiro de 2017 em processo judicial onde sofre a acusação de envolvimento na compra de vaga de Conselheiro no Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (TCE/MT). E na operação Lavajato é suspeito de relações com a Construtora Odebrecht.

O ilegítimo Michel Temer propôs aumento de combustíveis onerando toda a sociedade brasileira sob o argumento de que faltaria dinheiro em caixa, mas ao mesmo tempo é acusado de distribuir recursos financeiros aos políticos aliados (emendas parlamentares) tendo como contrapartida os votos contrários às investigações de crimes que o ligam a outro gigante do agronegócio, a JBS/Friboi. Temer pede que não seja investigado e os deputados concordam. Uma das propriedades rurais de Michel Temer, registrada em nome de “um amigo” foi ocupada pelo MST como forma de denunciar a malversação de recursos públicos.

A situação de desânimo é de tão grande que o empresário Roberto Medina, criador do mundialmente famoso festival de música “Rock in Rio”, declarou em entrevista que o evento de 2017 será o último no Brasil, “se nada mudar neste país”, disse.

Estamos vivendo um momento de muito amargura, com a supressão diária de direitos e a incerteza sobre o futuro das pessoas. A decisão de congelar por vinte anos os gastos públicos com escola e hospitais, deve impactar de imediato na vida das pessoas empobrecidas, gerar mais miséria e revolta. Todos os setores que se dizem vítimas da corrupção, e que de algum modo não aceitam os atos danosos de agentes públicos (de todos os poderes) devem zelar pela prática de atos de boa-fé. As atividades do agronegócio são financiadas em sua maioria com recursos públicos do orçamento, são cerca de 200 bilhões reais a cada ano destinado ao setor a juros camaradas.

Já se registra a pressão da sociedade pela procura de boas práticas sociais e ambientais. Em ALBUQUERQUE[3] se observa que “Além dos consumidores, as empresas também são pressionadas pelas comunidades locais, instituições financeiras, seguradoras, investidores e acionistas, grupos ambientalistas e empregados”.

Deste modo é imperioso que sejam desapropriadas todas as empresas rurais que de alguma forma se envolveram em atos de corrupção com o concurso de agentes públicos ou privados, e é essa a resposta que o setor do agronegócio deve à sociedade brasileira. De modo algum deve se permitir que a aquisição de terras e a criação de bois sejam usados como subterfúgio para a lavagem de dinheiro oriundo de atividades ilegais, como tem se demonstrado.

[1] NERY, Vilson Pedro. Advogado, Especialista em Direito Público.

[2] SANDINO: vida e obra; São Paulo: Expressão Popular, 2008, p. 130.

[3] GESTÃO AMBIENTAL E RESPONSABILIDADE SOCIAL; São Paulo : Atlas, 2009, p. 97.

VILSON NERY É ADVOGADO EM CUIABÁ