À semelhança da Alemanha nazista, os autores dos crimes perpetrados, seja contra cidadãos, seja contra o patrimônio nacional, não sairão impunes, porque o recado de Hannah Arendt é que o mal, apesar de parecer banal, jamais poderá assumir uma dimensão de normalidade ou ser tolerado por qualquer sociedade que se pretenda civilizada.
Por Márcio Tenenbaum*
Com a expressão “a banalidade do mal”, Hannah Arendt estabelece uma nova visão sobre o tema.
O mal não é retratado como algo maligno, visível a olho nu, nascido,
crescido e voltado para um fim determinado ou contra um objeto
determinado.
O mal pode tomar uma pessoa como a que está ao seu lado, sem nenhum sinal exterior aparente.
Arendt interpreta o mal a partir do julgamento de Eichmann em
Jerusalém, depois de ele ter sido sequestrado pelo Mossad, serviço
secreto israelense, quando vivia tranquilamente em um subúrbio de Buenos
Aires.
Durante o julgamento de Eichmann, Arendt percebe que ele não é nada
senão um burocrata como qualquer outro, que, na realidade, ao organizar o
transporte dos trens que levavam os judeus aos fornos crematórios,
fazia apenas um trabalho burocrático no intuito de satisfazer seus
superiores, com o singelo objetivo de subir na carreira militar.
O que Hannah Arendt investiga ainda é como uma sociedade permite que
se desenvolva um mal de tal magnitude sem que haja qualquer vislumbre de
humanidade em seu ator, na total ausência da percepção de que os
transportados nos trens de gado eram seres humanos.
Como pode haver um ausência absoluta de humanidade?
Por que Eichmann tapou seus ouvidos para os avisos do crime que
estava perpetrando, sejam avisos externos ou avisos vindos da sua
própria consciência?
Hannah Arendt percebe que, na sociedade alemã nazista, Eichmann não
precisava tapar seus ouvidos para não escutar avisos do crime que estava
perpetrando, porque não havia quem pudesse dar esses avisos,
simplesmente porque na sociedade nazista alemã a instância “moral”
estava comprometida com a ideologia nazista.
Na sociedade alemã nazista, o mandamento “Não Matarás”, que existe em
qualquer sociedade que tenha caminhado para a construção do processo
civilizatório que culminou no Estado de Direito moderno, foi
transformado em “você pode e deve matar”.
Nas últimas semanas vimos o governador do Rio de Janeiro em um
helicóptero atirando em comunidades sob o pretexto de combater a
criminalidade.
Vimos o presidente da república estendendo o direito de portar armas a
diversos setores da sociedade sob o pretexto de autodefesa.
Desde o impeachment de Dilma Rousseff e, recentemente, na campanha
eleitoral para presidente, o candidato vitorioso anuncia sua intenção de
matar setores da esquerda e declama louvores a antigos torturadores e
assassinos, agora transformados em heróis na luta contra um comunismo
que só ele enxerga.
O mandamento “não matarás” também em nosso país, nos dias atuais,
passou a ser “podem matar” e “podem destruir o patrimônio nacional”.
Evidente que, à semelhança da Alemanha nazista, a liberação e a
apologia de assassinatos contra os indesejáveis também acabarão em algum
tipo de tragédia.
Como lá na Alemanha nazista aqui também não há nenhuma voz moral no
interior das elites que diga: não se pode matar seres humanos.
E, finalmente, à semelhança da Alemanha nazista, os autores dos
crimes perpetrados, seja contra cidadãos, seja contra o patrimônio
nacional, não sairão impunes, porque o recado de Hannah Arendt é que o
mal, apesar de parecer banal, jamais poderá assumir uma dimensão de
normalidade ou ser tolerado por qualquer sociedade que se pretenda
civilizada.
Márcio Tenenbaum é advogado e associado da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD-RJ)
Fonte Vi o Mundo
O que ele está cometendo não
são apenas erros de políticas públicas. Mas sim, um desmonte criminoso
do país, que se refletirá sobre a presente e futuras gerações
QUANDO IREMOS PARAR ESSE LOUCO?