"Meu Deus, quanto ódio e quanta desinformação". Escritora que já viveu no Oriente Médio se diz espantada com a quantidade de mentiras espalhadas após a tensão entre Irã e EUA. Ela elaborou um pequeno manual para explicar alguns conceitos básicos aos brasileiros sobre o Oriente Médio
Por Lúcia Helena Lissa
Meu Deus, quanto ódio e quanta desinformação sobre o Oriente Médio!
Como jornalista e escritora que esteve seis vezes
no Oriente Médio (quatro delas na Palestina, em Ramallah, Belém,
Jerusalém, etc., a Palestina real, a parte o mundo todo considera
Palestina e não Israel, e outras na Síria, Egito, Marrocos e Líbano), e
que está para lançar um livro sobre o assunto, sinto-me no dever de
explicar alguns conceitos básicos aos brasileiros sobre o Oriente Médio:
1) Os iranianos não são árabes mas
têm um imenso respeito e afeto pela cultura árabe e pelos árabes em
geral, mesmo sendo persas, ou seja, herdeiros de uma das mais antigas,
culturalmente ricas e mundialmente respeitadas civilizações do mundo: a
antiga civilização persa.
2) O Irã, ao contrário dos EUA,
jamais invadiu países ou jogou bombas atômicas em lugar algum do mundo.
Os EUA foram o único país do mundo a fazer isso. Suas bombas atômicas em
Hiroshima e Nagasaki mataram milhares de pessoas, muitas delas bebês.
3) De 1919 a 2019, os EUA já
invadiram ilegalmente mais de 40 países do mundo, bombardearam e mataram
milhões de civis, destruíram economias, estupraram, torturaram civis,
cometeram crimes de guerra e manipularam a opinião pública mundial para
que não fossem jamais punidos por isso.
4) Judaísmo e sionismo são
conceitos muito diferentes. Entrevistei centenas de judeus que não
apoiam o sionismo de EUA e Israel, um projeto de dominação do Oriente
Médio que prevê o genocídio completo do povo palestino.
5) A palavra “judeu” não se refere
a uma etnia, mas a uma religião. E é exatamente por isso que a ONU e o
mundo todo condenaram Israel quando recentemente o país se declarou um
“Estado Judeu”, mesmo tendo milhões de cristãos árabes e muçulmanos
árabes vivendo em Israel, pois isso se configura um Apartheid religioso,
sim. Pessoas que vivem em Israel são israelenses e não necessariamente
judeus e há milhões de não-judeus em Israel que hoje são impedidos até
de frequentar uma rodovia ou uma escola, construídas apenas para judeus.
Vi em Israel ruas em que não-judeus, inclusive eu como cristã, são
proibidos de entrar. E isso, em qualquer país do mundo, se chama
segregação. Além disso, judaísmo (religião) e sionismo (movimento
politico) são coisas completamente diferentes.
6) A palavra “muçulmano” também
jamais se referiu a uma etnia e sim a uma religião. Existem brasileiros
muçulmanos, indianos muçulmanos, árabes cristãos e muçulmanos chineses.
Existem milhões de árabes cristãos no mundo, como eram meus avós, que
imigraram para o Brasil. Os muitos cristãos que entrevistei na Palestina
defendem os direitos dos palestinos muçulmanos e estão mais próximos
dos palestinos em geral do que do governo de Israel! Quem acha
simplesmente que o conflito em Israel é um” conflito entre judeus e
árabes” nunca esteve na Palestina, não lê nenhum autor sério e não sabe
nada sobre a região ou sobre o conflito.
7) Ninguém jamais deixou de ir a
Palestina porque o Hezbollah impediu, até porque o Hezbollah é um
partido político e um exercito não oficial do Líbano e não da Palestina!
8) O Hamas é um partido político
com um braço armado, e um partido que hoje domina a Faixa de Gaza e não a
Palestina como um todo, que é governada pela Autoridade Palestina, que
já criticou inúmeras vezes o Hamas.
9) Uma significativa parte do
Líbano é cristã, da Síria também, no Irã também existem cristãos e
judeus vivendo bem e sendo respeitados em sua fé. Muitos cristãos só
começaram a morrer na Síria recentemente depois que membros do ISIS
foram armados pelos EUA para derrubar Assad (em vão), alimentando uma
guerra que já dura 8 anos e já matou mais de 500 mil pessoas na Síria,
onde estive recentemente.
10) Todos os países de maioria
islâmica condenaram os atentados de 11 de Setembro (menos o
Afeganistão). Todos os muçulmanos que conheci pregam a paz e condenam os
atentados dos extremistas. Assim como os cristãos condenam extremistas
cristãos que pregam o ódio aos gays, a outras religiões, etc.
11) Os EUA têm milhares de
muçulmanos vivendo em paz em seu território e integrados em suas
comunidades, cientistas e médicos premiados, professores universitários
muçulmanos que nunca aparecem na sua TV.
12) A prefeita da sede da
Autoridade Palestina é mulher e cristã, assim como a prefeita de Belém, a
quem já entrevistei e cuja foto comigo já publiquei aqui. A mulher de
Arafat, líder muçulmano histórico dos palestinos, era cristã e muito
amada pelos muçulmanos!
13) Os cristãos iraquianos, que
eram protegidos por Saddam Hussein no Iraque, começaram a morrer ou a
deixar o Iraque, aterrorizados, depois da invasão dos EUA.
14) Os primeiros atentados
terroristas na região do Oriente Médio atual foram cometidos por
terroristas judeus de um grupo chamado Irgun, e não por muçulmanos
palestinos. Historiadores israelenses sérios já falaram sobre isso.
15) Ytzhack Rabin, político amado
por vários povos e líder dos judeus israelenses, foi assassinado em
novembro de 1995, durante um atentado cometido por um judeu de extrema
de direita e não por um muçulmano.
Fonte Pragmatismo Político